segunda-feira, 13 de fevereiro de 2006

AGOSTINHO DA SILVA

Comemora-se hoje o centenário do nascimento de um Homem.

Podia ser o de um qualquer homem, porque estou em crer que seria assim que o Prof. Agostinho da Silva gostaria de ser recordado.

Na modéstia poderosa das suas próprias palavras escreveu um dia, a propósito de um outro centenário, que este tipo de manifestações servem mais para que apareçam os vivos que para comemorar os mortos.

Figura da cultura luso-brasileira, Agostinho da Silva deixou a sua marca em áreas tão diversas como os estudos clássicos e a educação popular, foi tradutor e opositor ao regime do Estado Novo, o que o conduziria à prisão e auto-exílio no Brasil; fundou universidades, foi conselheiro de presidentes e governos; poliglota, viu publicadas obras nas áreas da pedagogia, ciência, literatura e filosofia.

Assumido espírito livre, inconformista e original, intuiu uma vocação para a cultura portuguesa, brasileira e lusófona traduzida no seu espírito universalista; contribuiu para a criação de uma comunidade armonizadora de diferenças (sejam elas de pendor nacional, cultural, político ou religioso), havendo quem o veja como o inspirador da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Pensador do terceiro milénio, impulsionador da sensibilidade ecológica e ecuménica, foi defensor um verdadeiro diálogo transversal nas vertentes cultural e religiosa visando a superação de preconceitos e contradições, normalmente originadoras de desarmonias e opressões fomentadoras de conflitos.

Não subscrevendo na íntegra muitas das suas asserções, nomeadamente as de índole mais metafísica, reconheço-lhe, obviamente, a superior capacidade de abalar estruturas e mentalidades, bem como uma disponibilidade e abertura de espírito rara num tempo em que tantos têm inabaláveis certezas.

Numa tentativa de resumir aqui o seu próprio pensamento, no que ele mais tem de libertário lembro esta sua frase:

"Do que você precisa, acima de tudo, é de se não lembrar do que eu lhe disse; nunca pense por mim, pense sempre por você; fique certo de que mais valem todos os erros se forem cometidos segundo o que pensou e decidiu do que todos os acertos, se eles forem meus, não seus. Se o criador o tivesse querido juntar a mim não teríamos talvez dois corpos ou duas cabeças também distintas. Os meus conselhos devem servir para que você se lhes oponha. É possível que depois da oposição venha a pensar o mesmo que eu; mas nessa altura já o pensamento lhe pertence. São meus discípulos, se alguns tenho, os que estão contra mim; porque esses guardaram no fundo da alma a força que verdadeiramente me anima e que mais desejaria transmitir-lhes: a de se não conformarem."

seria óptimo se todos tivéssemos um pouco de Agostinho da Silva.

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