segunda-feira, 25 de julho de 2016

A PIOR CRISE É A QUE NÃO QUEREMOS VER

A propósito dos recentes acontecimentos registados em países europeus, como a França e a Alemanha, e na Turquia (que por acidente geográfico é um pouco europeia), que levaram à instauração, parcial ou total, do estado de emergência, António Barreto aproveita para dizer que esta é a maior e «A pior crise» da Europa desde o final da II Guerra Mundial, avançando com inegáveis argumentos, como sejam: o alastramento do terrorismo e do medo que gera; a fragilidade duma unidade política agravada pelo fraco crescimento económico e pelas altas taxas de desemprego; a elevada tensão com a vizinha Rússia, a crescente pressão migratória vinda do Sul e do Médio Oriente, agora agravada pelo “turbilhão turco”; o “brexit” e a deslocação do “interesse americano” para o Oceano Pacífico, mas esquecendo aquela que parece a mais evidente explicações para este avolumar de “catástrofes”: a crise sistémica global, despoletada a partir de 2008 com a revelação da fragilidade do sistema financeiro global.


A revelação da inconsistência duma economia global de casino, desenvolvida por uma elite de “banksters” e de mega-ricos especuladores com o apoio duma classe de políticos que por comodidade ou pura ignorância alinharam no dogma da “infalibilidade dos mercados”, fragilizou todo o tecido económico e social dum sistema capitalista há muito anquilosado e marcou o início da fase de entropia.

A sua substituição é tão inexorável quanto o foi a do “ancien regime” feudal ou a queda do Império Romano e dispersar as atenções pelas crises subsidiárias (as que mais interesse continuam a despertar numa comunicação social também ela rendida aos dogmas dos mercados) apenas contribuirá para agravar os custos económicos e sociais que já suportamos; adiando o inevitável não contribuímos nem para a solução nem para a mitigação dos seus custos.

O regresso à execução de políticas em prol do interesse-geral, em detrimento do interesse particular dos “banksters”, deverá ser o suficiente para assegurar a recuperação dum crescimento económico centrado na esfera produtiva e não na especulativa e a única via para o restabelecimento da confiança dos cidadãos em novas lideranças políticas, que no caso europeu deverão ainda assegurar, prioritariamente, a coesão entre os estados e investir fortemente em três linhas: reformulação da moeda-única no sentido de transformar o BCE no principal financiador dos estados; criação do exército único europeu e reorientação da sua política externa no sentido da defesa dos interesses europeus; simplificação da estrutura e do ordenamento legislativo comunitário.

sexta-feira, 22 de julho de 2016

INADMISSÍVEL

Perante o avolumar de notícias sobre as “sanções” (nem que seja para dizer que teremos as «Sanções a Portugal decididas para a semana, congelamento dos fundos depois do verão») continuam a surgir reacções de contestação aberta que até já levaram o Presidente da República a assumir posição pública, não se estranhando que na abertura da "Grande Conferência Europa", promovida pelo Diário de Notícias, se tenha ouvido que «Marcelo considera inadmissível referendo em Portugal sobre a União Europeia».


A personalidade que nos habituou a sempre ter opinião sobre tudo aproveitou para defender que “a resposta só pode ser mais Europa, e não menos Europa”, que “considera um “erro” uma “aventura referendária” sobre a UE” e que entende inadmissível um “referendo sobre a pertença à Europa ou um referendo sobre a vinculação a tratados ou pactos celebrados no quadro europeu”; atravessássemos nós uma outra conjuntura (ou uma idêntica mas num quadro comunitário de igualdade e respeito entre os diferentes estados-membros) e talvez até pudesse concordar com ele, mas para que quererão os cidadãos europeus mais Europa da desigualdade e do secretismo?

É compreensível que a nomenklatura de Bruxelas e os “banksters” que a alimentam pretendam manter uma linha de actuação que lhes é claramente favorável e que os apaniguados que pululam pelos diferentes governos nacionais continuem prestáveis ao “normal” funcionamento da economia de casino que nos arrastou até onde estamos, agora que o comum dos cidadãos aceite tudo isto de bom grado e sem nada questionar é que é inadmissível e quase criminoso.

terça-feira, 19 de julho de 2016

ESCONDER PROBLEMAS

Já quase tudo se escreveu sobre a iniquidade das possíveis sanções a Portugal por causa da quebra da regra do limite do deficit, mas muito ainda permanece na penumbra sobre as verdadeiras razões para o processo aberto pela UE contra Portugal e Espanha quando outros estados-membros quebraram a mesma regra, ou outras, sem qualquer reacção dos eurocratas de Bruxelas. Foi assim com a França, que também ultrapassou o limite dos 3% do deficit, ou com a Alemanha que há anos vem desrespeitando o limite máximo de 6% para o superavit comercial; sobre o assunto «Juncker diz não sancionar a França "porque é a França"» e sobre a Alemanha... nem isso.

