sábado, 30 de setembro de 2017

O VOTO PROIBIDO

Domingo vamos a votos!

Mas o significado da expressão varia consoante a ponta da península ibérica; em Portugal serão simples eleições autárquicas que levarão à escolha daqueles que irão dirigir os concelhos e as freguesias de norte a sul do país, mas na Catalunha o que está em jogo é muito mais que isso.

Fazendo eco duma ancestral aspiração (lembrem-se que no século XVII, quando lográmos recuperar a independência de Espanha, também a Catalunha lutou pelo mesmo direito e o seu malogro talvez tenha sido determinante para o desfecho que nos foi favorável) tem crescido um sentimento independentista entre os catalães, talvez alimentado por idênticos movimentos na Escócia (ver a propósito o post «ARA ES L’HORA») e depois do desmembramento doutros estados por essa europa de leste.


Apoie-se ou não a aspiração catalã, o que parece ressaltar do braço de ferro entre Barcelona e Madrid é uma clara incapacidade para o diálogo e uma gestão política duma crise que remonta à própria formação de Espanha, conseguida fundamentalmente devido à superioridade militar de Castela (reino que remonta ao primeiro milénio e de dimensão ainda hoje discutida), conduzida de forma canhestra que mais não tem feito que incendiar os sentimentos independentistas.

Muito diferente de não concordar com um referendo sobre a independência é optar pela sua proibição (por maior que seja a sua sustentação legal) como o fez o governo de Mariano Rajoy e criando todas as condições para o eclodir de confrontos físicos. Mesmo que apoiado pela generalidade do establishment madrileno (raras são as vozes que não se erguem contra a hipótese do poder perder cerca de 1/5 da riqueza nacional), dificilmente mais esta atitude discricionária poderá contribuir para apaziguar um diferendo tão antigo e com semelhante fundamentação histórica e nem o facto de vivermos tempos de extrema hipocrisia – basta recordar a reacção da chamada “comunidade internacional” a questões como o separatismo escocês e catalão, o controverso apoio ao desmembramento de estados como a Checoslováquia e a Jugoslávia ou até ao reconhecimento do Kosovo – pode justificar o simples apoio ou a condenação de castelhanos e catalães.

Talvez, afinal, o voto proibido acabe por ser o mais apetecido...

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

O REGRESSO DA ÁGUIA ALEMÃ

O resultado das eleições alemãs, marcado pela queda acentuada das forças políticas tradicionais (os democratas cristãos da CDU/CSU e os sociais democratas do SPD) e pela entrada para o terceiro lugar da hierarquia da extrema direita nacionalista do AfD e pelo regresso dos liberais do FDP (agora com discurso muito próximo da AfD), pode ter marcado o final de qualquer hipótese para o regresso a uma UE mais próxima dos valores fundadores.


O ressurgimento da “águia alemã” vai representar o enlameamento da vida política e social da Europa, pois tudo indica que os políticos, alemães e de outras nacionalidades, responderão à ascensão da extrema-direita com uma opção pelas ideias menos europeístas pelo que não será de estranhar termos, dentro em pouco, uma Europa a duas velocidades (ou mesmo três, se contarmos que teremos duas dentro da Zona Euro e outra fora dela) e veremos esfumar-se qualquer hipótese do Brexit poder contribuir com alguma coisa de positivo para a reforma da UE.


quarta-feira, 20 de setembro de 2017

TRUMP E A ONU

Decorre mais uma Assembleia-Geral da ONU, que anualmente reúne bom número de líderes mundiais para discursos mais ou menos de circunstância, com a esperada participação do Presidente norte-americano que contrariando a tardicional lógica dipomárica fez discurso nunca visto na ONU, anunciando a sua intenção de desdtruir a Coreia do Norte.


Ainda que o anúncio possa ser entendido como mais uma fanfarronada, o momento e o local escolhidos deverão dificultar ainda mais qualquer tentativa de negociação que a China possa estar a ensaiar. Na prática o que Trump terá feito foi fragilizar a quase moribunda ONU, dificultar ainda mais o papel de Pequim, a quem exige que contenha o vizinho belicoso, e fazer aumentar os receios de um eventual conflito, não faltando até que tenha aproveitado o ambiente de tensão para recordar que na Inglaterra a «Rainha Isabel II já tem discurso preparado para anunciar Terceira Guerra Mundial», ainda que este tenha sido redigido há mais de trinta anos.

Em resposta (e dentro das melhores práticas diplomáticas) a «China elogia acordo nuclear com o Irão depois de Trump o classificar de vergonha», classificando-o como fruto importante do multilateralismo e exemplo de como resolver questões por via diplomática. É que ao contrário do que pretende Trump, quando afirmou que «“Se não tivermos escolha vamos destruir totalmente a Coreia do Norte”», é sempre ao lado mais forte que cabe a respnsabilidade de prevenir o agravamento das crises até ao ponto de deflagração.

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

O POLVO INFORMATIVO

Encontrei hoje na secção de opinião do DN um interessante artigo de reflexão sobre o fenómeno das “fake news” e das “verdades alternativas” que grassa nos modernos meandros políticos.

Procurando ver para além das chamadas figuras de proa, a autora - Nina Khrushcheva, Professora de Assuntos Internacionais na Universidade de Princeton e membro do World Policy Institute e do Project Syndicate: Association of Newspapers Around the World - aponta a responsabilidade de figuras como Rupert Murdoch (o magnata da comunicação social que através da News Corporation controla os canais de TV FOX News e SKY e os jornais americanos New York Post e The Wall Street Journal, os ingleses The Times, The Sun, The Telegraph e o australiano Herald Sun) que acusa de falta de idoneidade, ou não tivesse ele estado ligado ao famigerado caso das escutas ielgais que levou ao «O FIM DO NoW».


