terça-feira, 27 de abril de 2010

DIAGNÓSTICOS...

É interessante que depois dos “avisos” sobre a inoperância dos governos dos diferentes países relativamente ao desenvolvimento da crise e à necessidade de uma rápida reformulação dos termos de funcionamento das instituições financeiras que em várias oportunidades tenho vindo a lançar, se possa hoje ter lido no ECONÓMICO que segundo Nouriel Roubini «Os Governos falam em reformas mas não as implementam».

Esta afirmação – pomposamente usada para título da notícia – é apenas uma parte do ponto de vista daquele analista que, tal como escrevi no passado fim-de-semana, salienta a existência de muitas outras economias em situação particularmente frágil, como a inglesa, a americana e a japonesa.

O tema além de pouco aprofundado, corre o risco de passar quase despercebido no manancial da restante informação, que varia desde o catastrófico «Portugal mais próximo da bancarrota» (como noticia o EXPRESSO), passa pelo aviso do JORNAL DE NEGÓCIOS de que «Risco da dívida de Portugal, Grécia e Espanha em máximos históricos» e pode até concluir-se com as opiniões (também lidas no ECONÓMICO) de Ricardo Reis que pressagia que «Portugal terá um ‘crash’ se continuar sem crescer» ou as de Vítor Bento que coloca ênfase na necessidade que «Portugal tem de estabilizar rápido o rácio de dívida», que sendo questões importantes apontam mais para acções pontuais (sempre necessárias para a correcção dos pequenos desvios) que para aquelas que pela sua natureza e extensão se revelam cada vez mais indispensáveis para um combate eficaz a à crise global que vivemos.

domingo, 25 de abril de 2010

A LIBERDADE ESTÁ A PASSAR POR AQUI

Apesar do arrazoado que há alguns meses se vez ouvir pela imprensa nacional e em especiais pelos canais televisivos, poucos terão dúvidas que com o fim do Estado Novo tem soprado um persistente vento de liberdade.
Mesmo durante o período de apogeu e declínio da ditadura corporativa/fascista, que teve em Oliveira Salazar o seu representante maior, sempre foram soprando algumas trovas e outros dizeres que incendiaram almas e fizeram renascer esperanças… que mantiveram a chama e o apego a esse bem maior que, goste-se ou não, saiu para a rua numa manhã de Abril.

Trinta e seis anos volvidos continua a haver quem (com a mais desavergonhada desfaçatez) a confunda com fazer o que muito bem se quer sem cuidar dos direitos dos outros, mas ainda assim é preferível isso, e a possibilidade de tal denunciar, que ver todo um Povo vergado a um qualquer clima de medo; até quando esse mesmo Povo parece resignado ao infortúnio de continuar a ser mal governado – e esbulhado do orgulho e da vontade de dizer BASTA – e temeroso de uma bancarrota que a incapacidade e os desmandos dos mandantes tornou possível de acontecer.

Trinta e seis anos volvidos continuamos a apresentar um tecido produtivo retrógrado e anquilosado, que nunca se conseguiu libertar dos preconceitos (e das vantagens) corporativistas do condicionalismo industrial, ansioso pela protecção e as benesses de um Estado que quer ver a funcionar à sua imagem e semelhança e visceralmente agarrado a um modelo de baixos salários.

Trinta e seis anos volvidos continuamos a revelar-nos incapazes de fazer funcionar os mais básicos dos mecanismos de equilíbrio social, como sejam um sistema de ensino onde os jovens adquiram efectivas capacidades e competências, um sistema de saúde onde TODOS sejam objecto de cuidados adequados e um sistema de redistribuição da riqueza produzida que efectivamente reduza as desigualdades.

Trinta e seis anos volvidos parece termos esquecido o brilho das alvoradas e a capacidade de sonharmos…mas nem todos, de quando em vez sempre se vai ouvindo uma ou outra voz que lembra (para escândalo e pronto repúdio dos Novos Senhores) que a LIBERDADE ESTÁ A PASSAR POR AQUI!

sábado, 24 de abril de 2010

O ANEL DE FOGO

O cenário descrito no “post” anterior e as dúvidas que tenho vindo a colocar sobre a verdadeira origem e fundamentação das notícias e dos comentários sobre a dívida pública (e o risco soberano) denominada em euros já deveria ter sido suficiente para, no mínimo, lançar a dúvida sobre a ideia de cerco que pretendem criar em torno do Euro e da dívida denominada nessa moeda.

