quarta-feira, 30 de setembro de 2009

O MAIS RECENTE TABU...

Finalmente o Presidente da República falou!

Discurso concêntrico (ora voltado para o interior do próprio Palácio de Belém – quando insistiu na ideia de que só ele ou os chefes das casas civil e militar podem falar pela Presidência da República – ora destinado ao partido do governo – quando insistiu na ideia que este teria tentado forçá-lo a tomar partido durante a última campanha eleitoral), obscuro (quase hermético) e nada clarificador, dentro de um estilo que há muito lhe conhecemos.

Quem esperou ver esclarecido o “escutagate” bem pode procurar outras fontes de informação, que Cavaco Silva nunca fez a menor tenção de esclarecer fosse quem fosse.

A sua tortuosa e enigmática declaração ao país (que pode ser lida aqui, na íntegra) constituiu mais um mau serviço ao cargo que desempenha, o qual para infelicidade de todos nós é apenas o de primeira figura do Estado.

Depois de escutado nas suas hiperbólicas declarações ficamos com três certezas:

  • primeiro, parece grassar algum vento paranóico para os lados de Belém, pois os seus ocupantes (o Presidente e a equipa que o assessora) julga-se tão importante que se sente alvo de curiosidade exterior (a quem diabo interessará o que tão secreto, elevado e transcendental se sussurrará nos corredores do palácio) e uma enorme falta de senso comum, pois contrariamente a qualquer jovem o Presidente e a sua equipa ignoram que não existem sistemas informáticos seguros;
  • segundo, o Presidente (e a equipa que o assessora) têm-se em tão elevada conta que se julgam indispensáveis ao normal desenrolar da acção política nacional (isso se subentende das suas declarações quando afirmou que se pretendia «...[p]uxar o Presidente para a luta político-partidária, encostando-o ao PSD...» e «...[d]esviar as atenções do debate eleitoral das questões que realmente preocupavam os cidadão») talvez julgando que sem ele… seria o deserto;
  • terceiro, a ser verdadeira qualquer uma (ou até as duas), o Presidente (e a equipa que o assessoria) voltaram a revelar uma absoluta incapacidade para lidar de forma clara e atempada com a situação. Calando-se, como o fez, durante o período da campanha eleitoral e em nome de uma noção totalmente deturpada de isenção política, tudo o que conseguiu foi ampliar o “ruído” em torno de uma questão vazia de conteúdo e sentido – salvo se esse não era precisamente o seu objectivo primário (ideia que desenvolvi no “post” «O ESCUTAGATE»).

Como escreveu Batista Bastos no passado dia 25, da alocução de cavaco pode inferir-se que «...não houve escutas, não houve espionagem, não houve nada. A não ser uma armadilha que armadilhou os armadilhadores», o que (concluo eu) não deixa de manter em suspenso um clima de dúvida e de suspeição que não pode senão interferir e deteriorar drasticamente todo processo de formação do novo governo.

A fragilidade argumentativa do discurso de Cavaco Silva foi tal que a generalidade dos comentadores não hesitou em assim o qualificar. José Leite Pereira, no editorial do JORNAL DE NOTÍCIAS escreve que o «...discurso do presidente é desequilibrado e confuso, ambíguo, inoportuno e nada claro: as acusações são directas, mas o que queríamos ver explicado está em meias-palavras»; José Manuel Fernandes, no editorial do PUBLICO, secunda Cavaco no enredo da questão da segurança, mas sempre vai dizendo que «…que o Presidente da República não geriu bem este caso…», enquanto António José Teixeira sintetiza no “site” da SIC o que ontem mesmo disse perante as câmaras daquele canal televisivo: «Cavaco Silva perdeu o sentido de oportunidade da sua palavra, alimenta suspeições e não sabe cuidar do bom-nome das instituições. Se assim continuar não estará à altura das responsabilidades».

Conclusão séria e grave que vem na mesma linha de outras, como a do editorial do DIÁRIO DE NOTÍCIAS, que, caso não bastasse o esclarecedor título «Falar sem dizer nada», conclui assim:
«Bem pode dizer que "Portugal está primeiro" e tentar justificar-se que não consegue iludir o essencial: esta polémica resulta apenas de o PR não ser capaz de desfazer sem tibiezas nem artifícios um problema montado por um dos seus assessores que depois mudou de lugar, mas não foi deixado cair. Isso está à vista de toda a gente.

Nesta conjuntura, com um Governo provavelmente minoritário e um PR em crise de credibilidade, incapaz de assumir os erros, Portugal não está bem. José Sócrates ficou com uma enorme vantagem de capital pessoal e político para gerir no imediato sem o contraponto que um Presidente de todos os portugueses poderia, e deveria, estabelecer. Cavaco Silva vai perceber isso nos dois anos que lhe restam de mandato. E, entretanto, também vai ter de pensar se tem condições para se recandidatar»

ou Martim Avilez Figueiredo que abre o editorial do I ONLINE com estas palavras:

«As palavras do Presidente não foram claras, mas não pouparam na violência contra membros destacados do governo. O que aí vem não pode ser bom.
Cavaco Silva falou e quem ouviu pode muito bem ter tido dificuldade em perceber o que disse. Repare-se nas palavras com que encerrou a rápida comunicação ao país: "Estejam certos que estarei aqui a defender os superiores interesses de Portugal"
»

quando, acrescento eu, tem demonstrado, agora e antes, que a sua principal preocupação se centra no seu enorme umbigo!

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

TODOS GANHARAM...

Quem tenha ouvido nas últimas horas os responsáveis pelos principais partidos políticos nacionais não ficou a mínima dúvida de que todos ganharam: o PS por ter sido o mais votado, o PSD porque o PS não alcançou a maioria, o CDS porque ultrapassou os 10% e o PS não teve maioria, o BE porque teve mais 550.000 votos e o PS não atingiu a maioria e finalmente o PCP porque teve mais deputados e o PS não repetiu a maioria.

Todos acrescentaram outras minudências, ou esticaram até à exaustão o tempo de antena que as televisões lhes proporcionaram, mas nenhum referiu o mais importante: a abstenção ultrapassou os 39%, valor que suplantou mesmo a percentagem dos votos no partido mais votado!

Os ciclos eleitorais sucedem-se mas a dura realidade do aumento da abstenção mantém-se imutável.

Será a pura incapacidade das forças políticas mobilizarem os eleitores ou o resultado de um sistema de apuramento de resultados que equipara o voto em branco ao voto nulo?

Face ao que ocorreu no mesmo fim-de-semana na Alemanha, onde o sufrágio para o Bundestag (o equivalente à nossa Assembleia da República) registou uma taxa de afluência superior a 72%[2], a resposta só pode ser a primeira hipótese. Num sistema eleitoral idêntico ao português, os cidadãos daquele país exercem o seu direito de voto de forma muito mais expressiva que nós o fazemos.

