quinta-feira, 31 de agosto de 2017

O MEU MUNDO NÃO É DESTE REINO (NA VERSÃO MJ AVILLEZ)

Não sendo frequentador regular, quer da articulista quer da publicação, a curiosidade do título «O meu mundo não é deste reino» e o facto, conhecido de alguns amigos, de há vários anos usar essa mesma expressão de desabafo, levou-me a ler a mais recente crónica de Maria JoãoAvillez no OBSERVADOR.


Partilhando com a autora algumas das preocupações relativamente a questões como a do “pensamento único”, não me revejo claramente no essencial da sua análise e ainda menos no momento escolhido para apelar à mobilização dum “pensamento de direita” que diz amordaçado pela “esquerda radical”...

Ter-lhe-ia dado maior credibilidade se também a tivesse ouvido erguer a voz contra o mantra da ausência de alternativa propalado por essa Europa democrática que tanto glorifica e que teve na versão nacional-passista da “austeridade expansionista” o seu vértice.

Clamar agora, como o faz Maria João Avillez, soa mais a um toque a reunir dos ressabiados com os resultados da alternativa que a uma efectiva preocupação com a liberdade de pensamento!

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

A SOLUÇÃO DOIS ESTADOS

Durante uma visita a Israel e à Palestina que hoje termina, o Secretário-geral da ONU, António «Guterres defende solução de dois Estados para conflito israelo-palestiniano».

Ainda que esta posição não constitua novidade – tem sido defendida por sucessivos líderes da ONU e por grande parte da comunidade internacional – a realidade da ocupação israelita tem-se encarregue de a transformar em algo inexequível, mesmo quando a ONU reitera a ilegalidade dos colonatos construídos por Israel nos territórios palestinianos ocupados.

Essa política e a insistência ocidental na solução dos dois estados poderá garantir a coexistência e a cooperação entre Israel e os EUA, mas dificilmente garantirá outro caoisa aos palestinianos que a continuação da política de apartheid israelita.


Hoje, como escrevi em 2009 no post «O FIM DA SOLUÇÃO DOS DOIS ESTADOS», a questão continua igual e com poucas hipóteses de solução...

sábado, 26 de agosto de 2017

NENHUMA ALTERNATIVA À AUSTERIDADE? ESSA MENTIRA JÁ FOI PREGADA

Nas palavras de Owen Jones (colunista do jornal inglês The Guardian) aqui deixo a minha tradução do texto integral (um resumo pode ser lido nesta notícia do ECONÓMICO) como mais um contributo sobre a polémica inevitabilidade da ausência de alternativas...


«Nenhuma alternativa à austeridade? Essa mentira já foi pregada

Durante anos, disseram-nos que apenas os cortes profundos podem salvar a nossa economia. O governo de Portugal, liderado por socialistas, provou o contrário.

Owen Jones

Desde que os bancos mergulharam o mundo ocidental no caos económico, que nos dizem que apenas uma política de cortes podia oferecer a salvação económica. Quando os Conservadores e os Liberais Democratas (Lib Dems) formaram a sua coligaão de austeridade em 2010, disseram ao eleitorado - em tons apocalípticos - que, sem o bisturi de George Osborne, a Grã-Bretanha passaria pelo caminho da Grécia. A metáfora economicamente analfabeta de um orçamento familiar foi implantada implacavelmente - se você não deve gastar mais se estiver endividado, então, por que deveria a nação? - popularizando uma falácia com motivações ideologicas.

Mas agora, graças a Portugal, sabemos quão falha era a experiência de austeridade aplicada em toda a Europa. Portugal foi uma das nações europeias mais atingidas pela crise económica. Depois de um resgate pela troika, incluindo o Fundo Monetário Internacional, os credores exigiram rigorosas medidas de austeridade que foram adoptadas com entusiasmo pelo então conservador governo de Lisboa. Os serviços públicos foram privatizados, o IVA aumentado, imposta uma sobretaxa sobre os rendimentos, reduzidos os salários do sector público, as pensões e os benefícios sociais, e prolongado o horário diário de trabalho.