É que importa não esquecer que contrariamente a uma ideia corrente a actual crise não é produto meramente circunstancial mas sim o resultado do esgotamento do modelo de desenvolvimento que resultou da correlação de forças no final da II Guerra Mundial as quais sempre têm sido geridas em benefício de americanos e ingleses (os verdadeiros arquitectos do modelo financeiro acordado em 1944 em Bretton Woods), mas que agora apresenta fraquezas estruturais que se têm vindo a revelar cada vez mais insanáveis.

É precisamente por não estarmos a atravessar uma mera crise conjuntural que a sucessão de rápidos e cada vez mais graves acontecimentos não pode ser ignorada e ainda menos escamoteada das análises e das medidas com as quais governos, bancos centrais e demais agentes políticos e económicos se propõem enfrentá-la.

A realidade que se tem pretendido criar em torno do Euro e dos países do Eurogrupo, ganha outra dimensão (e clareza) quando observada numa perspectiva gráfica como a que nos é dada pelo quadro apresentado pela Reuters; neste aparece representada a posição de cada Estado em função dos volumes de crédito contraído (défice total do sector público) e do peso do défice anual (em função do respectivo PIB), revelando a situação difícil de algumas das economias da Zona Euro, mas também a igualmente vulnerável situação dos EUA, do Reino Unido e do Japão.

Se é certo que Portugal integra o grupo de economias que simultaneamente apresentam maiores défices públicos (quando avaliados na dupla perspectiva do seu saldo e da variação anula relativamente ao respectivo PIB), não é menos verdade que o seu maior risco apenas poderá derivar da maior fragilidade da sua capacidade económica, pois economias tidas como mais pujantes (como por exemplo a japonesa, a inglesa e a americana) apresentam maiores volumes de endividamento (Japão) ou taxas de variação anual (Reino Unido e EUA) bem maiores e destes três casos a imprensa anglo-saxónica pouco ou nada refere.

Ora a confirmarem-se os cenários previsionais elaborados pelo “think tank” europeu LEAP (Laboratoire Européen d’Antecipation Politique) as economias mais susceptíveis de ruptura são precisamente a americana e a inglesa, facto que aliado ao peso que as mesmas representam na economia mundial (e em especial no segmento financeiro) e ao facto do dólar americano ainda continuar a ser utilizado como moeda de referência e de pagamentos internacionais explicará a quase ausência de referências nos meios de comunicação.

Sendo uma realidade que Portugal integra um grupo de países cuja situação financeira deixa muito a desejar e que nos últimos anos os governos (do PS, do PSD e do CDS) que têm dirigido os destinos do país usaram e abusaram do endividamento como via para a resolução da crónica falta de recursos, e pior, do endividamento como solução para o cumprimento dos encargos dos endividamentos anteriores) nem por isso a nossa situação é geralmente pior que a de outros países com economias bem mais fortes (e teoricamente bem mais sólidas), pelo que a solução para a situação não pode passar pela tratamento de cada caso de forma isolada.

Se no caso da Grécia a própria UE (com maior ou menor empenho individual de cada um dos seus estados-membros) já começou a dar sinais da necessidade de uma abordagem colectiva e isso constitui um primeiro sinal de que não irá abandonar a sua moeda à voragem dos interesses especulativos nem admitir que ela sirva de meio para a salvaguarda de interesses de terceiros (dólar americano e libra inglesa), a dúvida pode voltar a colocar-se no caso de aumentar o número de estados-membros a necessitar de apoio e os montantes de financiamento a desbloquear.

Mas esse (o da dimensão das necessidades de financiamento) é precisamente o principal problema que enfrentarão em breve ingleses e americanos, que em conjunto necessitam mais de 2 biliões de dólares, quando é conhecido o facto dos chineses estarem a reduzir a sua habitual apetência pela dívida norte-americana[1].

Já os ingleses, a somar às inevitáveis dificuldades resultantes da escassez de liquidez que continua a fazer-se sentir nos mercados e à crescente debilidade da Libra, terão que enfrentar ainda o acto eleitoral que decorrerá no principio de Maio, concluído o qual poderá muito bem ocorrer um fenómeno idêntico ao recentemente registado na Grécia e “descobrir-se” que a dimensão do défice público é bem superior aos valores oficialmente anunciados pelo governo trabalhista de Gordon Brown.