Enquanto «Espanha reage às sanções com mais 6000 milhões em impostos», por cá, «Costa diz a Bruxelas que tem verba para controlar défice» e mantém que nada irá mudar na sua estratégia e um dos seus parceiros de coligação, o «BE diz que há pressões para que processo das sanções se arraste ...», com o evidente intuito de desgastar até à inviabilidade o apoio parlamentar ao governo.

Claro que desde o início se percebeu que as “sanções” visam principalmente o “assassinato político” do governo de António Costa (nada de novo depois do que assistimos na Grécia), mas o recente empenho com que diversas figuras alemãs – Klaus Regling, o director-geral do Mecanismo Europeu de Estabilidade e «Director do fundo de resgate europeu só está “preocupado” com Portugal», Gunter Oettinger, comissário europeu para a Economia e a Sociedade Numérica que defende sanções contra Portugal, e o inefável ministro das finanças alemão, Wolfgang Schauble (ver o post «EFICIÊNCIA ALEMû) – têm vindo a terreiro defender aquela ideia justifica outra abordagem a tamanho interesse e preocupação.


Claro que todos têm em comum as suas crenças ordoliberais (além duma ancestral formação de natureza calvinista), mas neste momento creio bem que o seu principal receio é a situação do sistema financeiro alemão – ou não fosse cada vez mais evidente que o «Deutsche Bank assusta com "alertas já indisfarçáveis"», alertas que nos últimos dias se clarificaram quando o próprio «Deutsche Bank pede resgate de 150 mil milhões para a banca europeia» – e o desvio das atenções o seu principal objectivo

Conhecido desde finais de Junho que o «Fed reprova Deutsche Bank e Santander em "teste de stress"», ouvir o FMI dizer que o «Deutsche Bank é o maior risco mundial para a estabilidade», pode não passar dum eufemismo face à possível dimensão da tormenta que se avizinha. A confirmar-se que aquele banco alemão acumula produtos derivados num montante da ordem dos 70 biliões de dólares (mais de 20 vezes o PIB alemão, que em 2015 andou na ordem dos 3 biliões de euros) reduz a um quase absoluto zero o problema do incumprimento português e espanhol e a muito pouco a notícia de que o «Crédito mal parado em Itália atinge os 200 mil milhões de euros» (uns impressionantes 12% do PIB italiano) e torna bem mais perceptível porque é os políticos alemães falam tanto de Portugal... ajudados pelo FMI que parece ter esquecido o que disse há duas semanas e afirma agora no seu 'World Economic Outlook' que «Há problemas nos bancos portugueses que são um risco global».

Assim, a estratégia para enfrentar as anunciadas sanções não deve passar apenas pela sua contestação ou futuro repúdio, tem também que passar pela clara denúncia de que há muito o “kaiser vai nu”!

sábado, 16 de julho de 2016

SULTÃO ATÉ QUANDO?

Está já confirmado o fracasso da tentativa de derrube do regime turco de Recep Tayyip Erdogan e do seu partido (o AKP) de matriz islâmica.

Prontamente apontado como de origem externa (Erdogan associou já Mohammed Fethullah Gullen, seu ex-associado e grande rival depois de ter rebentado em 2013 o escândalo denunciando a corrupção do regime do AKP) o golpe terá soçobrado após o apelo feito por Erdogan aos seus apoiantes para que saíssem à rua em defesa do actual governo.


Embora aparentemente resolvida a «Tentativa falhada de golpe de Estado na Turquia», restam por esclarecer as verdadeiras razões para a iniciativa militar. Se estas derivarem dum clima de mal-estar resultante do agravamento do conflito com a minoria curda e não apenas duma justificada oposição ao desvario dum Erdogan que pretende ser um novo sultão absolutista num estado neo-otomano que encerra jornais e prende jornalistas e intelectuais (ver o post «DELITO DE OPINIÃO», enquanto reprime brutalmente as minorias étnicas (como a curda) e reduz os direitos das mulheres, talvez este fracasso iniba próximas tentativas; mas se a origem do problema estiver ligado à vizinha situação na Síria (onde o regime de Erdogan é um activo apoiante do Daesh que o recompensa com o petróleo contrabandeado para uma empresa do seu filho) ou ao recrudescimento das acções contra o PKK (o Partido dos Trabalhadores Curdos, que representa a minoria curda, retirou a maioria parlamentar ao AKP e é apodado de terrorista pelo regime de Ancara) e ao crescente número de baixas entre os militares turcos, então voltaremos a ouvir falar de revoltas na Turquia.


