Na sequência da notícia ontem divulgada pelo “Washington Post” que dava conta de que a administração americana utiliza uma rede de prisões clandestinas onde mantém, sob interrogatório da CIA, alguns presumíveis responsáveis da Al-Qaeda, surgiu hoje a notícia que a Comissão Europeia decidiu abrir um inquérito no sentido de apurar se tal se passa em algum dos seus países membros.
No corpo da notícia do “Washington Post” eram mencionados oito países (Tailândia, Afeganistão, Cuba e oito países da Europa de leste, não especificados por alegadas razões de segurança).
Perante o facto confirmado da notícia a administração americana, através do conselheiro para a segurança nacional, Stephen Hadley, apressou-se a informar a opinião pública mundial que «os EUA não torturam os seus presos e que as suas actividades são conduzidas dentro dos limites da lei e das obrigações internacionais».
A pressa com que têm ocorrido desmentidos de vários países (Rússia, Bulgária e Tailândia) apenas faz aumentar as certezas em torno do fundamental da notícia.
A maior potência mundial, aquela que tanto apregoa os princípios de liberdade e de defesa dos direitos humanos, não só mantém inúmeros detidos (presumivelmente ligados à Al-Qaeda) há cerca de 4 anos sem acusação ou julgamento, pratica torturas sobre esses detidos (não há forma de negar o sucedido em Abu Ghraib) e, sabemo-lo agora, recorre a locais secretos para manter uma rede de clandestina de prisões.
Uma vez mais se constata que aqueles que pretendem afirmar-se como “os polícias do mundo” e “defensores das liberdades” mais não são que um grupo de hipócritas, prosseguindo fins inconfessáveis, cujo comportamento não pode deixar de ser penalizado pela comunidade internacional.
Não é de agora que a administração americana vem praticando uma política de embuste, uma vez que já há uns anos quando um grupo de senadores pretendeu fazer votar uma lei que consagrasse a interdição explícita do recurso à tortura como método de obtenção de informações, aquela se opôs alegando que isso iria fragilizar a “guerra contra o terrorismo”. Desde a invasão do Afeganistão que a administração americana tem feito todos os esforços para subtrair os seus prisioneiros à observação da comunidade internacional (nomeadamente a Cruz Vermelha) alegando que não se tratam de prisioneiros de guerra.
As contradições americanas não se resumem ao tratamento dos prisioneiros, mas estendem-se à própria forma como se tem desenrolado a tal guerra (afinal parece que sempre existe) contra o terrorismo. Pretendendo pôr fim a actos perpetrados por grupos de fanáticos, os EUA já invadiram dois países (Afeganistão e Iraque onde substituíram regimes condenáveis por situações de franca anarquia) e parecem prontos a repetir a medida, desafiando não só as regras internacionais mas também a inteligência e o bom senso do mundo inteiro.
Na ausência de melhor argumento, parece continuar a prevalecer o argumento primário de «quem não está comigo está contra mim» e a maior da desfaçatez (cada nova “descoberta” é mais grave e perturbadora que a anterior) com que os responsáveis pelo governo insultam o mundo inteiro procurando «tapar o Sol com uma peneira».
Insistindo no princípio de combater o fogo com o fogo, persistindo em ignorar os avisos para uma inflexão na estratégia que conduza ao estabelecimento de pontes de diálogo, o que a administração americana tem conseguido é aumentar o clima de insegurança a nível mundial, enquanto persiste num discurso de fractura com os povos islâmicos.
Embora de registo distinto talvez qualquer dia surja uma interessante explicação para o recrudescimento de “guerras religiosas” (como a que aparentemente fundamentalistas americanos e árabes parecem pretender travar) e para fenómenos sócio-económicos como o que actualmente se vive em França (não esquecer que a maioria dos emigrantes africanos envolvidos nos distúrbios serão originários de países do Norte de Africa).
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