Dada a relevância que ainda é comum associar-se ao mercado da Libra (sem esquecer os estreitíssimos laços entre a City londrina e a americana Wall Street) qualquer perturbação nele originada espalhar-se-á rapidamente e as já diminutas hipóteses de renovação da dívida americana deverão esfumar-se a idêntica velocidade, com o evidente inconveniente (quando comparado com a dívida portuguesa, a grega ou de qualquer outro dos membros do Eurogrupo) de que aquele efeito propagar-se-á à velocidade da luz. E se os ingleses ainda poderão acalentar algumas esperanças de vir a beneficiar de alguns restos de solidariedade europeia[2], já os americanos dificilmente poderão contar com quem quer que seja tamanho é o montante das suas necessidades de crédito.

Assim, pressagiar a ocorrência de uma nova fase no desenvolvimento da crise global – a da insolvência dos Estados – é cada vez menos um exercício de futurologia barata mas uma dura realidade.
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[1] Ver esta notícia da Associated Press.
[2] A dúvida afigura-se tanto mais pertinente quanto é reconhecida a atitude britânica de persistente distanciamento face às políticas de integração europeia e quanto tem sido prejudicial à UE a estratégia de permanente aproximação entre Londres e Washington.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

O RISCO SOBERANO

Pouco mais de quinze dias volvidos sobre o anúncio da decisão do Eurogrupo de apoiar financeiramente a depauperada Grécia e das primeiras notícias dando conta da reacção positiva dos mercados de capitais, eis que voltaram a ser notícia os problemas financeiros de outros países da Zona Euro.

Na primeira linha, como é evidente, não podia deixar de estar a economia portuguesa ou não fosse esta outra das mais endividadas; o estranho não é tanto aquele facto mas sim a forma cíclica como este tipo de notícias e comentários vão surgindo o que, somado a outros factores como sejam a persistência dos sinais de crise nos EUA e na Grã-Bretanha, a consequente fragilidade das respectivas moedas e os elevados níveis de endividamento, indicia que a verdadeira razão reside menos na realidade que descrevem que numa sustentada ânsia de propagandear os problemas alheios (nomeadamente os do Euro) como forma de escamotear os seus fantasmas e as suas próprias dificuldades.

A este factor, de natureza estratégica, deve ainda acrescentar-se um outro – a essência da actuação dos próprios intervenientes nos mercados de capitais e a inevitabilidade da aplicação das suas estratégias especulativas – para assim se poder compreender a verdadeira sustentabilidade das afirmações e o clima de terror que procuram instalar.

Porém, os interesses mais ou menos obscuros não podem justificar que as respostas àquelas críticas se resumam a silêncios comprometedores ou à mera denúncia dos óbvios interesses que lhes estão subjacentes. Queiramos ou não existe uma verdadeira fundamentação para os alertas – não só o nível do endividamento externo português é exagerado como as medidas propostas pelo governo de José Sócrates parecem insuficientes para inverter a situação – e de pouco servirá argumentar que os seus autores desconhecem a realidade da economia nacional ou que o que o que os move são meros objectivos especulativos.

Embora não esperasse ouvir de qualquer dos principais responsáveis nacionais ou comunitários declarações reveladoras de uma efectiva determinação para enfrentar o problema, não posso deixar de aqui referir duas que mais se destacaram; as recentemente proferidas pelo Presidente da República que disse que «Não acredito que se chegue a uma situação de bancarrota» – cuja essência se podia resumir a uma profissão de fé e como tal desprovida de fundamentação – ou as atribuídas ao comissário europeu dos Serviços Financeiros, o francês Michel Barnier, que defende a necessidade de «...pôr um ponto final a anos de escuridão, opacidade e comportamento secreto»[1] na produção e negociação de produtos derivados.

Tranquilizem-se os mais impressionados por esta ideia, pois rapidamente o membro da Comissão dirigida por Durão Barroso se apressou a esclarecer que tudo será feito e concertado no contexto das reuniões do G20 que deverão decorrer em Junho e Novembro; por outras palavras, tudo continuará como até agora pois evidentemente os líderes mundiais deverão optar pela estratégia reconhecidamente comprovada de pouco fazer para que tudo continue como antes.