Inevitavelmente!

sexta-feira, 15 de julho de 2016

NICE

As comemorações de mais um 14 de Julho, em França, ficaram tristemente assinaladas por um atentado; desta vez numa pequena cidade do sul, em Nice, onde um camião irrompeu por uma multidão de pessoas que assistia ao tradicional fogo de artifício que assinalava a chegada do dia nacional francês, originando mais de oito dezenas de mortos e de uma centena de feridos.
Este foi o quadro geral com que os meios de comunicação divulgaram um atentado que algumas horas depois já começava a ser noticiado de forma bem mais integrada numa agenda política francesa cada vez mais ditada pela Front National, quando até o EXPRESSO se lhe referiu como «Forte polémica e perguntas sem resposta a seguir ao massacre de Nice» e todos ficámos a saber que Christian Estrosi – político republicano, antigo maire de Nice e presidente desta região do sudeste de França, acusado do envolvimento em dois casos de fraude e apropriação de fundos públicos e condenado por difamação – teria manifestado ao presidente François Hollande, precisamente na véspera e na sequência do anúncio do levantamento próximo do estado de emergência que vigorava desde os atentados de Paris, a necessidade de reforço dos meios de segurança.

A tudo isto se deve ainda juntar o facto de continuar ao rubro a polémica sobre as mudanças nas leis eleitorais e da contestação sindical associada só não ter sido tratada como actividade terrorista (quando o governo socialista de Manuel Valls tentou proibir uma manifestação sindical) graças ao repúdio generalizado da ideia e que em próximas ocasiões poderá não beneficiar já da mesma reacção, para concluirmos que o atentado de Nice pode constituir muito mais que uma mera acção de radicais islâmicos (aliás, ainda não reivindicada), porque mesmo apresentando um modus operandi habitual àqueles grupos parece muito mais enquadrada numa agenda visando a prorrogação do estado de emergência e a limitação às liberdades fundamentais dos franceses.

quarta-feira, 13 de julho de 2016

A EFICIÊNCIA ALEMÃ

Depois de ter sabido que em reacção à notícia que o «Ecofin confirma sanções para Portugal e Espanha» e que de pronto a «Espanha reage às sanções com mais 6000 milhões em impostos», não pode espantar o facto de lermos em seguida que «Schäuble diz que sanções são para “incentivar” Portugal a actuar».


Do ponto de vista do ordoliberalismo trata-se de, tal como anteriormente fizeram com a Grécia, conduzir as “ovelhas” tresmalhadas ao redil da obediência e do bem-estar dos mandantes (o futuro e o bem-estar dos mandados é irrelevante para quem sistematicamente se revela desprovido dos conceitos éticos mais básicos), por outras palavras uma simples apologética bem representada na figura da “política do cacete e da cenoura”.

Schauble e os seus “amigos” estão focados em garantir a salvaguarda dos interesses que representam e, o tempo têm-o comprovado, tudo farão para atingir esse objectivo. Crêem poder submeter tudo e todos, mas o que eles efectivamente almejam é disfarçar a fragilidade do tecido bancário alemão que caminha rapidamente para se revelar tão tóxico como o dos restantes parceiros da europa do dinheiro especulativo e depois da hecatombe apenas ficará a europa que eles mais têm desprezado; a europa do trabalho e do investimento produtivo.

terça-feira, 12 de julho de 2016

CLARO SR DIJSSELBLOEM...

Ainda não era conhecida a notícia de que o «Ecofin confirma aplicação de sanções a Portugal e Espanha» e já circulava na imprensa nacional uma outra manchete dando conta que «Dijsselbloem espera reacção “ofensiva” do governo».


Poucas têm sido as vezes que aplaudo comentários ou afirmações do sr. Dijsselbloem, mas desta vez tenho que concordar em pleno com a ideia que a aplicação de sanções sob a justificação de não terem sido adoptadas "medidas eficazes" para corrigir os défices excessivos, quando é sabido que as medidas aplicadas foram ditadas pela própria CE que agora pretende que foram insuficientes, só pode merecer uma “reacção ofensiva” do governo português.

É que não só pelas razões explicadas as sanções constituem por si só uma aberração, como a sua verdadeira finalidade não é a de alcançar o reequilíbrio orçamental,antes a de penalizar um governo que se mostra pouco cooperante com a ortodoxia e os dogmas neoliberais.

O cinismo e a hipocrisia de tudo isto é sabermos que a «Regra já foi violada mais de 100 vezes, mas Portugal e Espanha são primeiros a ser castigados», quando estes estiveram entre os países que mais fizerem para agradar a Bruxelas e às suas anacrónicas políticas financeiras e orçamentais.
Será preciso juntar ainda mais razões para concordar com o sr. Dijsselbloem? e esperar uma resposta adequada do governo português? especialmente depois de lermos que na opinião do PSD o Governo abriu porta a sanções por "razões políticas", como se existisse tal figura nos tratados europeus ou se a UE já tivesse deixado de ser, de jure, uma associação de estados livres.

