Cumpriu-se ontem o primeiro aniversário da morte de um homem que, para muitos, significou a existência do próprio Estado da Palestina, para outros foi, sobretudo um problema.
Entre estes conta-se o actual líder judaico, Ariel Sharon, para quem Yasser Arafat era um entrave à paz no Médio Oriente.
Volvido um ano após a”remoção” do escolho o Médio Oriente encontra-se na mesma situação, ou ainda pior. Talvez para Sharon as coisas não estejam propriamente piores uma vez que continua a contar com o apoio do “amigo americano”; teve que fazer algumas concessões, das quais a principal poderá ter sido a retirada dos colonatos judaicos da Faixa de Gaza, mas “ganhou o silêncio cúmplice da informação norte-americana e europeia para continuar a política de asfixiamento lento de um pseudo-estado como o palestino.
Mahmud Abbas, o sucessor de Arafat na presidência da Autoridade Palestiniana, pode ter logrado manter conversas (conversações é uma coisa diferente) com George W Bush e com Ariel Sharon, mas em termos práticos nada mudou para as populações palestinianas que continuam a ser mantidas num estado de total dependência por Israel, que continua a determinar, em seu exclusivo benefício, o funcionamento das relações judaico-palestinianas.
Nesta linha de pensamento e acção, a administração americana continua a funcionar como guarda-costas e patrono de um estado que, nos tempos actuais, se dá ao luxo de manter em situação de prisão outro estado.
Fruto desta política de dois pesos e duas medidas a administração americana continua a enfrentar crescentes dificuldades no Médio Oriente e entre as comunidades islâmicas um pouco por todo o lado. Não é impunemente que os grupos islâmicos continuam a ver facilitada a sua tarefa de recrutamento de novos membros e, em especial de novos suicidas.
Para a mentalidade ocidental, que persiste em querer tratar este fenómeno como algo de irracional, é impensável a persistência destes grupos e a sua capacidade de resistência.
As invasões do Afeganistão e Iraque vieram juntar novos argumentos aos radicais islâmicos, contribuir para aumentar o sentimento de revolta árabe e engrossar as fileiras dos “jhiadistas”. A manutenção do ritmo e a dispersão dos próprios atentados suicidas já deveriam ter contribuído para que os “estrategas” americanos começassem a entender alguns dos erros que persistem em repetir.
Embora em paralelos totalmente distintos, trinta anos após o Vietname a administração americana, os especialistas da CIA e dos restantes serviços de informação ocidentais parecem ainda não ter aprendido a lição principal – é muito difícil derrotar aqueles que lutam pela sua terra – persistindo na aplicação de modelos de organização ocidentais em sociedades que não só os rejeitam (por serem estrangeiros) como os não entendem.
Neste plano inserem-se as patéticas iniciativas de implantação de uma democracia ocidental no Afeganistão (a situação que se vive neste país quase deixou de ser reportada nos jornais ocidentais, mas as últimas notícias que de lá têm chegado indiciam um recrudescimento das actividades dos opositores ao exército americano (maioritariamente da etnia pashtun, mas assimilando progressivamente um número crescente de guerrilheiros talibans), a divisão do território entre os senhores da guerra do tempo anterior ao regime taliban, o aumento da produção e exportação de heroína e a existência de um governo pró ocidental cada vez confinado a Cabul e aos seus arredores próximos.
Quanto ao Iraque, sucedem-se os apelos (hoje mesmo, Kofi Annan, o secretário geral da ONU, o fez numa visita a Bagdad) à conciliação entre os três grandes grupos étnico-religiosos (xiitas, sunitas e curdos) enquanto os mandatários americanos continuam a insistir na normalização da vida iraquiana. Apesar dos resultados do referendo, realizado no passado mês de Outubro, sobre a futura constituição e de se manter agendada a realização de próximas eleições gerais a oposição à presença estrangeira continua activa e sem dar sinais de abrandar na intensidade e persistência com que atinge o exército ocupante e os representantes de um governo que não reconhece.
Para, de forma muito rápida, fechar este círculo voltando a Arafat e à Palestina, recordo que um dos grandes argumentos dos líderes da Al-Qaeda para justificarem e difundirem os princípios da sua “jhiad” é a situação em que vive o povo palestiniano e o apoio das sucessivas administrações americanas a Israel, demonstradas à saciedade durante este primeiro ano da era pós Arafat.
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