Será uma mera questão cultural ou será que a fraca qualidade dos políticos nacionais também tem uma importante quota-parte no problema?

De uma forma ou outra o resultado das eleições de ontem, tal como aconteceu na Alemanha, aponta claramente para um apoio alargado às políticas favoráveis à manutenção do “satus quo” que conduziu as economias mundiais à pior recessão económica desde a Grande Depressão (e as coisas ainda podem piorar, ao contrário do que se afirma), à continuação da política de recurso a fundos públicos para “salvar” um sistema financeiro cujos principais actores o conduziram à falência, enquanto a generalidade da população é abandonada à sua sorte num mercado de trabalho cada vez mais escasso, mais mal remunerado e onde campeia a arbitrariedade e a exclusiva lei do mais forte – a do capital.

Face aos resultados a formação do próximo governo deveria resultar de uma coligação entre o PS e o PSD ou o CDS, hipótese que ninguém parece encarar de imediato e que seguramente o Presidente da República também não irá forçar. Tal como o fez Jorge Sampaio em 2004, também Cavaco deverá apoiar a formação de um governo minoritário até que, no limite dos poderes presidenciais, possa dissolver a Assembleia na oportunidade em que o PSD apresente melhores hipótese de vitória.

Em resumo: vamos continuar entregues a um grupo de políticos-gestores mais interessados e preocupados com as suas agendas pessoais e partidárias que com a governação do país. Temos o que merecemos... foi nestes que votámos!
_________
[1] E a imprensa não deixou de referir que este valor foi francamente inferior ao 77% registados em 2005.

domingo, 27 de setembro de 2009

UM DIA DIFERENTE?

Vivemos hoje um dia diferente. Como de quando em vez sucede em bom número de estados espalhados pelos cinco continentes, hoje é dia de eleições!

Significa isto que vivemos no que se convencionou designar por “democracia participativa”, querendo tal significar que aos cidadãos é reconhecido o direito de participar no processo de escolha dos seus representantes.

Tudo isto porque hoje – enquanto aguardo os resultados de mais este acto eleitoral e sei que, face aos participantes e à envolvente de todo o processo, ganhe quem ganhar tudo vai continuar como antes – dei comigo a recordar um outro acto eleitoral que ocorreu no Médio Oriente, em Janeiro de 2006, e os tristes acontecimentos que se lhe seguiram.

Numa época em que vigorava em boa parte da inteligentzia norte-americana a ideia que aquela era uma região onde a realização de eleições era prova cabal da superioridade da sua concepção de sociedade e onde o democrático Estado de Israel sobrevivia a custo (do financiamento estrangeiro e de um dos mais modernos e sofisticados exércitos mundiais) desde a declaração unilateral da sua independência, em 1948, e, tanto mais que na época parecia que a estratégia global para a região passava pela implantação de regimes democráticos por via da bala, a população Palestiniana participou num sufrágio para a eleição dos seus representantes e decidiu dar a sua confiança a um grupo (o HAMAS) que não beneficiava de qualquer simpatia junto dos todo-poderosos e influentes ocupantes da Casa-Branca.

Contra as mais elementares normas democráticas e éticas, estes decidiram que o resultado daquele sufrágio não podia ser aceite (embora os observadores internacionais que acompanharam as eleições tenham assegurado a sua legitimidade[1]) e que o governo que dele resultou deveria ser votado ao ostracismo internacional. Decisão hipócrita e infeliz, reveladora de que para alguns a validade dos actos eleitorais depende directamente dos seus resultados.

De provocação em provocação o processo degradou-se internamente até à ocorrência de escaramuças (acompanhadas do inevitável cortejo de destruição, de mortos e de feridos) entre os partidários das duas principais forças em contenda (a derrotada FATAH e o vitorioso HAMAS) e no plano internacional pouco tardou para que a potência regional vizinha (e ocupante de boa parte do território Palestiniano) agravasse as condições de bloqueio económico e humanitário e depois procedesse mesmo à invasão de parte daquele território.

Tudo isto é história e foi aqui, na devida oportunidade, objecto de alguns “posts[2], mas o que me fez hoje voltar ao tema foi a recordação de uma recente deliberação de uma comissão de inquérito patrocinada pela ONU que concluiu que durante a acção militar levada a cabo entre Dezembro de 2008 e Janeiro de 2009 as tropas do exército invasor terão infringido as normas internacionais, praticando o que vulgarmente se designam por crimes de guerra.

Uma equipa internacional, chefiada pelo juiz sul-africano Richard Goldstone, apresentou em meados deste mês um relatório onde condena as práticas de israelitas e palestinianos, durante as semanas que durante a invasão israelita da Faixa de Gaza.

Da reacção palestiniana poucas ou nenhumas referências encontrei na imprensa ocidental (o que faz todo o sentido, pois de um grupo de terroristas não será de esperar outro comportamento que não o desrespeito pelas regras internacionais e pelos direitos humanos) mas de Israel de pronto se ergueram vozes indignadas contra o teor de um relatório que só ocorreu porque, mal ou bem, sempre terá havido alguma mudança de atitude da equipa que agora ocupa a Casa Branca.

Vozes seguramente melhor informadas que a equipa internacional e que nunca encontraram qualquer sinal de abuso ou de violação dos direitos humanos nas estatísticas que publicaram sobre a acção militar, são as que dão conta da contabilização de cerca de 1400 palestinianos e de 13 israelitas mortos durante as três semanas que durou a acção militar.

Não, para estes cidadãos isentos, impolutos e cumpridores da lei (do mais forte...) a discrepância dever-se-á tão-somente à superioridade dos seus meios militares, nunca ao bombardeamento indiscriminado de casas, escolas e hospitais... à transformação dos poucos meios de socorro que operavam no terreno em alvos tão válidos como os grupos que munidos de bandeiras brancas procuravam o refúgio possível entre os escombros das casas destruídas...

Selvajaria? Se a houve foi seguramente dos terroristas islâmicos que se esconderam entre a população, nas mesquitas, nos hospitais, nas instalações da ONU ou se camuflaram nas escolas entre as crianças, como se relatou na altura numa notícia do EXPRESSO.

É óbvio que o governo israelita do actual primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, veio defender prontamente a actuação do seu antecessor Ehud Olmert e do ministro da defesa (antigo e actual) Ehud Barak, condenando a ligeireza das conclusões do relatório da ONU e chamando a atenção para o perigo das suas conclusões…

Onde já se viu alguém questionar de forma tão frontal o tão poderoso Estado de Israel?

Ou será que o perigo deriva de Telavive recear uma redução na cobertura que os EUA sempre lhe têm assegurado?

Viveremos tempos um pouco diferentes, mas que Telavive não admite sequer imaginar?

