terça-feira, 31 de julho de 2012

SÓ ME GOZAM…


Em contraponto a uma notícia do NEGÓCIOS que pôs na boca de Vital Moreira a afirmação: «Deus nos livre de estar no lugar de Relvas», gostava de lembrar que quem não quer ser confundido com o lobo não lhe veste a pele, além de não existir absoluta necessidade de qualquer intervenção sobrenatural para evitar transformar-se no alvo da chacota nacional; no caso concreto de Miguel Relvas bastava ter feito o mesmo que milhares doutros, cumprindo os ditames dos programas académicos.


É claro que além do esforço, trabalho e perseverança, um mínimo de sentido ético – precisamente matéria em que Miguel Relvas revela as maiores lacunas, como se prova pelos “casos” do PUBLICO e na sua estranha relação com ex-patrão das secretas, Jorge Silva Carvalho (que abordei no “post” «A DIPLOMACIA DE RELVAS») – também teria ajudado a ponderar a extensão das “equivalências” que o “conselho científico” da universidade lhe ofereceu; mas não, o imediatismo bacoco levou a melhor sobre qualquer reflexão (se é que a houve) quanto a eventuais repercussões futuras e assim, em pouco mais tempo que o despendido na avaliação das equivalências já Miguel Relvas podia ostentar o tão almejado título académico.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

SUPER RICOS



Observadas de forma isolada ou em conjunto as notícias não apresentam nada de novo, salvo o caso da que faz referência ao relatório recentemente apresentado pela TAX JUSTICE NETWORK – organização que defende a transparência fiscal internacional – que comprova a existência e atribui uma dimensão ao que designa por “enorme buraco negro” na economia mundial.


A dimensão do fenómeno da fuga fiscal praticada pelos rendimentos mais elevados através dos mecanismos legalmente estabelecidos nos “offshores”, estimado por James S. Henry, um antigo economista-chefe da famosa empresa norte-americana de consultadoria financeira McKinsey & CO (curiosamente a mesma que foi escolhida para assessorar a privatização da TAP) entre 17 e 26 biliões de euros, está agora melhor documentada que nunca.

Para a concretização da tarefa foi utilizada informação proveniente do FMI, Banco Mundial, BIS (Banco Internacional de Compensação), ONU, bancos centrais e Ministérios das Finanças, ou seja, informação do domínio público que as entidades públicas (Governos e Organismos) se escusam de utilizar a pretexto da famosa necessidade de “não afugentar os investidores”. O trabalho agora apresentado e que no dizer do seu coordenador «…centra a atenção num enorme “buraco negro” na economia mundial que nunca antes fora medido – a riqueza privada sedeada nos “offshores” e as enormes quantias de rendimentos não taxados que produz. Isto numa época em que os governos de todo o Mundo estão privados de recursos e são cada vez mais evidentes os custos de desigualdade económica.

Recorrendo a vários métodos independentes de estimativa e ao mais vasto conjunto de dados alguma vez reunidos, conseguidos avaliar a dimensão e o crescimento deste buraco negro, cujos resultados, mesmo numa perspectiva conservadora, são impressionantes.

Primeiro, esta parte escondida dos “offshores” é suficientemente vasta para alterar significativamente a avaliação convencional das desigualdades.

O efeito é surpreendente em virtude da riqueza financeira assim escondida pertencer a uma pequena elite. Na generalidade dos países a desigualdade financeira global não só é maior que o previsto como tem crescido muito mais depressa.

Segundo, a taxa de receita perdida estimada pelo estudo é enorme. É suficiente para originar diferenças significativas nas finanças de muitos países, especialmente nos países em desenvolvimento que se debatem para substituir as ajudas perdidas e ainda suportam os custos das alterações climáticas. Na realidade, tomando em linha de conta os activos desviados para os “offshores” e os rendimentos por eles gerados, muitos dos chamados “países endividados” são de facto bem mais ricos. Mas o seu problema é que a riqueza está fora das fronteiras e nas mãos das suas elites e dos seus banqueiros privados. De facto os países em desenvolvimento têm sido na última década um importante CREDOR dos países desenvolvidos. Quer isto dizer que o verdadeiro problema não é a “dívida” mas sim a equidade fiscal.

Terceiro, acontece que os “offshores” – que se especializaram na fuga ao fisco – foram criados e são geridos, não por entidades fantasmas locais, mas pelos maiores bancos privados mundiais, pelas grandes sociedades de advogados, de consultores e de contabilistas sediadas nas principais capitais mundiais, como Londres, Nova York e Genebra. A análise atenta desses bancos revela que os seus líderes são os mesmos que aparecem como beneficiários dos resgates públicos e noutras das recentes manobras financeiras.

Quarto, face a tudo isto, é escandaloso que instituições oficiais, como o BIS, o FMI, o Banco Mundial, a OCDE e o G20, tal como os bancos centrais, tenham dedicado tão pouca atenção e investigação a esta actividade. Este escândalo é agravado pelo facto de disporem da maioria dos dados necessários para avaliar cuidadosamente a actividade. Por razões que só eles conhecerão, toleraram o crescimento sub-reptício dos “offshores” durante demasiado tempo. É chegada a altura de cumprirem as suas promessas e trabalharem, conjuntamente connosco, em propostas de políticas concretas para recuperarem o controlo.

