terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

O QUE AFLIGE PAUL KRUGMAN


A atribuição pela academia de Lisboa de mais um “honoris causa” a Paul Krugman, economista e prémio Nobel norte-americano, tem merecido nestes últimos dias um grande destaque, não faltando notícias referindo que o «O Nobel contra a política de austeridade vai ser homenageado por três universidades»[1]; enquanto umas destacam a afirmação daquele académico que «Portugal deve baixar salários até 30%» outras preferem salientar que «Portugal deve baixar salários e não conseguirá pagar a dívida» ou apenas o facto de ser «Krugman, o admirador europeu que não perdoa a austeridade a Bruxelas».


Krugman, professor em Princeton, formado em Yale e doutorado no MIT (berço de Milton Friedman e da escola monetarista), nunca escondeu as suas preferências pela corrente neokeynesiana e há muito que se assumiu como uma das principais vozes críticas da chamada Nova Economia[2], à qual reprova o efeito do agravamento das desigualdades, tem defendido as virtualidades duma política económica que estimule a actividade em detrimento das que apenas se preocupam com objectivos orçamentais.

Colaborador do THE NEW YORK TIMES, jornal onde mantém uma coluna regular desde 2000 e um blog – The Conscience of a Liberal – Krugman é, há muito, uma das vozes mais escutadas em matérias económicas e tido como um dos economistas que mais têm contribuído para a divulgação daquelas matérias fora do círculo dos especialistas habituais. Autor de centenas de artigos técnicos publicados em revistas da especialidade (The Harvard Business Review, Foreign Policy, The Economist) e de duas dezenas de obras distribuídas entre académicas e de divulgação, Krugman foi considerado, segundo uma sondagem da revista Foreign Policy em 2008, um dos principais “opinion makers” mundiais.

Enquanto especialista em questões económicas, e em especial nas da área internacional, não costuma furtar-se a polémicas, usando frequentemente formas de expressão marcadamente provocatórias; exemplo disso ocorreu durante uma entrevista à CNN, conjuntamente com o economista-chefe do FMI, Kenneth Rogoff, quando, por analogia com o efeito da II Guerra Mundial na recuperação da Grande Depressão, referiu os benefícios que poderiam advir duma invasão vinda do espaço… 

Propostas, como a que aconselha «”Não apertem mais o cinto, vão apenas travar ainda mais o crescimento”» e que resulta da ideia de que face à reduzida inflação é sustentável uma injecção de moeda executada pelo BCE que contribua para o relançamento das economias, parecem amplamente confirmadas pela realidade que vivemos e até por notícias como a que assegura que a «Actividade económica volta a degradar-se me Fevereiro», mas, por se inserirem na mesma lógica que norteou as economias até ao estado em que se encontram, poderão não representar uma alternativa real para a crise.

Como sucede com todos os analistas e especialistas, mesmo que o ex-Governador do Banco de Portugal, Silva Lopes, tenha razão ao afirmar que «Krugman é um “fora de série” e um académico “brilhante”», nem por isso as opiniões e as propostas de Paul Krugman constituem solução garantida para problemas como os que enfrentam as economias da Zona Euro; a generalidade das suas reflexões, apontando muitos dos grandes problemas – como sucede na sua mais recente crónica no THE NEW YORK TIMES, onde critica abertamente a opção por políticas de austeridade, os cortes na despesa pública, o corte de salários e as opções do BCE privilegiando a contenção da inflação e contrariando a desvalorização do euro, que não conduzem senão ao agravamento do desemprego. 

A solução que propõe – injecção de liquidez pelo BCE – é prontamente objecto de crítica pelo pensamento neoliberal por ser geradora de inflação e, não abordando a verdadeira essência da problemática da criação privada de moeda, peca por insuficiência, quiçá geradora de maiores custos para os estados mais endividados.

É que Krugman sendo lesto e certeiro a enunciar as limitações e as ineficiências do modelo da globalização (não fosse ele um especialista em economia internacional) não reconhece, talvez por mera limitação conceptual, a verdadeira dimensão e profundidade da crise europeia que resume a uma questão monetária (criação duma moeda única desprovida dos mecanismos necessários ao seu funcionamento) e não como parte duma crise sistémica que abalando os próprios alicerces da economia global nunca poderá ser sanada simplesmente através de estímulos económicos, como é tradição da escola neokeynesiana.


[1] Esta iniciativa conjunta da Universidade Clássica de Lisboa, da Universidade Técnica de Lisboa e da Universidade Nova de Lisboa pode ser entendida já no âmbito do projecto de fusão entre a Clássica e a Técnica de Lisboa e que constituiu hoje notícia no PUBLICO.
[2] Expressão habitualmente usada para designar uma economia baseada no conhecimento e nos serviços, que resultou do progresso tecnológico e da globalização económica, em detrimento duma economia de base predominantemente industrial.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

A AVALIAÇÃO


Todos sabemos bem demais o que valem as sondagens, mas ainda assim não resisto a comentar os resultados da última sondagem encomendada pela RTP à Universidade Católica sobre o desempenho do governo da dupla Passos Coelho/Paulo Portas e divulgada quando ainda não haviam assentado completamente as cinzas do último Carnaval.