As respostas surgirão (ou não) dentro de dias quando o Conselho de Direitos Humanos da ONU votar o relatório.
_________
[1] Entre aqueles observadores encontrava-se o ex-presidente dos EUA, Jimmy Carter que, como pode ser lido nesta notícia do WASHINGTON POST, declarou à Associated Press que as eleições foram «totalmente honestas, livres e sem violência».
[2] Entre eles destaque para «ACONTECEU O IMPENSÁVEL», «IRMÃOS INIMIGOS», «O QUARTETO E A PALESTINA» e «OUTRA OPERAÇÃO MILITAR INÚTIL».

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

O ESCUTAGATE

Não fora a seriedade da questão e quase que me apetecia iniciar este “post” com a confirmação da inevitabilidade da brincadeira de um título em clara alusão ao célebre escândalo Watergate que nos anos 70 do século passado custou a presidência dos EUA a Richard Nixon.

Mas o caso é que, tal como aquele célebre imbróglio, também este envolve personalidades não apenas dos dois maiores partidos políticos nacionais (que têm monopolizado o poder nos últimos trinta anos), como a principal figura da hierarquia governativa nacional.

Mais, este é o segundo caso que envolve destacadas figuras do círculo interno de Cavaco Silva e mais um em que este sai profundamente atingido. Como se não bastasse o famigerado apoio a Dias Loureiro (muito além do politicamente razoável) e o tristíssimo papel a que se sujeitou quando foi prestar vassalagem ao vice-rei Alberto João (o mesmo que uns tempos antes e a propósito das críticas que tecera à polémica governação do inqualificável Santana Lopes o apodou de “Sr. Silva”), eis que agora depois do jornal PUBLICO ter denunciado, no passado mês de Agosto, a existência de escutas no Palácio de Belém e de na semana passada o DIÁRIO DE NOTÍCIAS ter revelado que a fonte da informação fora Fernando Lima, o assessor de imprensa, e que falta confirmação para que a questão passe de mera elucubração, o Presidente começou por anunciar do alto da sua postura majestática que só se pronunciaria após o acto eleitoral do próximo Domingo; porém, uns dias depois e de forma inesperada fez publicar uma seca nota de imprensa demitindo aquele assessor.

Pior que cumprir o silêncio que prometera e que poderia obviamente ser interpretado das mais diversas formas pelas forças políticas em liça, a actuação de Cavaco Silva não silenciou a questão, antes a ampliou ao abrir novas vertentes interpretativas.

De um “affaire” de bastidores potencialmente útil aos defensores da tese da “asfixia democrática”, rapidamente se derivou para um provável caso sórdido de manipulação e pura intriga política, relativamente ao qual ainda faltará apurar o grau de participação e responsabilidade do próprio Cavaco, embora as declarações do seu ex-assesor indiciem a sua conivência.

Além das fundadas dúvidas expressas por Pacheco Pereira, que escreveu no seu “blog”:

«NOTAS SOLTAS QUASE SEM TEMPO:
INTERFERIR POR ACÇÃO E INTERFERIR POR OMISSÃO
O Presidente da República tem certamente coisas graves para dizer ao país e entendeu que se as dissesse interferia no acto eleitoral. Muito bem, compreende-se que o faça, embora também se interfira na campanha por omissão. Mas o Presidente rompeu o seu próprio silêncio e "falou" através da demissão do seu assessor de imprensa e, sendo assim, interferiu de facto na campanha eleitoral. Mais valia agora que dissesse tudo para não acordarmos no dia 28 sabendo coisas que mais valia que fossem conhecidas já. Para contarem para a decisão de voto dos portugueses, com cujo resultado final ele já está inevitavelmente comprometido.
» (in
ABRUPTO, em 22. 9.09)

outras podem e devem ser equacionadas, incluindo as que questionem as vantagens que Pacheco Pereira e a sua patrocinada Manuela Ferreira Leite esperam retirar (ou os prejuízos que tentam minorar) com esta interpelação à sua Alma Mater.

Entre as muitas hipóteses que se podem levantar em torno da opção de Cavaco Silva – a demissão de Fernando Lima tanto pode significar o repúdio da sua actuação, como uma tentativa de afastamento relativamente às consequências políticas do envolvimento da primeira figura do Estado, ou até a confirmação da existência do clima de suspeição acompanhada da penalização de quem terá gerido mal aquela informação – e que podem ser lidas em quase todos os órgãos de informação, continua a existir espaço para a formulação de outras.

Entre os que vêem na actuação do Presidente da República a inocentação do PS e um óbvio esvaziamento da famigerada tese da “asfixia democrática”, tão cara às hostes laranja, e os que persistem na reafirmação da existência de fundadas razões para o clima de suspeição sobre a actuação do governo rosa, rotulando (ou não) a demissão de Fernando Lima de facto espúrio e pouco relevante, existe uma miríade de outras que oscilam entre aqueles dois extremos. E já não são só os comentadores e outros fazedores de opinião que se envolvem neste debate, pois a imprensa não pára de nos fazer chegar a opinião de politólogos e outros especialistas sobre as possíveis influências do caso nos resultados eleitorais de Domingo.

O que ainda não li, nem ouvi, foi alguém avançar a hipótese da intervenção de Cavaco Silva – a silenciosa demissão do seu assessor de imprensa – constituir uma mera manobra de sobrevivência política, consistindo basicamente na constatação de que assegurará um futuro político (leia-se reeleição) mais promissor com uma vitória do PS que com outro qualquer outro cenário.

A confirmar-se esta possibilidade, tão plausível como tantas outras que tenho lido, mais não será que a confirmação da sobrelevação do perfil bonapartista que há tantos anos aponto em Cavaco Silva[1] e que automaticamente o desqualifica para a função.

Perante mais este caso da nacional politiquice, tão útil para que a campanha eleitoral que decorre continue a orientar-se por outros interesses que não o da difusão de informação e o do esclarecimento dos eleitores, e o seu pronto aproveitamento por políticos, comentadores e jornalistas não será de estranhar que as últimas sondagens já mostrem um PS em crescimento e um PSD em queda.

A avaliar por estas reacções nada do que aconteceu – intriga palaciana envolvendo as principais figuras do Estado e do partido da alternância, “denunciada” por um jornal cujo proprietário se declarou há dias prejudicado pelo Governo em funções – irá contribuir para que se inverter a realidade que tem sido a governação deste país, nem a manutenção da política do “centrão” de interesses que PS e PSD têm representado; detentores do poder e seus alternantes continuam a agir em total impunidade, mistificando a sua actuação e iludindo os eleitores que continuam a oscilar entre as duas faces da mesma moeda.

Os esforços dos partidos com acento parlamentar (porque da acção dos restantes pequenos partidos não reza a imprensa) para contrariarem esta tendência de bipolarização dificilmente regista algum sucesso, pois além do muito que os divide há ainda a considerar o facto do CDS se apresentar como candidato perpétuo a uma coligaçãozinha que lhe assegure maior visibilidade e alguns (não desprezíveis) benefícios da gravitação das franjas do poder. BE e CDU (coligação entre comunistas e “verdes”) bem podem apresentar alternativas mais ou menos viáveis que só muito dificilmente conseguirão vencer o discurso que há sua direita os classifica como esquerda radical (forma simplista, mas sempre eficaz entre nós, de afastar os mais temerosos daquelas propostas) e atinge a paranóia recente da reedição dos perigos do PREC (conforme o atesta esta notícia do DN)[2].

