Muitas são as organizações e as individualidades que ao longo do tempo se têm empenhado na resolução do problema da pobreza.
Tratando-se de algo que os teóricos e dirigentes políticos normalmente associam aos países ditos subdesenvolvidos, facto é que ao longo de todo o século XX as medidas propostas e/ou aplicadas ficaram longe de resolver o problema.
A realidade que actualmente conhecemos (onde além de imperar o individualismo começa a ganhar crescente importância as “realidades” e os padrões de consumo dos países ditos desenvolvidos) empurra-nos para um aumento de preocupações com a instabilidade que vive o pequeno mundo (empresa – família) que nos rodeia, transformando as questões de natureza social como algo de que “alguém cuidará”.
É neste princípio que se insere a lógica do estado providência que as correntes neo-liberais tanto criticam, desprezam e culpabilizam, classificando-o como sorvedouro de recursos.
Esta crítica é tanto mais utilizada quanto a situação da maioria dos países (seja qual for o seu nível de desenvolvimento) é a de desequilíbrio orçamental, seja ela originado na queda do produto seja no aumento do consumo público, fenómeno que afecta principalmente a chamada potência hegemónica. Graças à criação de um grande mercado mundial as empresas há muito que ultrapassaram conceitos e modelos gestionários de índole ou características nacionais. Há uns anos atrás começou a falar-se em multinacionais para designar estas empresas, depois passou a utilizar-se a designação de transnacionais e hoje talvez mereçam a designação de empresas globais.
Certo é que paralelamente ao crescimento destas empresas se assistiu ao empobrecimento de vastas áreas do planeta, podendo assim colocar-se a questão da existência de uma correlação entre as duas realidades. Esta é de simples e clara explicação desde que se entenda que o sistema de trocas mundiais assume as características de um jogo de soma nula, ou seja, o que uma parte ganha corresponde às perdas da outra.
Se a riqueza é um conceito finito, tal como as matérias-primas disponíveis no planeta, para que uma parte da população mundial acumule riquezas (os indicadores de variação do PIB de cada nação são apenas uma medida da respectiva riqueza), outra terá que abdicar do seu uso.
Os neo-liberais que defendem o primado do livre funcionamento do mercado como via para a resolução de todos os problemas não só estão a escamotear esta realidade como aquilo que esperam ver resolvido através do sacrossanto mercado são os seus problemas de enriquecimento, tudo tendo feito para que as regras pelas quais o tal mercado funciona sejam as que lhes garantam a maximização dos seus ganhos.
Voltando directamente à questão das medidas a aplicar para a erradicação da pobreza, o actual quadro político económico dominante não permitirá assegurar a aplicação de medidas efectivamente correctivas porque:
· o objectivo não é a aplicação de medidas de efectiva redistribuição da riqueza mas sim a garantia de que os actuais “senhores do mundo” se perpetuarão nessa posição;
· as organizações que com maior ou menor boa vontade, com maior ou menor capacidade de intervenção, vêm lutando contra este estado de coisas debatem-se com a falta de capacidades (financeiras e humanas) para uma efectiva inversão da tendência;
Por mais tétrico que pareça este cenário (que julgo bem real) creio que um caminho para a resolução deste problema existe no interior do próprio dogma do primado do mercado – quando não houver mais compradores (seja porque os existentes se encontram satisfeitos, seja porque a ela não têm acesso todos os outros milhares de milhões) não haverá mais mercado – restando-nos uma de duas atitudes: denunciarmos desde já o absurdo da situação ou esperarmos pela sua natural ocorrência.
2 comentários:
Descobri o seu blogue através do ÁguaLisa(4) que visito diariamente.
Passei 8 anos da minha vida a apoiar (efectivamente) quatro crianças de risco, os últimos 4 dos quais se passaram APÓS participação à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em Risco.
Fui transpondo o desalento e a indignação para o computador e em 2003 escrevi o "desabafo" que segue, ao qual vou acrescentando dúvidas, anseios, etc.
Muito gostaria de receber os seus comentários/explicações/observações.
Vou ter que dividir em 2 ou + comentários. Desculpe ser longo.
E VÃO 30 ANOS DE ABRIL !
O COMBATE À POBREZA E AO SUBDESENVOLVIMENTO É UM DEVER DE PATRIOTISMO
Em meu entender, para combater a pobreza e o subdesenvolvimento, é absolutamente imperioso:
1. Combater feroz e eficazmente a evasão fiscal e contributiva para investir parte significativa do produto dos impostos em medidas sociais verdadeiramente integradas.
2. Aumentar a rede de infantários, creches e do ensino pré-escolar (com mensalidades reduzidas ou com base nos rendimentos familiares, sendo gratuito para os utentes do Rendimento Social de Inserção).
3. Alargar a duração do ensino pré-escolar e do ensino básico até às 19/20horas (ex: de manhã ensino, à tarde acompanhamento dos trabalhos de casa e actividades lúdicas – sendo este horário facultativo).
Poderia fazer-se experiências piloto nas zonas com população mais desfavorecida – normalmente nas periferias das grandes cidades.
4. Prevenir eficazmente o abandono escolar, atribuindo às escolas meios de apoio e intervenção social para visitar e apoiar as famílias das crianças e jovens com indicadores de ausência à escola (é sabido que as “famílias” carenciadas e desestruturadas não vão às reuniões nem sequer respondem às cartas enviadas pela escola). O único “castigo” é que, 3 ou 4 anos depois, não recebem o abono dos filhos, que entretanto já estão na marginalidade. Assim se “perdem” jovens e se “ganham” delinquentes”.