Num período de dois anos, os gastos com educação sofreram um corte devastador de 23%. Os serviços de saúde e a segurança social também sofreram. As consequências humanas foram terríveis. O desemprego atingiu um pico de 17,5% em 2013, em 2012, houve um salto de 41% nas falências das empresas e a pobreza aumentou. A lógica era a de que tudo isso era necessário para curar a doença dos gastos excessivos.

No final de 2015, essa experiência chegou ao fim. Um novo governo socialista - com o apoio de partidos de esquerda mais radicais - assumiu o cargo. O primeiro-ministro, António Costa, prometeu “virar a página da austeridade” dizendo que esta tinha feito o país recuar três décadas. Os opositores do governo predisseram um desastre e apelidaram-na de “economia voodoo”. Talvez um outro resgate fosse desencadeado, levando à recessão e até cortes mais acentuados.

Antes disso, havia um precedente, o Syriza havia sido eleito na Grécia apenas alguns meses antes, e as autoridades da zona do euro não estavam dispostas a permitir que essa experiência fosse bem-sucedida. Como poderia Portugal evitar a sua própria tragédia grega?

A lógica económica do novo governo português foi clara. Os cortes reduzem a procura: para uma recuperação genuína, a procura tinha que ser estimulada. O governo prometeu aumentar o salário mínimo, reverter os aumentos de impostos regressivos, devolver os salários e as pensões do sector público aos níveis anteriores à crise - os salários de muitos caíram 30% - e reintroduzir quatro feriados públicos cancelados. A segurança social para as famílias mais pobres foi aumentada, enquanto uma taxa de luxo foi imposta em casas no valor de mais de 600.000 euros.

O desastre prometido não se materializou. No outono de 2016 - um ano depois de assumir o poder - o governo podia-se orgulhar de um crescimento económico sustentado e de um aumento de 13% no investimento privado. E este ano, os números mostraram que o déficit diminuiu mais de metade, para 2,1% - menor do que em qualquer momento desde o regresso da democracia há quatro décadas. Na verdade, esta é a primeira vez que Portugal cumpriu as regras fiscais da zona do euro. Enquanto isso, a economia cresceu por 13 trimestres sucessivos.

Durante os anos de cortes, as instituições de caridade alertaram sobre uma “emergência social”. Agora, o governo português pode apresentar-se como um modelo para o resto do continente. “A Europa escolheu a linha de austeridade e teve resultados muito piores”, declarou o ministro da economia, Manuel Caldeira Cabral. “O que estamos a revelar é que, com uma política que devolve rendimento às pessoas de forma moderada, estas ganham mais confiança e o investimento retoma”.
Portugal aumentou o investimento público, reduziu o déficit, reduziu o desemprego e a economia cresceu de forma sustentada. Foi-nos dito que isso era impossível e, francamente, delirante. E assim os trabalhadores britânicos suportaram o maior aperto nos salários desde o século XIX, enquanto a coligação nem se aproximou sequer de cumprir o seu compromisso de erradicar o déficit até 2015. Porquê? Em parte, porque os baixos salários significam que os trabalhadores pagam menos impostos, recebendo mais benefícios e gastando menos dinheiro. Portugal está a aumentar a procura; os conservadores a suprimi-la.

O sucesso de Portugal é inspirador e frustrante. Toda essa miséria humana na Europa - e para quê? Como na Grécia, onde mais de metade dos jovens definha no desemprego, onde os serviços de saúde foram dizimados, onde a mortalidade infantil e o suicídio aumentaram? E a Espanha, onde centenas de milhares foram expulsos das suas casas? Ou a França, onde a insegurança económica impulsionou a ascensão da extrema direita?

Portugal e Grã-Bretanha também oferecem lições para a social-democracia. Após o colapso dos banqueiros, os partidos social-democratas abraçaram a austeridade. O resultado? Colapso político. Na Espanha, o apoio aos socialistas caiu de 44% para uns escassos 20%, enquanto a esquerda radical do PODEMOS cresceu com os seus votos. Na Grécia, o PASOK quase desapareceu como uma força política. Em França, os socialistas alcançaram pouco mais de 6% na primeira volta das eleições presidenciais deste ano. E na Holanda este ano, o Partido Trabalhista caiu de um quarto das votações para menos de 6%.