Contrariamente à lógica e a um comportamento moral e ético de sólidos valores de respeito da liberdade e da democracia, que deveriam ditar a conduta daqueles que têm sido eleitos e dos que os têm eleito, o pôr do Sol do próximo Domingo não trará qualquer sanção sobre esta clique de pobres aprendizes de Maquiavel; infelizmente esta política de manobrismo e intriga palaciana não sofrerá a penalização eleitoral que merece, limitando-se a expectativa do pleito à resposta sobre a real influência de mais esta polémica intervenção de Cavaco Silva e se ela foi ou não decisiva para enterrar por algum tempo as esperanças do PSD.
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[1] Sobre este assunto ver o “post” «HABEMUS CAVACUM» que escrevi aquando da sua eleição.
[2] Atente-se que a radicalização do discurso do CDS de Paulo Portas não é de agora, pois desde o início da campanha que aquele político populista arvora para si e para o seu partido o estatuto de representante da maioria silenciosa, recuperando aquela que foi uma figura de estilo usada no Verão de 1974 para justificar a tentativa de golpe “putschista” do então Presidente da República António de Spínola.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

MAIS QUE UM JORNAL DE CAMPANHA

Entrados na recta final da campanha eleitoral para as eleições legislativas que comentário se poderá fazer desde já?

Além das habituais trocas de “galhardetes” e de picardias entre as duas principais forças em contenda, do desenterrar dos baús do tempo velhos, e menos velhos, argumentos, em que é que a campanha eleitoral contribuiu para o esclarecimento dos eleitores?

Alguém ouviu dos postulantes da área do governo uma proposta com princípio, meio e fim para o combate à recessão económica?

É que se dos populistas do CDS não será de estranhar que se concentrem nos temas que mais facilmente poderão mobilizar o seu eleitorado natural – a segurança, a autoridade, o combate à imigração – e que agora quase tenham recuperado a famigerada “maioria silenciosa, que do PCP se continuem a ouvir propostas de defesa dos “interesses dos trabalhadores”, ou que os “bloquistas” oscilem entre os temas de natureza económica e os de âmbito social (a eles pertenceram as primeiras campanhas contra a discriminação de minorias), já dos partidos que se dizem candidatos a governar o País terá que se estranhar o quase silêncio em torno das grandes questões de fundo.
A um e outro não pode bastar o lançamento de uma ou outra proposta avulsa, num ou outro discurso mais inflamado ou motivado pelos resultados menos abonatórios de uma ou outra sondagem. De concreto que foi que ouvimos de Sócrates ou de Manuela Ferreira Leite? A promessa de continuidade do primeiro e propostas de mudança da segunda, ou um mero arrazoado de discursos mais ou menos repetidos, com o recurso a chavões gastos e que em eleições anteriores, quer um partido quer o outro prontamente esqueceram após as eleições.

Alguém de boa fé e memória saudável pode acreditar em Manuela Ferreira Leite quando esta afirma que não irá aumentar os impostos, quando em 2002, na qualidade de Ministra de Estado e das Finanças do governo chefiado por Durão Barroso, decretou um aumento dos impostos apesar das promessas em sentido contrário que aquele fizera? ou nos recém assumidos ares de humildade assumidos por José Sócrates fazer esquecer a sobranceria e arrogância que dominaram a sua passagem por São Bento?

Respondidas (ou não) estas questões, outras se colocam de pronto, como a do “diálogo” que Sócrates e Manuela Ferreira Leite têm mantido a propósito da questão dos grandes investimentos públicos – alguém os ouviu explicar de forma fundamentada as suas opções?

Com as primeiras sondagens a prenunciarem um empate técnico a pressão sobre os partidos do “centrão” aumentou… o que de modo algum pode servir de justificação para as “boutades” de Manuela Ferreira Leite, que em cada dia que passa revela uma confrangedora falta de conhecimentos e convicções. Para não alongar, recordo apenas as situações em que a insigne economista confundiu a taxa de incidência fiscal das famílias com a das empresas e afirmou de forma convicta que os 40% que estas pagam são um exagero; quando, qual “padeira de Aljubarrota” dos tempos actuais, clamou contra os interesses espanhóis, ou quando em defesa das recém descobertas “piquenas” e médias empresas afirmou que o importante é facilitar-lhes o acesso ao crédito, esquecendo ou (o que é ainda mais grave) ignorando que o real problema destas é o seu excessivo endividamento e a crónica escassez de capitais próprios.

No meio de tudo isto propostas com alguma sustentabilidade e até qualidade passam quase despercebidas, um pouco à semelhança do que acontece com os chamados pequenos partidos – os que não têm assento parlamentar – que contra ventos e marés vão tentando fazer chegar aos eleitores as sua opiniões e pontos de vista. Afastados desde a primeira pela comunicação social resta-lhes os “tempos de antena” e uma ou outra acção melhor elaborada e suficientemente apelativa para atrair os meios de comunicação.

Como se houvesse falta de motivos de atracção (e de polémica), o PSD resolveu recuperar para a campanha o tema da “asfixia democrática” e, talvez ciente da reduzida consistência de um conceito tão fluido, a líder laranja repete-o até na sua deslocação à região do território onde as regras democráticas mais vezes têm sido desrespeitadas, onde ladeada do inefável e jactante Alberto João Jardim, Manuel Ferreira Leite (a mesma que meses antes propusera uma suspensão temporária da democracia para resolver a crise) lança sobre o rival PS o ferrete de anti-democrático.

Tudo isto parte de uma campanha que se apresenta ao eleitorado em defesa e exigência da “verdade”, enquanto jornalistas e comentadores se desdobram em análises sobre o tema e sobre o caso TVI/Manuel Moura Guedes, o PUBLICO lança também as suas achas para a fogueira e informa na primeira página da sua edição de 18 de Agosto que a Presidência suspeita de estar a ser vigiada pelo Governo, criando um “Watergate” nacional…
(A seguir: O "ESCUTAGATE")

domingo, 20 de setembro de 2009

BARROSO, HÉLAS!

Foi com esta exacta expressão que o prestigiado e insuspeito jornal francês LE MONDE titulou o seu editorial no dia da recondução de Durão Barros à frente da Comissão Europeia para um segundo mandato de cinco anos.

É que, apesar do reforço da posição dos partidos de direita no Parlamento Europeu, a maioria que agora reconduziu Durão Barroso é inferior à que o elegeu há cinco anos (53,2% contra 58,3%) e, pior, constituída principalmente por eurocépticos.