Além da leitura, obrigatória, do artigo «O culpado», importa reflectir sobre a realidade nacional que tantas vezes anda demasiado próxima.

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

ALARGAMENTOS

Um dos tópicos retirado do discurso sobre o estado da União hoje proferido pelo presidente da Comissão Europeia, foi aquele onde «Juncker quer que todos os países da União Europeia adoptem o euro em 2019».


Fazendo clara tábua rasa das evidentes e por demais denunciadas limitações da moeda única, Jean-Claude Juncker parece contrariar agora as ideias apresentadas, em Março deste ano, no Livro Branco Sobre o Futuro da Europa que a própria Comissão patrocinou.

Na oportunidade apresentei no post «SEGURANDO A UE» as cinco vias – uma UE reduzida a um mercado comum, continuar o caminho seguido de crise em crise, uma UE ao sabor dos interesses de cada um dos membros, optar por uma solução de menos mas melhor Europa, escolher decididamente mais Europa – então sugeridas pela Comissão e que o seu presidente parece agora resumir a uma: mais Europa!

Mas que Europa num cenário onde impera uma moeda única claramente disfuncional e desenhada não para servir os interesses dos cidadãos europeus mas os do sector financeiro?

Os mais entusiastas dirão que esta opção é claramente a dum futuro com “mais Europa”, mas os mais esclarecidos verão na proposta agora apresentada por Juncker a continuação da estratégia em vigor – uma UE ao sabor das crises e da sua maior ou menor capacidade para as resolver – com a diferença que próxima crise será garantidamente de natureza interna, ou a opção de alargar a moeda única não fosse idêntica à decisão de alargamento ao leste europeu quando ainda não estavam devidamente resolvidas as assimetrias resultantes do alargamento da Europa a 15.

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

MALPARADO... BEMPARADO...

Confirme-se ou não, como noticiou esta semana o PUBLICO, que o «Banco de fomento vai financiar solução para malparado na banca» e mesmo desconhecendo-se todos os contornos da operação, salvo o facto desta englobar o BCP, a CGD e o Novo Banco, muitos concordarão que os sinais não serão os melhores.

Não se trata apenas das limitações materiais da iniciativa, referidas pelo NEGÓCIOS quando assegura que «Banco de fomento financia empresas com malparado mas viáveis» – ou seja apenas uma parte do bolo, cuja dimensão não é sequer oficialmente conhecida – mas também da completa ausência de intenções que corrijam os erros que levaram o sector financeiro onde se encontra.


Sobre a correcção dos modelos de gestão orientados para os resultados de muito curto prazo, ou sobre as conhecidas políticas de prémios indexados aos resultados semestrais auto-atribuídos pelos gestores de topo, nem uma palavra, quanto mais qualquer arremedo de inversão; e nem é bom falar no regresso a uma clara separação entre as actividades bancárias de índole comercial ou de especulação!

De tudo apenas se pode concluir que o malparado está... bem parado, o “lixo” criado desaparecerá do balanço dos bancos  e tudo assim irá continuar até à próxima crise.

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

ELE LEVANTOU-SE E... FALOU

Oficialmente encerrada ontem, qual folhetim de 3ª categoria promovido por jornais de pior classificação, a silly season nacional não podia ter terminado sem o adequado happening e assim foi que, com uma mãozinha da Universidade de Verão do PSD, Cavaco Silva voltou às parangonas noticiosas.

Para dizer o quê? Para garantir, do alto duma cátedra atenta e venerandamente escutada por um grupo de jotinhas e pelo seu ex-primeiro ministro favorito (também ele um ex-jotinha), no seu jeito habitualmente mefitstofélico e vingativo, que um dia a economia desalecerará!!!


Mas não se ficou por uma afirmação meramente tecnocrática e banal (o princípio dos ciclos económicos é que estes variam entre períodos de crescimento e de quebra), borrou-a com a sua conhecida verbe vingativa, afirmando – em clara negação com a realidade – que os «Governos que querem revolução socialista "acabam por perder o pio"» e mostrou-se atento aos ventos da actualidade invocando umas, agora obrigatórias, «“Fake news” e muitas críticas a Marcelo e Costa», que ninguém estranhou.

As críticas (indirectas) à verborreia de Marcelo e as mais directas às opções política de António Costa não se estranham face ao currículo e às conhecidas linhas de pensamento daquele que em tempos assegurou que nunca tinha dúvidas e raramente se enganava ou estoutra pérola que foi a dogmática afirmação de que duas pessoas com o mesmo tipo de informação tomam a mesma decisão; já a modernaça alusão às fake news, vinda de um ex-presidente da República que esteve na origem (através do seu acessor Fernando Lima) de notícias (falsas) sobre uma pretensa espionagem a Belém agora travestido em virgem púdica objecto de notícias falsas, não merecerá mais que uma sonora gargalhada.

Para terminar, achou por bem alertar ainda para um regresso da censura, como se o seu apego ao dogma da inexistência de alternativa não fosse ele mesmo uma clara forma de censura.

Claro que na reacção, o sibilino «António Costa considera “natural” que Cavaco Silva “tenha saudades de um palco”» enquanto o verborreico Marcelo Rebelo de Sousa se limitou a anunciar que «“Quando deixar de ser Presidente, não farei comentários sobre os meus sucessores”»; ambos usaram luvas de pelica para a bofetada que não remeterá o autor à tumba de onde saiu, enquanto os seus prosélitos dele continuarem (à míngua de melhor) carentes.