É evidente que embora o paradigma desta estratégia seja representado por declarações como a de Cavaco Silva, a quem pouco faltou para propor que se aproveite a próxima visita papal para usar a influência do que tem assento no cadeirão de S. Pedro junto dos céus e assim garantir que nada de mau nos aconteça, nem por isso a tonitruante ameaça de Barnier representa mais que uma pia (e completamente inócua) ameaça.

A estratégia de nada ver, nada ouvir e nada dizer continuará a ser a privilegiada por aqueles que dizem representar os interesses do Povo na condução dos negócios públicos e que entretanto vão mantendo inalteradas as condições para que as grandes empresas financeiras mundiais (e os seus accionistas) continuem a lucrar com o cenário de crise económica mundial que criaram.
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[1] A citação foi extraída do artigo do I ONLINE «Bruxelas acusa bancos de empurrar Portugal para a falência».

domingo, 18 de abril de 2010

A NOVA LUTA DE ELBARADEI

Os egípcios, modernos representantes de uma das mais antigas e grandiosas civilizações, e a sua especial situação política têm nos últimos meses merecido algum destaque na imprensa internacional.

Seja porque se aproxima a data de fim do mandato presidencial de Hosni Mubarak, seja porque recentemente parece ter surgido uma nova estrela, o ex-director-geral da AIEA (Agência Internacional para a Energia Atómica) e prémio Nobel da Paz 2005 – Mohamed ElBaradei, no intricado firmamento político egípcio.

Se poucos têm dúvidas quanto ao pendor ditatorial do regime egípcio (fenómeno quase natural nos regimes árabes) e muitos reclamam a necessidade de uma maior democraticidade no país, raros serão os que verdadeiramente crêem numa possível democratização do regime.

Recorde-se que Mubarak (militar de carreira, nomeado comandante-chefe da Força Aérea e depois vice-presidente por Saddat) ascendeu ao poder, em 1981, na sequência do assassinato de Anwar Al Saddat (o presidente egípcio que assinara em 1979 os famigerados Acordos de Paz de Camp David, com o primeiro-ministro israelita Menachem Beguin e o presidente norte-americano Jimmy Carter) e desde então tem dirigido o país de forma praticamente ditatorial. O arremedo de abertura que representaram as eleições de 2005 traduziu-se numa vitória com mais de 88% dos votos e em 4 anos de prisão para o seu principal opositor Ayman Noor, o líder do partido ElGhad (Amanhã). Embora várias vezes desmentida é corrente no Egipto a ideia da preparação da candidatura do seu próprio filho, Gamal, à sua sucessão em 2011.

Sucede que a aparição na cena política egípcia de ElBaradei, aureolado por um Nobel da Paz e pela imagem de grande prestígio internacional que lhe granjeou a sua actuação durante o período que antecedeu a Segunda Guerra do Iraque e que recentemente cessou funções na AIEA, poderá introduzir um factor de considerável instabilidade e motivar até uma recandidatura de um Mubarak cada vez mais enfraquecido, não só pela idade (Mubarak conta já 82 anos) mas principalmente por uma saúde cada vez mais frágil.

Embora algumas vozes no interior do próprio Partido Nacional Democrático (o partido criado por Al Saddat e que apoia Mubarak) se manifestem favoráveis a uma abertura[1], a sua efectiva concretização estará sempre muito mais dependente dos egípcios e da sua mobilização que da iniciativa dos políticos instalados no poder, tanto mais que a própria oposição se revela especialmente fragmentada e dividida por interesses e personalidades particularmente vincadas.
Jogando habilidosamente com esta característica, com a agitação do espantalho (para consumo ocidental) do perigo do islamismo extremista (personificado na cena política egípcia pelos Irmãos Muçulmanos) e com a tradição muçulmana de governos autocráticos, Mubarak tem ultrapassado os escolhos que lhe forma surgindo no caminho.