Este resultado, confortável do ponto de vista matemático e formal, não deixa de constituir um paradoxo interessante e bem revelador do modo de funcionamento da União Europeia; atente-se que durante a sessão parlamentar que antecedeu a votação, Durão Barroso pediu aos eurodeputados um «...“mandato forte” para a sua “agenda de transformação da Europa”, prometendo uma cooperação estreita com o PE para a desenvolver. “Se querem uma Comissão forte, que se imponha aos Estados-membros, que se imponha aos egoísmos nacionais, devem dar à Comissão o apoio forte que precisa”»[1], obtendo o apoio dos sectores mais conservadores (por definição mais avessos à mudança) e menos empenhados no aprofundamento do processo de construção europeia... e obteve-o!

Os anacronismos da União Europeia são há muito matéria de vasta reflexão e abundante polémica, pelo que o que agora ocorreu não constitui novidade nem deve ser nada que preocupe o muito flexível Durão Barroso, mesmo quando tem pela frente a complicada tarefa de constituir uma equipa de comissários que agrade a todos os seus apoiantes (aos governos dos 27 estados-membros e aos grupos parlamentares que agora lhe deram o seu voto) enquanto ainda ecoam as declarações do presidente do grupo liberal (o belga Guy Verhofstadt), exigindo «mais audácia e uma Comissão com mais ambição» para manter o voto favorável dos seus 84 parlamentares na data da apresentação da nova Comissão e do respectivo programa .

Para complicar este habitual jogo de influências e de sobe e desce de apoios e de votos, Durão Barroso (e toda a nomenclatura europeísta) está ainda dependente do resultado do referendo que terá lugar na Irlanda no próximo dia 2 de Outubro, data em que se voltará a referendar a aprovação do Tratado de Lisboa, quando estão em aberto todas as dúvidas sobre o seu desfecho.
Embora a questão a rejeição do Tratado de Lisboa não implique o fim da UE – a prova é que esta tem continuado a funcionar e de forma perfeitamente normal nos termos do Tratado de Nice – os defensores do neoliberal Tratado de Lisboa pretendem impor a sua aplicação, pelo que depois de terem conseguido a aprovação por mera via parlamentar na generalidade dos estados-membros pretendem agora induzir os irlandeses a mudar o sentido do seu voto de 12 de Junho de 2008
[2].

Ainda que possa parecer desajustada a mistura da reeleição de Durão Barroso com a questão da repetição do referendo irlandês, estas são apenas o reflexo da mentalidade que impera em Bruxelas e dirige há vários anos os destinos de quase 500 milhões de habitantes; não é apenas uma questão de escolher uma personalidade melhor ou pior preparada para conduzir os destinos de uma união económica, é também a definição do modelo de governação política e económica que se pretende para uma das maiores regiões económicas num mundo profundamente agitado pela fragilidade da hiper-potência que tentou ser os EUA e pela disputa entre os candidatos (China, Rússia e Europa) a um futuro papel de orientação global.

Estando em causa problemas desta natureza não se pode, sob que argumento seja, aceitar como válidas argumentações em defesa e louvando a reeleição de Durão Barroso como pude ler no editorial do DIÁRIO DE NOTÍCIAS, do passado dia 17, ou no artigo que Teresa de Sousa assinou no PUBLICO, que em resumo defendem que todos (portugueses) devemos estar não só felizes e contentes, mas também orgulhosos, por estar na presidência da Comissão Europeia um neoliberal “cinzentão”, dúctil e passivo Durão Barroso...

Em jeito de conclusão quase me apetece citar (adaptando) Almada Negreiros; se o Durão (Dantas) Barroso é português… eu quero ser espanhol!
_________
[1] Citado do artigo do PUBLICO: «Parlamento Europeu elege Barroso hoje, mas exige mudança de política».
[2] Sobre o referendo irlandês ver o “post”: «E ISTO NÃO ERA UMA CONSTITUIÇÃO…»

terça-feira, 15 de setembro de 2009

DE DERROCADA EM DERROCADA

O dia 15 de Setembro de 2008 – data da falência do Lehman Brothers – além de ter assistido ao que para muitos era impensável e de isso quase ter acarretado a completa derrocada de Wall Street, ficou também marcado como a data a partir da qual não se pode mais esconder a existência de um crise de grandes proporções.

Assinalando a data, escreveu ontem o PUBLICO que a «Crise financeira custou 6900 euros a cada cidadão», fazendo-se eco de um trabalho que a BBC NEWS publicara uns dias antes[1] e que estimava o custo das políticas de intervenção dos governos dos países mais desenvolvidos em 11 biliões de dólares (o equivalente a cerca de 7,5 biliões de euros), enquanto hoje nos mimoseou com uma peça sobre «O que mudou depois de Setembro de 2008», que apesar de importante como sistematização de ideias e de acontecimentos e de assinalar que o início da crise é anterior à falência do Lehman Brothers, centra a observação demasiadamente na vertente financeira da crise (de inegável importância), mas quase esquece o papel desse sector na hora de formular alternativas para o futuro.

De uma forma geral, quer a nível interno quer internacional, rara é a publicação que vai além de formular piedosas intenções de reformulação dos sistemas de controlo bancário (em perfeita sintonia com as anunciadas intenções de Sarkozy, Merkel e Obama) mas de reconhecida insuficiência prática.

Poucos abordam os problemas das economias debilitadas pela recessão económica sem trazer à primeira linha de argumentação as dificuldades de liquidez originadas pela retracção no crédito bancário, como se fosse lógico e natural que empresas e famílias vivam fortemente dependentes do crédito e não dos ganhos (lucros e salários) das respectivas actividades.

Nas vésperas de mais uma cimeira dos países mais ricos continua a insistir-se no absurdo princípio da superioridade de um modelo económico que, impondo um sistema de globalização dos mercados, conduziu a um enriquecimento desmedido dos capitais transnacionais enquanto condenou o trabalho e os capitais locais ao empobrecimento absoluto e direccionou o Mundo para uma situação de quase apocalipse.

É evidente que um debate sobre o futuro modelo de regulação financeira é importante, mas a este já deveria ter-se sobreposto um outro muito mais importante: a definição de um novo papel para o sistema financeiro, forçando a separação entre as actividades bancárias clássicas (recolha de fundos e respectiva aplicação na actividade creditícia) e as novas vertentes puramente especulativas.

Por último, como principal garantia para que a futura actividade financeira se resuma ao financiamento da economia e para que a compulsão para a tomada de riscos seja minimizada, é indispensável fazer regressar à esfera pública a capacidade de criação de moeda, limitando essa capacidade do sector financeiro ao mínimo indispensável aos níveis de liquidez saudável e nunca aos níveis de alavancagem actual.