Visto sob outro angulo, este estudo constitui uma boa notícia. O Mundo acaba de localizar uma enorme massa de riqueza financeira que pode ser chamada a contribuir para a solução dos problemas globais mais prementes. Estamos perante uma oportunidade para pensarmos não apenas no modo de prevenirmos os abusos mas também no melhor método para utilizarmos os rendimentos não taxados por eles gerados…», merece toda a atenção e melhor destino que o esquecimento no fundo duma gaveta, tanto mais que o valor estimado (por baixo) é equivalente ao PIB conjunto dos EUA e do Japão em 2011 e superior ao da UE.

terça-feira, 24 de julho de 2012

LÁGRIMAS DE CROCODILO


João César das Neves propõe na sua mais recente crónica no DN uma interessantíssima reflexão sobre o que aparenta ser a histórica incapacidade das sociedades anteverem o seu próprio futuro. Para tal recorda a metáfora filmada por Igmar Bergman[1] em «O ovo da serpente» interrogando-se, há semelhança daquele realizador sueco, porque não somos capazes de vislumbrar o réptil a formar-se no ovo translúcido?

Forte da sua veia professoral avança de pronto para expor o “réptil” que não lobrigamos escondido nas recentes notícias que antevêem 2012 como ano com menor número de nascimentos em Portugal e cuja “paternidade” atribui facilmente à política de “subsidiação do aborto”.

Sem pretender negar a gravidade duma realidade como a da redução da população nacional, não posso deixar passar em claro a abjecta manobra de distorção – muito mais perigosa que a incapacidade de ver os problemas – subscrita por César das Neves. Mesmo descontando a sua assumida defesa da ortodoxia católica, a conclusão, grosseiramente enviesada, é indigna dalguém com as capacidades intelectuais que amplamente se lhe reconhecem, pois esquece todo um conjunto de variáveis seguramente mais explicativas que a mera despenalização do aborto. Esquece os reduzidos níveis salariais praticados, as pressões para o aumento das cargas horárias a que se sujeitam os trabalhadores, as carências em infra-estruturas de apoio aos jovens e às famílias, os elevados níveis de desemprego que vivem as camadas da população em idade reprodutiva… esquece, até, que a simples ausência de perspectivas dos jovens condiciona a sua opção reprodutiva.


Privilegiando a explicação que interessa ao seu grupo religioso e derramando lágrimas de crocodilo, esquece até o mais óbvio do óbvio: a informação e a formação a que os jovens têm hoje maior acesso influenciam as suas opções de vida profissional e familiar. É verdade que talvez tudo fosse mais simples nos tempos bíblicos, mas o problema é que às gerações portuguesas mais recentes apenas tem sido proporcionada uma visão dos “infernos”, à qual, para desgosto do Professor César das Neves, talvez elas não queiram sentenciar a sua prole.


[1] Ingmar Bergman (1918-2007), realizador de cinema sueco, influenciado por escritores como Ibsen e Strindberg, escreveu e realizou obras profundamente existencialistas. Reconhecido como um dos mais completos e influentes realizadores de cinema, dele disse Woody Allen, outro argumentista e realizador, que foi “provavelmente o maior expoente desde a invenção da câmara de filmar”.

sábado, 21 de julho de 2012

FOI UMA SURPRESA…


Conhecida a decisão do Tribunal Constitucional sobre o corte dos subsídios de Férias e de Natal de funcionários públicos e de trabalhadores das empresas públicas, surpreendente na fórmula– é proibido, mas pode fazer-se – popularizada pelos Gatos Fedorentos mas perfeitamente adaptada à postura de subordinação e de subserviência, tão cara aos políticos a quem encarregaram de gerir o País, poderá ainda estranhar-se o comentário do actual homem-forte do FMI para Portugal, Abebe Selassie, que sem pejo ou pudor assegurou (segundo esta notícia do PUBLICO) que o organismo que representa recebeu com surpresa a declaração de inconstitucionalidade dos cortes salariais prescritos pelos credores? 


É urgente explicar ao actual governo e aos seus “patrões” – nomeadamente ao presidente do BPI, Fernando Ulrich, que assegura a quem o queira ouvir que «Decisão do Tribunal Constitucional é “perigosíssima para o futuro de Portugal”» – que, mesmo contra a sua vontade ou desejo expresso, ainda existem algumas pequenas regras e princípios básicos que não podem ser escarnecidos, sem o risco de ainda existirem consciências que se lhes oponham.

Não será espantoso que os todo-poderosos protectores nacionais tenham manifestado surpresa perante a desfaçatez dum qualquer órgão nacional ousar questionar ou contrariar os seus sacrossantos princípios, mas o mesmo já não se pode afirmar da tibieza do parecer constitucional, que parecendo opor-se ao discricionarismo acaba afinal por o sancionar enquanto cria um problema adicional ao governo de Passos Coelho.

Confirmando-se, como assegurou o I em «Troika inflexível. Nem mais tempo, nem menos dieta na despesa», que o FMI insiste na manutenção da fórmula 2/3 (dois terços do esforço na despesa, um terço na receita) fico curioso para ver como irá o governo reduzir a despesa. Será agora que iremos realmente assistir à tão prometida redução das “gorduras” e ver cumprida a ideia que o «Governo quer poupar mil milhões com renegociação das PPP»?

Isso é que seria uma verdadeira surpresa… tanto mais que, como pode ser confirmado pela leitura do post” anterior, é sabido há muito que a forma como foram estabelecidas as PPP é em si um processo de apropriação privada da riqueza pública, que os partidos da área do poder nunca colocarão em causa.