É que agora, como na época da mudança de política expansionista para contraccionista, decretada pelo directório alemão, o que faz verdadeiramente falta para iniciar o processo de recuperação duma UE dos e para os cidadãos é haver quem de forma frontal diga “NÃO” à discricionariedade e à prepotência.

sábado, 9 de julho de 2016

O RELATÓRIO CHILCOT

Foi esta semana divulgado um relatório sobre a participação britânica na Guerra do Iraque; quinze anos volvidos sobre o início da invasão do Iraque e sete sobre o início dos trabalhos, concluiu-se por terras de Sua Majestade («Relatório Chilcot: O pior pesadelo de Tony Blair divulgado esta quarta-feira») que: 1) a justificação para a guerra foi deficiente; 2) a sua base legal esteve longe de satisfatória; 3) o Reino Unido sobrestimou a sua capacidade para influenciar as decisões norte-americanas sobre o Iraque; 4) a preparação e o planeamento da guerra foram “globalmente inadequadas”; 5) a intervenção militar não atingiu os objectivos fixados.

Foi preciso esperar tanto tempo para concluir o que basicamente veio sendo dito desde a primeira hora? Alguém, de bom senso, duvidava já que a famigerada justificação para a invasão do Iraque – as famosas armas químicas cuja existência os próprios especialistas da Agência Internacional para a Energia Atómica não reconheciam cabalmente – nunca passou duma mentira construída pela conjugação dos interesses do complexo industrial-militar norte-americano e da agenda da facção neo-conservadora?

Claro que os principais actores nesta farsa, George W Bush e Tony Blair, poderão continuar a clamar a sua boa-fé e o seu estrito interesse na defesa dos direitos humanos e dos valores da democracia ocidental, mas a responsabilidade pelos milhares de mortos e pelos milhões de desalojados resultantes, além da fragmentação cultural e política dum território milenar como a Mesopotâmia, continuará a ser-lhes atribuída por inteiro... além do famigerado episódio da estranha morte de David Kelly, um dos especialistas britânicos em guerra biológica que, suspeito de ter denunciado a falsificação do seu governo, se viu vilipendiado e perseguido até uma morte (sobre este assunto ver os posts «BLAIR, O SICOFANTA» e «VOLTAVA A FAZER O MESMO») que continua por esclarecer.


O «Relatório sobre guerra do Iraque arrasa Governo de Tony Blair», mas o pior é que veio revelar quão estranho foi o papel desempenhado por Tony Blair quando ignorando, como agora se sabe, que os próprios serviços de informação britânicos previram com antecedência a fragmentação do Iraque e o recrudescimento do terrorismo optou por secundar a loucura norte-americana em nome da preservação do papel de principal aliado. Por outras palavras, em nome duma visão imperial e contra a opinião generalizada dos seus parceiros europeus, o grande estadista Tony Blair, envolveu o seu próprio povo numa guerra sem justificação.

Pouco mais haverá a acrescentar salvo o desejo de que os actuais e futuros dirigentes políticos de todo o Mundo aprendam a lição, mas o entretanto sucedido nos casos da Síria e da Líbia, a par com o conhecimento de que «Durão Barroso vai ser presidente da Goldman Sachs» – em mais uma evidente recompensa pelo seu papel na infausta decisão onde ombreou com Bush e Blair –, deixam pouca, ou nenhuma, esperança.

segunda-feira, 4 de julho de 2016

ESTRANHEZAS


Poucos dias depois dum atentado no aeroporto de Ankara que o governo de Erdogan não conseguiu atribuir aos separatistas curdos e no final do período do Ramadão, surge a notícia que a Arábia Saudita foi vítima de três atentados em menos de 24 horas.


Apontado já como um Ramadão sangrento, pois em cinco dias o Daesh matou 190 pessoas em três países (125 pessoas em Bagdad, 20 em Daca e 45 em Ankara) quase não se fala no estranho facto dos três atentados em território saudita se terem resumido a provocar 4 mortes.

Claro que apenas uma que fosse teria sido uma a mais, mas que estes estranhos números podem sustentar a ideia que os atentados na Arábia Saudita parecem estranhamente benignos e quem sabe talvez motivados por razões estranhamente favoráveis a uma “limpeza” entre a esparsa oposição local à dinastia da casa Al-Saud... ou a afastar a evidente proximidade entre um regime influenciado em demasia pelo wahabismo, corrente sunita radical normalmente apontada como fonte ideológica dos movimentos sunitas extremistas, como a Al-Qaeda ou o Daesh.

A seguir com atenção as notícias (que transpirem para uns meios de comunicação especialmente conciliadores com o regime saudita) dos próximos dias...