Na próxima semana o “dossier” nuclear do Irão será discutido no Conselho de Segurança da ONU por proposta da IAEA (Agência Internacional de Energia Atómica.
Este processo tem registado nos últimos meses uma escalada acentuada, resultante de dois factores principais: as iniciativas fracassadas da troika europeia (França, Grã-Bretanha e Alemanha) e da Rússia de alcançarem um acordo com o regime iraniano de forma a assegurar que o seu programa nuclear não dispõe de uma vertente militar e os discursos, cada vez mais inflamados do presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad.
A questão das pretensões nucleares iranianas não é recente (na realidade remonta aos anos 60 do século passado, quando a administração americana da época apoiou o regime do Xá Reza Pahlevi nesse projecto) e a crise actual não pode ser desligada do contexto que vive o Médio Oriente.
Numa conjuntura em que a ocupação militar americana do Iraque continua a registar forte resistência, em que as tensões entre sunitas e xiitas crescem de tom não é de estranhar que as pretensões nucleares iranianas assumam proporções dominantes. Após um período em que o alvo da contestação foi a Coreia do Norte (de repente parece que este país já não dispõe de tecnologia nuclear para fins militares) é agora o Irão que centra as preocupações internacionais.
Para complicar um pouco mais este cenário e contrariar quem aponta os riscos da escalada no armamento de islâmicos, na região já existe um estado com armamento nuclear – Israel – sobre o qual a comunidade internacional, com os americanos à cabeça, nunca ameaçou aplicar sanções e o Irão não será o primeiro país islâmico a integrar o “clube nuclear”, uma vez que o Paquistão há anos que dispõe de arsenais nucleares.
Descrito de forma muito simplista é este o enquadramento do problema sobre o qual o Conselho de Segurança da ONU se irá debruçar. Para complicar as previsões dos especialistas o volume de informação e de contra-informação que tem circulado é proporcional à respectiva dimensão.
Após o anúncio do fracasso da troika europeia, que pretendia que o Irão abandonasse toda a actividade susceptível de alcançar a produção de armamento nuclear, com este a sustentar que o objectivo do projecto é apenas a produção de energia, avançou a Rússia propondo uma solução de compromisso que passaria pelo enriquecimento do urânio (fase processual indispensável ao funcionamento de qualquer central nuclear) em território russo, assumindo este país o papel de controlar que o urânio enriquecido fornecido ao Irão não era susceptível de uso para fins militares (a diferença tem a ver com o nível de concentração de isótopos). Tal como a intenção europeia, também a russa esbarrou na intransigência iraniana de querer controlar todo o processo de produção, ainda e sempre sob o argumento de que o seu projecto não tem fins militares.
Com as negociações neste ponto de impasse a IAEA, baseando-se na falta de informação que confirmasse as alegações iranianas decidiu remeter o assunto ao Conselho de Segurança.
Neste momento em que se aguarda a reunião daquele órgão da ONU muitas são as dúvidas e as alternativas de rumo para esta situação, mesmo considerando os recentes rumores que apontam para um acordo entre europeus e americanos no sentido de fixar um novo prazo de 15dias para o Irão suspender as suas actividades no campo nuclear. Esta opção terá sido escolhida em prejuízo de uma proposta russa que pretendia alargar o grupo de negociadores aos EUA e à China.
Certo é que o regime iraniano parece determinado em levar avante o seu programa nuclear e que os países ocidentais se mostram dispostos a dificultar tal intenção.
Se a este cenário adicionarmos a envolvente geopolítica da região, traduzida na existência de um estado judaico fortemente armado e indefectivelmente apoiado pelos EUA, uma população palestiniana que continua à espera de ver efectivado um estado palestiniano cujos territórios Israel persiste em ocupar, uma multiplicidade de estados árabes divididos entre si pelas reservas petrolíferas e por questões de natureza religiosa, uma população curda, distribuída entre diferentes países e que não enjeitará qualquer oportunidade separatista, a crescente necessidade de petróleo originada pela industrialização de grandes territórios como a China e a Índia, a ocupação americana do Iraque e a crescente tensão entre as suas comunidades xiita e sunita.
Sem esquecer que entre os países com assento permanente no Conselho de Segurança se contam a Rússia e a China, ambos com direito de veto, cujos interesses específicos não são obrigatoriamente coincidentes com os dos EUA, tudo parece convergir para que num primeiro tempo não se consiga alcançar um entendimento mínimo que garanta uma decisão final. Embora de forma não declarada o Irão espera alguma complacência de russos, apesar das notícias resultantes da recente visita do ministro dos negócios estrangeiros russo a Washington que dão conta de um acordo firmado que garante o apoio dos EUA à candidatura russa à Organização Mundial do Comércio, e chineses, muito interessados em garantir os fornecimentos de petróleo, em quantidade e preço, indispensáveis ao crescimento da sua economia.
De incerteza em incerteza, o tirânico regime dos “ayatollahs” vai logrando algum campo de manobra e ganhando protagonismo no mundo árabe e islâmico, facto que não deve de modo algum ser encarado de forma displicente num período de grandes convulsões no Médio Oriente e na “nação islâmica”.
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