A hesitações e tergiversações dos principais líderes mundiais não auguram para breve qualquer alteração radical no modelo de organização e funcionamento do sector financeiro, pelo que notícias como a divulgada há dias pelo PUBLICO, dizendo que «Greenspan prevê que a “natureza humana” gerará novas crises» são mais que seguras e proféticas; são uma segura garantia de um dos principais obreiros do mais iníquo dos sistemas de concentração da riqueza geral nas mãos de um reduzido grupo de grandes financeiros.
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[1] O texto integral pode ser lido na peça «Follow the money», sendo que o seu principal interesse reside sobretudo na revelação do peso das ajudas públicas no PIB de países como os EUA e o Reino Unido.

sábado, 12 de setembro de 2009

OITO ANOS DEPOIS, O 11 SET ALVO DE ACÇÃO JUDICIAL

Contrariando a intenção dos indefectíveis da tese oficial sobre o 11 de Setembro de 2001, que tudo reduzem a um ataque terrorista planeado e perpetrado por operacionais da Al-Qaeda e que pretendem ver definitivamente silenciadas as dúvidas que quem não aceita pacificamente aquela tese, um advogado norte-americano mantém a pretensão de obter mais explicações através de uma acção judicial que intentou em 2004 contra George W Bush e outros de cumplicidade nos acontecimentos daquele dia.

Phillip J Berg, um antigo procurador do estado da Pennsylvania, intentou a acção em nome de um trabalhador do World Trade Center, que alega ter ouvido explosões anteriores ao impacto das aeronaves contra as torres, na qual acusa George W Bush e outros de conspiração e associação criminosa. Recorrendo a uma figura legal do sistema judicial americano (RICO lawsuit)[1] aquele advogado pretende ver explicadas várias lacunas da tese oficial, como sejam as razões para o colapso das torres, que aeronave atingiu o Pentágono e o que efectivamente terá acontecido ao voo 93 da United Airlines.

A informação sobre o desenrolar da acção é tão contraditória quão polémica é a matéria em julgamento. Assim, após a apresentação da acção no estado da Pennsylvania, em 2004, esta seria transferida para um tribunal do estado de New York, em 2005, e em 2006 alguns dos 156 arguidos foram excluídos pelo tribunal e o tribunal pediu informação adicional ao peticionário que este não terá produzido, mas a AMERICAN FREE PRESS publicou há dias uma notícia na qual dá conta do prosseguimento da acção e da intenção do promotor em a divulgar em várias capitais da Europa.

Muito embora Phillip J Berg seja uma figura notoriamente controversa no meio judicial norte-americano – entre os seus vários feitos conta-se o pedido de suspensão de actividade dos juízes do Supremo Tribunal, Sandra Day O'Connor, Antonin Scalia e Clarence Thomas, envolvidos no processo Bush versus Gore[2] que ditou a nomeação de George W Bush para a Casa Branca, e mais recentemente uma acção contra Barack Obama alegando a sua inelegibilidade para a Casa Branca baseada no facto deste ter nascido no Quénia – os factos relatados merecem atenção enquanto sinal claro das muitas dúvidas que ainda envolvem o 11 de Setembro e que os seus protagonistas nem sempre são “outsiders” da sociedade (como pretende o Dr. Patrick Leman, psicólogo da Royal Holloway University, de Londres), comunistas (como prontamente acusam os neoconservadores e seus apaniguados) ou lunáticos (como se expressa a “vox populi”).

Por muito que se esforce a actual administração norte-americana – que decidiu designar ascomemorações deste ano como o National Day of Service and Remembrance e apelar aos cidadãos que usem o dia para a prestação de serviços comunitários – e as suas vindouras, as dúvidas dificilmente desaparecerão sem uma apresentação clara de provas que definitivamente expliquem coisas tão simples como a afirmação que um avião comercial penetrou o espaço aéreo do Pentágono, iludindo os sistemas electrónicos de detecção e eliminação de intrusos com que o edifício está equipado, embateu contra uma das suas fachadas depois de ter voado várias centenas de metros em voo rasante ao solo e dos destroços resultantes poucas são as evidências de uma aeronave com cerca de 40 m de envergadura e mais de 100 toneladas de peso.

É que, constatada uma falha na versão oficial e levantada a hipótese de algum tipo de encobrimento ou de uso em benefício próprio, de pronto se avolumam as dúvidas relativamente a tudo o resto, o que até não constituirá novidade (veja-se o célebre caso Irão-Contras[3]) num país onde as derivas autocráticas não são caso raro.
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[1] O RICO lawsuit, anagrama de Racketeer Influenced and Corrupt Organizations Act, é um tipo de processo legal baseado em legislação criada para o combate ao crime organizado (racketeer) e apresenta como característica interessante o facto de poderem ser utilizados como matéria probatória acontecimentos muito anteriores e posteriores aos factos julgados.
[2] Este processo, pela sua dimensão política e pelas repercussões que teve continua passados vários anos envolvido em aberta polémica. Entre os muitos textos e opiniões que podem ser encontrados na Net, deixo aqui a referência a dois deles pela relevância e pelas diferenças de datas. O primeiro «None Dare Call It Treason», foi publicado na revista THE NATION em 2001, e o segundo «Has Bush v. Gore Become the Case That Must Not Be Named?», foi publicado em 2006 no NEW YORK TIMES.
[3] Também conhecido como "Iran-gate", foi um escândalo de corrupção denunciado pela imprensa norte-americana, durante o segundo mandato do presidente Ronald Reagan, no qual figuras de topo da CIA facilitaram o tráfico de armas para o Irão (então sujeito a um embargo internacional de armamento), como duplo objectivo de obter a libertação de reféns e para financiar os Contras (movimento que na Nicarágua se opunha ao recentemente eleito governo sandinista).

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

OITO ANOS DEPOIS, O 11 SET CONTINUA A “MATAR”

Talvez com a substituição da administração Bush pela de Barack Obama alguns esperassem uma mudança de atitude face aos acontecimentos do 11 de Setembro de 2001 e em especial face à tese oficial, tal como ela foi apresentada e defendida pela administração neoconservadora de George W Bush.

O passar do tempo e o próprio exemplo da posição da nova administração face a problemas como o da responsabilização dos ideólogos do sistema de prisões especiais, como a de Guantánamo, e do uso de tortura nos interrogatórios aos alegados terroristas da Al-Qaeda, já deviam ter eliminado boa parte daquelas esperanças; porém, a machadada final deverá ter ocorrido nestes últimos dias quando foi tornada pública a demissão do conselheiro de Obama para as questões ambientais[1], por razões que nada têm a ver com a sua função ou qualificação, mas tão somente por Van Jones ter assinado uma petição que questionava a actuação do ex-presidente George W Bush e o Partido Republicano naqueles acontecimentos.

Pressão do GOP[2] levou à demissão do quase desconhecido Van Jones confirmando, com o beneplácito de Obama, que questionar os acontecimentos do 11 de Setembro de 2001 e/ou a actuação da equipa de George W Bush continua a ser hoje, como o foi durante aquele consulado, equiparado a crime de lesa-pátria e quem a tal se atrever incorrerá em automática pena de ostracismo político.