A grande dúvida, que analistas locais e estrangeiros levantam é se conseguirá enfrentar ainda um ElBaradei que de forma inteligente fala mais na necessidade de democracia que na sua própria eleição[2] e assim se apresenta aos egípcios como importante factor de esperança na mudança.
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[1] Entre estes, a BBC NEWS cita nesta notícia o Professor Hossam Badrawi, figura proeminente do PND, que terá afirmado que «quem esteja no poder durante tanto tempo cria à sua volta quem se sinta confortável com o “status quo”. É importante para o povo ver mudança, pois essa é a natureza humana»
[2] Nos termos estritos das leis egípcias a possibilidade de Mohammed ElBaradei se candidatar em 2001 são remotas, pois estas obrigam à propositura por um dos partidos já existentes e isso implica que algum ou alguns dos seus líderes abdiquem dessa nomeação em favor do Nobel da Paz.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

A GRANDE AMEAÇA

Depois do final do mês passado ter sido anunciado que «EUA e Rússia chegam a acordo sobre pacto de redução nuclear» eis que pouco após o início dos trabalhos de uma cimeira sobre Segurança Nuclear, que decorre em Washington, se ficou a saber que «Países prometem bloquear acesso de “actores não-estatais” a material nuclear».

Parecendo seguir a linha de pensamento expressa pelo presidente norte-americano, segundo a qual a maior ameaça reside no facto de grupos terroristas poderem ter acesso a material nuclear, os líderes reunidos em Washington terão concordado na coordenação de acções tendentes a evitar que entidades não oficiais tenham acesso a material radioactivo.


Apostando numa estratégia que mais que garantir a sua própria segurança (e reduzir os custos com a manutenção de arsenais nucleares obsoletos) visa principalmente conter as intenções iranianas, o presidente Obama parece ter obtido algumas cedências do cada vez mais importante “amigo chinês”[1], tanto mais importantes quanto durante o próximo mês de Maio se deverão concluir as negociações para a substituição do Tratado START[2] e não param de surgir notícias na imprensa ocidental sobre a continuação do desenvolvimento do programa nuclear iraniano.

O busilis é que por muito bem intencionadas que sejam este tipo de iniciativas, estados há que permanecem à sua margem, como seja o Irão, a Coreia do Norte (excluídos da reunião pela própria administração norte-americana) e Israel (que persiste em negar o facto reconhecido de também dispor de armamento nuclear).

Não será pois de espantar que as dúvidas em torno de todas estas questões se continuem a avolumar e que para muitos toda esta movimentação possa não passar de uma mera encenação internacional montada para coincidir com a passagem do aniversário do discurso de Barack Obama em que este anunciou a intenção de contribuir para um mundo livre de armas nucleares.
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[1] Pelo menos é o que se pode inferir da notícia do DN que assegura que «China aberta a discutir reforço de sanções ao Irão».
[2] Sigla de Strategic Arms Reduction Treaty, designação do acordo assinado em 1991 entre americanos em russos para a limitação dos respectivos arsenais nucleares.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

NÃO PERTURBEM...

Quando a comunicação social resume intervenções como a de João Cravinho na Comissão Parlamentar da Corrupção, com a frase «corrupção política está à solta» que outra coisa podemos pensar senão nesta feliz imagem do caricaturista Pavel Constantin.

A Justiça dorme porque sucessivos anos de inacção e de bem urdidas teias legislativas pearam os que pontualmente ainda vão tentando fazer algo de construtivo; enquanto isso a formação das gerações mais jovens é cada vez menos orientada para a construção de sólidos valores morais e sociais e o grande meio de divulgação da actualidade (que apesar de tudo ainda é a televisão) limita-se a difundir os conteúdos de menor qualidade quando não de duvidosa qualidade, ampliando ainda mais aquele défice.

Enquanto os políticos (no poder ou que a ele almejam), por pura incompetência ou intencionalmente, evitam abordar a questão e para sua própria sobrevivência inventam temas fracturantes (como o casamento homossexual), imiscuem-se cada vez nas decisões de natureza pessoal e cultural dos cidadãos (proibições de fumar e outros normativos de natureza higieno-sanitária) ou empolam as ameaças securitárias, os cidadãos isolam-se cada vez mais das questões públicas e alheiam-se dos problemas que as televisões lhes não façam entrar pela sala.

Assim, se a Justiça dorme é apenas porque todos nós preferimos fingir não ver ou tomar soporíferos a enfrentar a dolorosa existência das insónias e dos pesadelos que nos rodeiam.