Em contraste, os dois partidos social-democratas que quebraram com a austeridade - em Portugal e na Grã-Bretanha - estão a conseguir melhores resultados do que quase todos os seus partidos irmãos. De facto, as pesquisas mostram que os socialistas de Portugal estão agora a 10 pontos de distância do partido de direita do país.

A austeridade na Europa foi justificada com o mantra “não há alternativa”, destinado a conduzir a população para a submissão: mas afinal precisamos ser adultos e viver no Mundo real.

Portugal oferece uma forte repreensão. A esquerda europeia deve usar a experiência portuguesa para remodelar a União Europeia e travar a austeridade em toda a zona do euro. Na Grã-Bretanha, o trabalho pode sentir-se mais encorajado a romper com a ordem económica dos conservadores.
Durante a década perdida da Europa, milhões de pessoas consideraram que havia uma alternativa. Agora temos a prova.»

...e reforço a necessidade de todos discutirmos o assunto.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

INVESTIMENTO OU ESPECULAÇÃO?

A recente notícia de que os «Bancos ficam com a fatia de leão do investimento directo estrangeiro», só pode espantar os mais distraídos ou os que ainda acreditam na superioridade e na “bondade” dum sistema há muito capturado pelos interesses especulativos e de resultado rápido.


Mesmo admitindo a necessidade de recapitalização do sector financeiro nacional (maioritariamente descapitalizado pelos investimentos de risco praticados) nada explica que tenha sido precisamente no sector da indústria transformadora que se registou a maior redução (mais de 510 milhões de euros, no período homólogo entre Junho de 2016 e Junho de 2017) salvo a clara opção pela manutenção da chamada economia de casino a que se dedica a generalidade do sector financeiro e abraçada por todos os que buscam resultados rápidos, custe a quem custar...

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

O GRANDE PAI BRANCO

A vilania e a falta de carácter dos principais líderes mundiais continua a ser uma evidência cada vez mais difícil de negar. O último exemplo veio dos EUA, onde mais um episódio de «Ódio, intolerância e violência deixam rasto de morte na Virginia», quando na sequência de manifestações contra e a favor da remoção duma estátua de Robert E. Lee (general confederado e herói dos movimentos supremacistas) um «Carro atropela multidão e provoca 1 morto e 19 feridos».

Mesmo sem pretender negar o direito a todos manifestarem a sua opinião parece inegável que a frouxa condenação proferida pelo presidente, onde «Trump reparte a culpa pela violência em Charlottesville», representa um perigo bem mais grave que o do mero apoio à chamada alt-right norte americana.


Trump assume-se não apenas como um apoiante de movimentos racistas (com o famigerado Ku Klux Klan) e neo-nazis, mas principalmente como um presidente cada vez mais isolado na sua visão da América (com uns EUA, país originado por emigrantes voluntários e forçados, cada vez mais divididos pelo racismo e pela xenofobia) e do Mundo.

Tivesse ele mostrado o mesmo grau de contenção e de compreensão do “outro lado” e talvez a escalada militar que se vive do sudoeste asiático não fosse a grave realidade que é, não apenas com o anúncio do exercício anual com a Coreia do Sul mas também com o Japão, atingindo um grau onde a principal responsabilidade é sempre do lado mais forte.

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

O BCE AINDA NÃO SALVOU O EURO

A propósito da passagem, hoje, do décimo aniversário do início da crise do “subprime” – marcada na Europa pela decisão do BNP Paribas suspender três dos seus fundos de investimento mais expostos às dívidas hipotecárias norte-americabas –, a edição do último fim-de-semana do EXPRESSO incluía uma entrevista com Kenneteh Rogoff (co-autor, com Carmen Reinhart, do célebre relatório «Growth in a Time of Debt» que se transformou na biblía de qualquer candidato a economista neoliberal), onde este defendeu algum perdão da dívida e a flexibilização das regras orçamentais europeias...


O espanto, deixado por Nicolau Santos no texto jocoso que intitulou «Rogoff, o esquerdista que quer perdoar as dívidas», poderia ser ainda maior não fosse esta ter sido mais uma das vezes em que Rogoff fez declarações que contradizem no essencial o postulado da diabolização da dívida – o tal princípio fundamental que os neoliberais leram nos seus trabalhos e que este nunca criticou, mesmo depois de revelada a existência de erros naquele referido estudo.