Mas os sectores estreitamente ligados à clique neoconservadora continuam a manter um comportamento de profundo receio perante as vozes que mantém em aberto as dúvidas e clamam pelo devido esclarecimento, como o comprova um artigo publicado no METRO[3], onde o seu autor, James Day, cita o Dr. Patrick Leman, psicólogo da Royal Holloway University, de Londres, dizendo que há duas razões básicas para a existência e a proliferação das “teorias da conspiração”[4]: a tendência para o preenchimento de lacunas na informação com hipóteses ambíguas em substituição das mais fiáveis e a difusão dessas teses nas franjas exteriores ao pensamento dominante (mainstream) como forma de conforto e de sensação de se fazer “parte de alguma coisa”.

Estas ideias não são novas, pois já em Fevereiro de 2007 a BBC NEWS publicara um artigo de opinião do mesmo especialista com aquele tipo de argumentação, que podendo mostrar-se cientificamente válida não explica o cerne das dúvidas levantadas sobre a tese oficial para os acontecimentos de 11 de Setembro de 2001, muitas das quais procurei apresentar nos “posts” que desde 2005 tenho feito sobre o assunto[5], e em especial para a versão do “ataque” ao Pentágono.

Mas afinal, haverá melhor forma de assinalar a data, além de recordar o muito que permanece por explicar – incluindo as tentativas canhestras de explicação –, que lembrar aqui que continua a haver muita gente a levantar fundadas dúvidas sobre o assunto?
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[1] As notícias sobre a demissão, difundidas pelo NEW YORK TIMES e pelo WASHINGTON POST, podem ser lidas aqui e aqui.
[2] Sigla pela qual é conhecido o Partido Republicado (Grand Old Party) nos EUA.
[3] O METRO é um diário britânico, de distribuição gratuita, publicado pela Associated Newspaper, empresa que pertence ao grupo Daily Mail and General Trust (uma das maiores empresas europeias na área da publicação de jornais, nomeadamente o Daily Mail e o The Mail on Sunday, da televisão e da rádio) cuja propriedade é detida pela família Rothermere e que no segundo quartel do século XX foi uma das grandes apoiantes do BUF (British Union of Fascists) onde pontificava a figura de Oswald Mosley.
[4] Designação genérica pela qual são conhecidas as teses que, de forma mais ou menos fundamentada, põem em dúvida as versões oficiais de acontecimentos ou factos mais ou menos polémicos e controversos.
[5] Os “posts” referidos são os seguintes: «11 DE SETEMBRO – QUATRO ANOS DEPOIS», «NINE ELEVEN – PARTE I», «NINE ELEVEN – PARTE II», «NINE ELEVEN – PARTE III», «COM ISSO NÃO SE BRINCA», «11 DE SETEMBRO DE 2001» e «SETE ANOS APÓS O 11 DE SETEMBRO DE 2001».

terça-feira, 8 de setembro de 2009

EDUCAÇÃO EM TEMPO DE ELEIÇÕES

Haverá melhor oportunidade para olhar para as questões da educação e da formação que um período em que se conjuga um tríptico de eventos, como a abertura de novo ano escolar e a realização próxima de duas campanhas eleitorais, para dois sufrágios tão diversos e importantes quanto uma eleição legislativa e outra autárquica?

É que embora a atenção da generalidade dos meios de comunicação esteja muito mais orientada (vá-se lá saber por que espúrias razões) para as pequenas e mesquinhas questiúnculas entre partidos e candidatos e para declarações bacocas e eleitoralistas, lá vai aparecendo uma ou outra notícia merecedora de melhor atenção, como a PUBLICO que, resumindo um recente relatório da OCDE sobre o estado da educação entre os seus membros, chama a atenção para «As diferenças entre Portugal e os outros países» não apenas no capítulo dos resultados mas também no das metodologias.

Assim, comparativamente com a média dos membros da OCDE, ficamos a saber que:

  1. os gastos por aluno são menores em Portugal;
  2. 98% dos gastos com o ensino destinam-se ao pagamento de salários (com especial destaque para os níveis de ensino não universitário);
  3. o número médio de horas de trabalho dos professores portugueses é superior ao dos seus congéneres da OCDE;
  4. os países mediterrânicos, como a Itália, a Espanha e Portugal, têm fracas estruturas de avaliação das escolas e dos docentes;
  5. Portugal está na média da OCDE no que respeita às desistências no ensino superior (cerca de 30%);
  6. em Portugal as diferenças salariais entre licenciados e não licenciados são das maiores no universo observado;

factos que deveriam suscitar reflexão e um profundo debate entre os políticos que se apresentam ao eleitorado como candidatos a regulamentadores e decisores sobre políticas naquela área ou em áreas congéneres.

Sem demagogias ou chavões eleitoralistas, um debate sobre o modelo de ensino e formação desejável para as gerações mais jovens há muito que devia ter sido feito e as conclusões mais ou menos consensuais deveriam constituir a espinha dorsal da política educativa nacional. Deixando de lado questões espúrias, como a de saber se pode haver ensino sem autoridade[1] ou se a qualidade do ensino é um privilégio do sector privado[2], o fundamental a definir devem ser os grandes objectivos da universalidade e da qualidade, sem o que notícias que dão conta de realidades como a de que o «Desemprego de jovens qualificados é mais alto em Portugal» continuarão a verificar-se.

E se actualmente mais de 50% dos jovens licenciados sofre os efeitos do desemprego de longa duração, contra os 42% da média da OCDE; se as bem conhecidas indefinições e convulsões do sector educativo não deixam grande margem para esperança de melhoria, que futuro pretendemos oferecer aos jovens que hoje atravessam a idade de escolaridade obrigatória?

Não chegará já termos criado uma geração de cidadãos profissionalmente subaproveitados… condenados ao permanente adiamento do inalienável direito de se sentirem membros produtivos de uma sociedade que prefere como modelo organizativo a perpetuação de níveis razoáveis de desemprego como forma de justificar os salários baixos e assegurar o aumento do nível dos lucros?

Se pouco ou nada fizermos para aumentar os níveis de qualidade do ensino (seja do obrigatório, seja do superior) como podemos esperar vir a quebrar no futuro o processo de formação de quadros para engrossarem as fileiras do desemprego ou dos empregos indiferenciados e mal remunerados?
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[1] Esta, ou algo de parecido, é uma das mensagens/perguntas constantes num conjunto de “outdoors” que o CDS tem vindo a afixar e parece-me merecedora da maior atenção pelo que contém de subliminarmente perigoso, porque confunde (e receio bem que de forma particularmente intencional) disciplina (algo que pode ser implícita e voluntariamente aceite) com autoridade (exercício da vontade individual e do poder pela força arbitrária).
[2] Afirmação tanto mais duvidosa quanto segundo refere esta notícia do PUBLICO, elaborada sobre os dados do já citado relatório da OCDE, a situação do ensino privado em Portugal é claramente vantajosa, em todos os níveis de ensino, sem que tal aparente melhorar a fraca qualidade do nosso ensino. A notícia refere mesmo que: «No primeiro ciclo do ensino básico, o privado representa 8,5 por cento (2,9 por cento na OCDE). No terceiro ciclo, o peso do privado baixa para os 5,5 por cento (3 por cento na OCDE), voltando a subir no secundário para os 13,5 por cento (5,3 por cento na OCDE). Só no México e no Japão, e nalguns graus de ensino nos Estados Unidos, é que o sector privado tem mais peso do que em Portugal».

sábado, 5 de setembro de 2009

UM TIRO NO PÉ

Pela pior das razões (salvo os “fait divers” criminais tão do agrado da imprensa sensacionalista) Almeirim voltou a ser notícia na comunicação social nacional.

