terça-feira, 24 de janeiro de 2006

BANCA E SEGUROS NA MIRA DA INSPECÇÃO DO TRABALHO

É com este título que o JORNAL DE NOTÍCIAS deu hoje conta do próximo alvo do organismo encarregue da fiscalização das condições de trabalho no nosso país.

Independentemente da louvável intenção de pretender repor um mínimo de justiça num sector de actividade onde toda a gente sabe que há vários anos campeia a maior das “desregulamentações” – o problema não se circunscreve ao elevado volume de horas de trabalho suplementar não remuneradas, estende-se à prática de criação de empresas “associadas” para a prestação de serviços para onde são “transferidos” os trabalhadores, a manutenção de inúmeros trabalhadores contratados a prazo e “felizes jovens licenciados” contemplados com “estágios remunerados” – e onda a grande massa de assalariados tem assistido à redução real dos seus salários fixos por contrapartida com a “atribuição” de subsídios e prémios indexados a conceitos pessoais e arbitrários de produtividade e mérito profissional.

De acordo com a notícia, que refere os cálculos realizados pelos sindicatos bancários, o valor das horas suplementares não remuneradas nos últimos dez anos ascende a cerca de 84 milhões de euros, correspondendo a uma média semanal de 14 horas de trabalho suplementar por trabalhador.

A iniciativa da IGT (Inspecção Geral do Trabalho) terá o mérito de reduzir o duplo prejuízo para a sociedade, que se traduz na redução de:

- o poder de compra dos trabalhadores que acarreta uma inevitável retracção no mercado de bens e serviços;

- das receitas fiscais do país, seja por via directa, em termos de IRS e contribuições para a Segurança Social, seja por via indirecta, na redução do IVA arrecadado fruto da retracção no mercado interno;

apenas lamento que aquela não constitua mais que uma manifestação da hipocrisia que campeia no aparelho de estado português.

Se o objectivo da actuação da IGT é a de fazer cumprir a legislação em vigor sobre o mercado de trabalho (nomeadamente as condições remuneratórias e de higiene e segurança) não se entende como é que apenas de tempos a tempos (a última iniciativa sobre este sector de actividade decorreu há mais de três anos) sejam efectuadas as respectivas inspecções e estas sejam previamente anunciadas nos órgãos de comunicação.

Não é seguramente para avisar as entidades patronais (estas sabem perfeitamente quando tal vai ocorrer), nem para mobilizar as esquipas de inspectores da IGT, pelo que fica por esclarecer a real finalidade desta informação, a menos que a notícia apenas sirva para daqui a uns dias o governo vir a anunciar que procedeu à normalização das condições de trabalho do sector financeiro, pelo que não haverá razões para em 2006 se vir a registar qualquer aumento salarial num grupo sócio-profissional que já beneficia de vastas “mordomias”. Entre as maiores se contam:

- as facilidades de crédito, com taxas indexadas à Euribor (como toda a gente) e agravadas pela obrigatoriedade de celebração de hipoteca e seguro de vida;

- o subsistema de apoio na saúde, para o qual os bancários sempre descontaram e que agora os banqueiros se preparam para integrar no regime geral;

- o sistema de reformas que deverá a breve prazo ser integrado na Segurança Social, como já aconteceu com o fundo de pensões da CGD;

conjunto que por si só, no entender das estruturas directivas das empresas financeiras, mais que justifica o não pagamento do trabalho suplementar bem como a persistente redução dos quadros dos trabalhadores - cada vez menos necessários face à introdução das modernas técnicas de automação do trabalho - estratégia cada vez mais utilizada tendo em vista o aumento dos lucros, como se pode comprovar da notícia, também hoje difundida pela AGÊNCIA FINANCEIRA, sobre os lucros superiores a 750 milhões de euros registados em 2005 pelo Millennium BCP e sobre os objectivos anunciados para os próximos anos, traduzidos no «crescimento de resultados por acção superior a 20% até 2008, com aumento dos proveitos da Banca de Retalho e redução contínua dos custos com pessoal».

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