Refiro este facto pela dupla simbologia dum período de festividades ligadas à abundância e ao gozo dos sentidos e do clima de austeridade recessiva imposto pelo actual governo, agravada pela sua ridícula decisão de não autorizar a tradicional tolerância de ponto da Terça-feira Gorda para os funcionários públicos, anunciada a pouco mais de duas semanas do evento. 

Fruto disso ou da insatisfação que há muito se instalou entre a população, da sondagem resultou que a «Maioria dá nota negativa ao Governo» ou de forma ainda mais clara que «6 em cada 10 portugueses dizem que Passos está a governar mal». Mas esta não é uma conclusão fechada nem a única leitura possível do resultado, pois em resposta a uma segunda questão conclui a mesma sondagem que «Governo perde popularidade mas PS não é alternativa».

Esta conclusão parece-me bem mais importante e merecedora de análise que a óbvia reacção desfavorável às políticas ditadas pelos dogmas neoliberais. Mesmo podendo constituir uma mensagem subliminar no sentido de acalmar os menos satisfeitos (caso se considerem os claramente insatisfeitos como casos perdidos), ou simplesmente a constatação de que entre os partido do arco do poder (PSD, CDS e PS) não existem diferenças substanciais que justifiquem as expectativa de mudança na orientação política, tanto mais que o resultado serve perfeitamente os interesses do “centrão” político que nunca poderá negar a responsabilidade de ter conduzido o País ao estado em que se encontra.

Apreciada numa perspectiva menos “situacionista” a sondagem revela afinal que uma larga maioria da população (62%) rejeita a opção política seguida por Passos Coelho e Paulo Portas; ignora-se é como foi colocada a questão relativamente à alternativa.

Se o foi como uma pergunta aberta, do tipo «qual a alternativa?», ou (como é mais provável) de forma mais “simples” «o PS é alternativa?». É que o resultado de qualquer sondagem, inquérito ou referendo, depende muito da forma como as questões são formuladas e este é um excelente exemplo disso mesmo. Afirmar-se descontente com a actuação do Governo e contrapor que o principal partido da oposição não constitui alternativa, não implica, como de imediato é sugerido, a inexistência de alternativas, mas tão-somente que PSD/CDS e PS não constituirão parte da solução.

Ao contrário do habitual, o resultado desta sondagem deve ser escalpelizado (se não o foi já pelos “estrategas” dos partidos do “centrão”) e dela extraídas as conclusões adequadas que, honestamente, as notícias até hoje lidas omitiram ou não deram a adequada relevância.

Insistindo na ladainha da inexistência de alternativas está-se apenas a tentar assegurar que tudo continue na bonomia do costume, que os políticos (do governo ou da oposição) mantenham os discursos vazios de ideias mas bastos em instruções e demais mandos, que os comentadores se limitem ao óbvio e ao fácil, que os jornalistas reportem o oco e esqueçam o conteúdo e por fim, que todos nós continuemos numa existência pacata que garanta a sobrevivência dos anteriores.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

ZECA - 25 ANOS


Para não deixar passar em claro os 25 anos que o Zeca nos deixou sem novidades, lembro aqui o Homem que desde os tempos DE CAPA E BATINA entoou FADOS DE COIMBRA E OUTRAS CANÇÕES e imortalizou as CANTIGAS DO MAIO.


Fez-se à estrada COM AS MINHAS TAMANQUINHAS e entoou muitos (e bons) CANTARES DE ANDARILHO, quem sabe se não o fez até no CORO DOS TRIBUNAIS…

Ensinou-nos CONTOS VELHOS RUMOS NOVOS e a importância de dizer (e fazer) TRAZ OUTRO AMIGO TAMBÉM; cantou (e encantou) ENQUANTO HÁ FORÇA, disse VENHAM MAIS CINCO ou EU VOU SER COMO A TOUPEIRA, insistiu em FURA FURA, em transformar o nosso dia-a-dia e partiu sabendo que o estava a fazer.

Mais que o cantor de intervenção a que ainda insistem a reduzi-lo, Zeca Afonso foi a voz duma geração que embalou um sonho… que merece ser reavivado!

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

AINDA MAIS ESPREMIDOS


Confirmada a mais que prevista decisão europeia de novo resgate à Grécia, iremos finalmente assistir ao princípio do fim do calvário do Euro, ou pelo contrário, nada mudou e «A dívida grega é insustentável sem mais ajuda»? 

A questão não é retórica nem é de exclusiva aplicação à Grécia e a prova disso mesmo é que cresce o número de economias europeias que começam a ver-se apontadas (já apareceram referências claras à Bélgica e à França) como as próximas a sofrerem dos mesmos problemas e cujas populações já se antevêem em situação idêntica à que os gregos estão a sofrer.