Depois da infeliz e pouco ponderada ideia de instalar um estabelecimento prisional numa exploração agrícola[1] do concelho, o presidente da nossa edilidade volta a ser notícia pela pior das razões: a decisão de suspender o calendário das reuniões do executivo camarário durante o período eleitoral.

A atestar pelas reacções dos vereadores da oposição e pelo que delas transpareceu para a comunicação social local[2], quer o PSD quer a CDU já se manifestaram criticando a decisão.

Pragmaticamente poderá até defender-se semelhante proposta no pressuposto que nos próximos tempos todos os vereadores estarão demasiado ocupados com “o trabalho partidário”; porém, semelhante argumentação apenas revelará aos eleitores os verdadeiros desígnios dos eleitos – fazerem-se eleger – em detrimento daquela que deveria ser a razão principal da sus eleição – representar e defender os interesses dos munícipes que os elegeram e do concelho pelo qual devem pugnar.

Em poucas palavras; a actual gestão do município de Almeirim, pela decisão e voz do seu presidente, acaba de dar mais um “tiro no pé”, revelando não apenas um menor respeito por quem os elegeu como fornecendo novas munições aos adversários na próxima contenda eleitoral.

Precisaríamos de mais esta “boutade” para animar o pleito, ou pelo contrário aquilo que verdadeiramente necessitamos é de um debate construtivo sobre o futuro que queremos para o município?

As resposta surgirão quando abrirem as “hostilidades”, ou vamos, como profundamente receio, voltar a assistir a uma campanha de troca de críticas (e outros mimos) e a um desbragado chorrilho de promessas incumpríveis mas capazes de atrair os tolos e acumular o número necessário de votos?
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[1] Sobre esta questão, e para informação ou esclarecimentos adicionais, ver o artigo do CORREIO DA MANHÃ «Um poder discricionário?», o “blog” de um grupo de cidadãos pela defesa da Ribeira de Muge e os “posts” «ISTO É DE DEIXAR QUALQUER UM GAGO» e «A DEBATER É QUE A GENTE SE ENTENDE», que na altura fiz sobre o assunto.
[2] Ver as notícias «Executivo da Câmara de Almeirim sem reuniões - Reacção do PSD» e «CDU Almeirim avança com queixa à IGAL», incluídas na última edição de O ALMEIRINENSE.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

DEVIA HAVER UMA LEI...

Por menor que seja a fé que depositamos em que nos tem governado e quando fomos acompanhando ao longo dos últimos anos as polémicas em torno da actuação de organismos encarregues de fazer cumprir as zelosas leis que esses governantes criaram sobre a origem dos géneros alimentares, a composição do material dos utensílios culinários, o número das instalações sanitárias nos estabelecimentos de restauração, etc., etc., etc...., não posso deixar de me espantar como tão eficientes legisladores (e não menos eficientes agentes fiscalizadores) podem ter deixado passar questões como a do crescimento exponencial do número e do custo dos manuais escolares.

Uma vez mais ao aproximar-se o início de um novo ano escolar voltamos a ver notícias que lá vão dando conta dos aumento registados naqueles bens de consumo[1], que ao abrigo da legislação em vigor e da recentemente promulgada pelo Presidente da República[2], são de aquisição obrigatória para todos os agregados familiares com jovens entre os 5 e os 18 anos, mesmo que a insuspeita APEL (Associação Portuguesa de Editores e Livreiros) tenha prontamente esclarecido que os aumentos registados nos últimos seis anos são inferiores à inflação acumulada no período[3].

Mesmo que tivesse ficado tranquilizado pelos cálculos da APEL, não podia deixar de persistir na ideia de que devia haver uma lei...que invertesse a prática que actualmente vigora de pseudo liberdade de escolha nos manuais escolares e que impedisse a produção de manuais escolares convertidos em cadernos de exercícios, logo impossíveis de reaproveitamento por outro aluno.

É que se cada vez há mais leis para regular o dia-a-dia dos cidadãos, estranho que governantes tão preocupados com o nosso bem estar nunca se tenham debruçado sobre o curioso universo dos livros escolares, salvo para garantirem a perpetuação do que não posso deixar de classificar como um dos grandes negócios do século português – o da produção e distribuição de milhões de manuais escolares que anualmente conhecem um único e rentável fim: o da destruição.

Nada tenho contra o princípio do alargamento da escolaridade obrigatória – salvo que se esta medida não ser acompanhada da indispensável aferição regular de conhecimentos e competências dos alunos não teremos como garantido um correspondente aumento do grau de conhecimentos e competências adquiridas – mas não posso deixar de questionar os custos que esta medida terá sobre os cada vez mais magros orçamentos familiares.

O modelo que está instituído e que anualmente acarreta um custo por aluno em idade escolar de várias centenas de euros (o valor é naturalmente um função directa do grau de escolaridade frequentado) pode e deve ser questionado, pois já cansa assistirmos ao esbanjamento anual de milhões de euros em livros escolares[4], impossíveis de reaproveitar (seja no seio da mesma família ou não) graças à insensibilidade de governantes que se têm revelado mais preocupados com a perpetuação do negócio das editoras que com a salvaguarda dos interesses das famílias.
E já agora porque não olhar também para o número desproporcionado de manuais e outros materiais de estudo que os jovens têm que carregar diariamente?
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[1] Como exemplo mais recentes veja-se a do I ONLINE que diz que «Preço dos manuais escolares subiu 4.5% mas é compensado no material escolar».
[2] Ver a notícia do PUBLICO intitulada «Cavaco Silva promulgou alargamento da escolaridade obrigatória para 12 anos».
[3] A informação pode ser confirmada nesta notícia do PUBLICO.
[4] Uma ideia do valor deste mercado pode ser obtido a partir de uma simples estimativa. A população portuguesa em idade escolar deve rondar os 1,5 milhões de alunos e se considerarmos um valor médio de gastos anuais em material escolar (livros e outro material) da ordem dos 200€ (valor que deve ser inferior à média de gasto real) facilmente se obtém um volume de negócios da ordem dos 300 milhões de euros.