5. Fazer uma ampla e eficaz intervenção social e urbanística nos bairros sociais (é perniciosa a desresponsabilização que deixa degradar habitações que todos pagamos – Saepe ignoscendo, des iniuriae locum (Publilius Syrus) “desculpando com frequência, darás lugar à injustiça”), nos quais devia inclusivamente existir pequenos centros de atendimento de emprego e formação profissional (ex: calceteiros, jardineiros, cantoneiros, etc.) – até de obtenção de documentos, nas juntas de freguesia, por exemplo.
6. Investir mais em habitação social (cumprindo a legislação que prevê alguma formação cívica e acompanhamento social em várias vertentes e não apenas entregar as habitações e despejar as pessoas lá para dentro) e em habitação a custos controlados de forma a que pessoas que têm baixo salário e de quem todos necessitamos, possam alugar casa (ex: onde pode habitar um agente da PSP ou um padeiro ou uma empregada de limpeza? – excepto se viverem em habitação social ou em casas abarracadas).
Claro que é mais fácil dizer, desdenhozamente, que os portugueses não querem certos trabalhos - de que lhes servem uns 300 ou 400 euros se forem jovens com filhos e tiverem que pagar rendas recentes, transportes, alimentação, creches etc. ?
7. Combate, eficaz e sem tréguas, nem, sobretudo, listas de espera, ao alcoolismo, donde decorre imensíssima pobreza e subdesenvolvimento.
8. Combate, eficaz e sem tréguas, nem, sobretudo, listas de espera, à toxico-dependência - não é seguramente o internamento de uma semana e uns comprimidos que o conseguem.
Será patriota quem assim não pensa e quem não cumpre os deveres de cidadania, incluindo o próprio Estado ?
Estarão conscientes de que são estas atitudes que colocam Portugal no 15º lugar e seguramente em breve no 25º lugar como país mais pobre e subdesenvolvido da Europa ?
Citando Inês Pedrosa, “da Nação Valente à Pátria Amada, são umas 10 horas de avião...”.
Com tantos recém licenciados no desemprego ou a trabalhar em lojas, etc.,(psicólogos, assistentes sociais, arquitectos, advogados) por que não recriar um serviço cívico de um ano, por exemplo, minimamente remunerado, e aproveitá-los para fazer o que sabem em prol de um combate nacional ao nosso subdesenvolvimento ?
Por que não criar estruturas mistas – autarquias, misericórdias, centros de emprego, por exemplo – e incentivar os cidadãos reformados ou em situação de pré-reforma, para aderir a esta causa ? Eu sei que algumas já existem, mas são muito insipientes dada a grande necessidade, e nada divulgadas na comunidade.
Maria Odete Teixeira Pinto
17/Outubro/2003
Dia Mundial de Luta contra a Pobreza
P.S. 1.: Um pai, pobre, porque é alcoólico e não quer trabalhar, o que é comum nos alcoólicos e nenhuma lei o obriga a trabalhar para assegurar o sustento dos filhos, desrespeitando os direitos da criança, é preso por tráfico de droga. Alguém (tribunal?, prisão ?) o interroga sobre a subsistência dos filhos que tinha à sua guarda e que, claro, abandonaram a escola porque os pais nem sequer sabem o que é negligência, nem regras ?
É óbvio que os filhos subsistem da venda de droga. Até serem apanhados. Claro que, vendo os “cromos” da bola e respectivos painéis publicitários, tudo com “marcas”, eles só querem vestir e calçar “marcas”. Quem paga?, Quem é o culpado?, Quem e Quantas são as vítimas? - as vítimas são eles próprios, sem sequer o imaginarem, e somos todos nós pais e avós dos que são seduzidos a consumir droga, e os cidadãos em geral que são assaltados e roubados.
P.S. 2.: Porque é que aos beneficiários do Rendimento Social de Inserção não é logo entregue um documento com os nomes e as verbas atribuídas, válido pelo mesmo tempo desse subsídio, evitando que pessoas sem meios tenham que se deslocar novamente à Segurança Social, enchendo uma vez mais os serviços, já de si saturados, para obter esse documento de forma a exibi-lo no centro de saúde, para ficarem isentos das taxas moderadoras?
P.S. 3 : Porque é que nunca foi regulamentada a Lei que criou o Rendimento Mínimo, na parte que se refere à reinserção social . Por que não se criam empregos sociais, como em Espanha, onde as pessoas que não têm qualificações suficientes, fazem trabalhos úteis à comunidade (limpeza de ruas, espaços verdes, etc.) e além disso descontam para as suas reformas.
Em Portugal parece ser mais fácil entregar o dinheiro (que todos pagamos) e criar, efectivamente, a perniciosa subsídio-dependência.
P.S. 4 : Como gostaria de saber que alguém no mundo lia, num qualquer jornal: "ministra de educação, em Portugal (europa), criou uma disciplina de educação pela arte, com ênfase especial na música. Desde a infância, os alunos aprendem a apreciar e sentir a beleza e a criatividade. Esta medida tem reduzido significantemente o insucesso e o abandono escolar. Também a violência e a delinquência juvenil desceram vertiginosamente”.
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