Espremidos entre uma austeridade desprovida de efeitos práticos (excepto os de assegurarem maiores proventos para os do costume), uma total ausência de perspectivas de crescimento e lideranças desprovidas de qualquer visão estratégica, os cidadãos gregos têm enfrentado esta crise oscilando entre a indiferença e a revolta declarada, sob o olhar mais ou menos atento dos restantes cidadãos comunitários.

Injustamente empurrados pelos políticos a quem entregaram a condução dos destinos do país para uma situação de descrédito, vilipendiados pelas elites dos estados europeus que se julgam a recato de idêntico percalço, os gregos nem sequer podem ainda lobrigar a luz ao fundo do túnel pois parece cada vez mais evidente que este «Segundo resgate não retira Grécia do cenário de incumprimento»,confirmado aliás pela notícia de que «Fitch corta rating da Grécia para falência eminente».

Quando se constata que os resgates pouco mais têm feito que contribuir para o aumento do endividamento (seja este medido em termos absolutos seja em termos relativos ao PIB), torna-se cada vez mais natural a dúvida sobre a utilidade dos sacrifícios em salários, pensões e demais restrições que os gregos estão a suportar e que verão com este novo “pacote” acrescidos com uma nova redução de 3,3 mil milhões de euros nos gastos públicos, mais privatizações e maior flexibilização das leis laborais.

Depois da política punitiva que esteva na origem dos termos do primeiro regate (assinado em Maio de 2010) eis que o segundo se apresenta com contornos de verdadeira humilhação ao adicionar àquelas medidas:
  • a obrigatoriedade da consagração constitucional duma clausula privilegiando o pagamento das dívidas;
  • a constituição duma conta fora do orçamento para aqueles pagamentos;
  • a instalação em Atenas duma comissão de credores que vigiará o cumprimento do acordo.
Depois de tudo isto ainda restarão dúvidas que além de tentar assegurar o pagamento aos credores, as políticas preconizadas pelo FMI, o BCE e a UE mais não visam que a redução das economias intervencionadas a uma ainda maior dependência dos seus credores. É que se não fosse esse o caso uma das primeiras preocupações daqueles organismos deveria ser com o crescimento económico, pois sem este não existirão condições para a adequada amortização do serviço da dívida nem para uma redução sustentada do endividamento.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

TUDO ESTÁ A FALHAR... TUDO, NÃO!


Escreveu Daniel Oliveira, na sua última crónica no EXPRESSO, que «Nove meses depois da troika tudo falha»... 

Desculpem, mas não consigo partilhar em silêncio este comentário que além de profundamente negativo é igualmente injusto.

Nem tudo está a falhar! Pois, graças à simples presença duma entidade estrangeira (a tal “troika” a que se refere Daniel Amaral, completamente estranha a qualquer nacional vício de influência ou “cunha”), o governo de Passos Coelho e de Paulo Portas (é importante e conveniente não esquecer um parceiro cuja recente modéstia impede de se alcandorar aos lugares mais mediáticos) já conseguiu uma bem sucedida política de flagelação nacional.


Se não vejamos:
  1. reduzir os salários da função pública e equiparados (dando assim um importante sinal à iniciativa privada que abriu a época de saldos em boa parte dos custos fixos);
  2. alterar de forma radical a legislação laboral, abrindo caminho a ainda mais importantes (e principalmente menos onerosas) reduções dos quadros de pessoal; 
  3.  realizar um verdadeiro golpe constitucional, através da invocação duma qualquer “emergência nacional”, com o beneplácito e/ou apoio expresso daqueles que deveriam ser os principais defensores dos invioláveis princípios constitucionais, enquanto a Justiça continua a funcionar a duas velocidades e com pesos e medidas diversas em função da bolsa dos litigantes (a conclusão é inegável quando a própria «Ministra admite que em Portugal ainda há uma justiça para ricos e uma para pobres»);
e se acaso pensam que isto é pouco, muito pouco para tanto tempo de governo, e alguém de pronto refere a fatalidade do aumento do desemprego e o facto de já se anunciar que «Um quarto da população portuguesa em risco de pobreza», sempre recordo que o actual governo sempre revelou uma enorme preocupação com as políticas de combate ao desemprego; primeiro quando começou por nomear centenas de acessores, adjuntos, colaboradores, motoristas e de mais especialistas para engrossarem os depauperados quadros ministeriais (alguns dos quais beneficiando até duma aparente derrogação na política de redução salarial quando se tornou público que houvera «Nomeações para gabinetes ministeriais publicadas com direito aos dois subsídios»), depois quando proactivamenete lançou uma política de incentivo e claro apelo à emigração, em especial das camadas mais jovens e que, devido ao investimento (público) na sua formação, poderiam beneficiar de vantagens noutros países. 

Concluo, para os empedernidos críticos que não esquecem a questão da quebra na actividade económica e sempre prontos a estabelecer comparações do tipo «Portugal afunda-se Grécia e Irlanda em recuperação», lembrando que também nessa matéria o governo tem revelado preocupação e chegou mesmo a arriscar uma aumento no défice quando realiza sacrifícios de proceder à modernização da frota automóvel ministerial.