Se sobre a questão dos erros e da sua natureza já me pronunciei em Abril de 2013, no “post” «ACONTECE…», recomendo que sobre uma das primeiras tentativas de desculpabilização de Rogoff, no artigo «A Europa e a sua pulsão pela dívida», publicado pelo NEGÓCIOS, releiam o “post” «O FIM DO SEQUESTRO DAS IDEIAS?», publicado em Julho de 2014, e percebam que na realidade e ao contrário do que sugere o título da entrevista, o BCE não zangou a Alemanha e continua longe de salvar o Euro.

domingo, 6 de agosto de 2017

VENEZUELA PARTIDA

Consumada a coexistência de duas câmaras legislativas (a Nacional e a agora eleita Constituinte) agrava-se o quadro político na Venezuela ao ponto de se poder dizer que «Maduro inaugurou a constituinte e abriu novo capítulo na história da Venezuela».

Que não será um capítulo pacífico, é hoje uma quase certeza.


A conjuntura político-social aponta cada vez mais para uma Venezuela partida, cuja divisão poderá rapidamente descambar para um conflito armado e onde, obviamente, as partes atribuem a exclusividade da culpa à outra.

Para ajudar este clima, a imprensa e a opinião pública (local e externa) pouco têm contribuído para a formação de juízos equilibrados ou para a mediação. Abunda a difusão de opiniões diabolizando Nicolás Maduro e os seus apoiantes (com casos confirmados de clara e vergonhosa manipulação da informação, como relatou Daniel Oliveira no artigo «Imprensa e Venezuela: uma história exemplar de manipulação») enquanto se “esquece” que os opositores democráticos são os mesmos que em 2002 tentaram contrariar as sucessivas vitórias eleitorais de Hugo Chávez fomentando uma tentativa de golpe militar para derrubar o governo legítimo e que desde então têm tentado por todos os meios, incluindo a violência, alterar a situação política interna sem revelarem outra ideia que não seja um anti-chavismo quase primário.

Perante este cenário será cada vez mais difícil escolher entre Nicolás Maduro (personalidade a quem falta o carisma de Hugo Chávez e muito saber político para enfrentar a situação, com o demonstra a ideia de eleger uma Assembleia Constituinte) e o triunvirato (Leopoldo López, Henrique Capriles e Maria Corina Machado) criado à volta do MUD (a Mesa de Unidade Democrática), cujo historial pouco ou nenhum juz faz ao nome nem contribui para o estabelecimento das indispensáveis pontes de diálogo que conduzam a uma solução.

quarta-feira, 2 de agosto de 2017

NEGÓCIOS DA CHINA

Ler na página on-line do EXPRESSO que o «PCP propõe renacionalização dos CTT» lembrou o arranque anual da seally season, ou não tivessem eles próprios recordado que a privatização consumada pelo PSD/CDS foi preparada por vários governos, incluindo o PS.


A abertura para debate do tema não poderia ter sido pior – o reconhecido conluio PSD, CDS, PS – e não augura o menor sucesso a uma iniciativa que tem tanto de meritória quanto de malogro assegurado. Não que ele não deva ser debatido e ainda menos utilizado como ponto de partida para um debate mais alargado sobre a política de privatizações.

Recorde-se, a título de exemplo um artigo da VISÃO, publicado em 2015, que questionava se «Ganhamos alguma coisa com as privatizações?», lembrando (como o fez Mariana Mortágua) que desde 1977 foram arrecados 38 mil milhões de euros – no período de vigência do governo Passos Coelho/Paulo Portas o montante foi de 9,2 mil milhões – e que desde 1977 só as privatizadas PT e EDP deram cerca de 20 mil milhões de euros de lucro, valor que representa mais de 50% do “lucro” de todas as privatizações.

Por último, deixava como sugestão de leitura para o período das férias o livro NEGÓCIOS DA CHINA, de Anabela Campos e Isabel Vicente (Edição Tinta da China), onde as autoras falam sem rebuço na perda de sectores estratégicos e como abrimos mão deles como nenhum outro país no mundo!