sexta-feira, 7 de outubro de 2005

REFLEXÃO SOBRE O QUE NOS ESPERA

Último dia de campanha, último dia para publicação de sondagens e início do período de reflexão eleitoral.

Podendo comentar-se os principais resultados apresentados (empates técnicos entre os candidatos do PS e PSD em autarquias onde sondagens anteriores davam confortáveis vantagens aos últimos), parece-me muito mais importante concentrar-me nas sondagens que prenunciam confortáveis vitórias, e até mesmo maiorias, para os principais «candidatos-bandidos».

É verdade, AVELINO FERREIRA TORRES, FÁTIMA FELGUEIRAS, VALENTIM LOUREIRO e ISALTINO MORAIS, estão aí para continuarem as práticas a que já nos habituaram.

Trata-se de um fenómeno que justificará trabalhos de análise social e política a merecer a melhor atenção dos especialistas. Nada me impede, mesmo como leigo na matéria, de ter uma opinião sobre o assunto, tanto mais que este é um problema que me parece suficientemente grave para merecer a atenção de todos quantos ainda não tenham desistido de querer um melhor futuro para este país.

Sendo certo que com personagens daquele calibre à frente dos destinos de autarquias estaremos a dar o pior dos sinais sobre o nosso futuro, parece-me que este fenómeno não é de agora e tão pouco tem merecido a devida atenção.

Eu que defendo uma lógica da participação mais directa dos cidadãos na condução dos destinos das suas vilas e cidades (essa é a principal função das autarquias), a qual deve ser alcançada através de um processo de eleição de personalidades locais (verdadeiramente empenhadas na defesa dos interesses locais em detrimento das suas filiações partidárias) deveria estar a aplaudir os prenúncios de vitória dos candidatos independentes já referidos.

Sucede porém que aquelas candidaturas não cumprem os quesitos para poderem ser entendidas como independentes ou locais, uma vez que resultaram do simples facto daqueles candidatos não terem colhido o apoio das forças políticas que anteriormente os apoiaram, não se tratando, por isso, de verdadeiros movimentos de génese local mas tão somente de manobras visando o branqueamento dos crimes de que são acusados ou condenados. Este processo traduz-se no mais despudorado aproveitamento dos termos da lei, seja no sentido da fuga à justiça seja na tentativa da sua subversão.

Haverá quem restrinja a responsabilidade da eleição dos «candidatos-bandidos» ao conjunto dos eleitores que neles irão votar, esquecendo a responsabilidade dos partidos políticos que ao embarcarem numa campanha eleitoral orientada exclusivamente para a conquista de votos em vez do debate dos problemas locais (estamos a encerrar uma campanha autárquica e não uma legislativa) facilitaram, e de que maneira, a tarefa daqueles. Ao longo do período de campanha nunca se ouviram vozes firmemente críticas, nem dos candidatos partidários nem dos responsáveis pelos principais partidos, contra esta aberração – A PARTICIPAÇÃO DE CIDADÃO CONDENADOS, INDICIADOS E ACUSADOS DE CRIMES DE GESTÃO DANOSA DA COISA PÚBLICA.

Hoje, dia em que a campanha se encontra em vias de terminar e parece garantida a eleição de «candidatos-bandidos» começo a pensar, já, como é que tudo isto pode ter sucedido?
Seria fácil buscar a resposta numa legislação talvez demasiado permissiva, num sistema judicial lento e se calhar de eficácia duvidosa; por mim prefiro olhar um pouco à minha volta para ver se encontro resposta mais adequada.

A característica comum que ressalta de todos os «candidatos-bandidos», para além dos actos de que são acusados, é o seu populismo. Sendo uma forma fácil e simples de alcançar o eleitorado, e em especial um como o português que apresenta altos níveis de iliteracia, tem sido utilizado por todos os que almejando algum poder o não conseguem alcançar num processo de confronto aberto de ideias e estratégias.

Mas o aparecimento de múltiplos políticos populistas não sendo uma ocorrência espúria é um sinal do estado da nossa sociedade em geral. As teses populistas não surgem apenas porque há quem não disponha de melhores meios (conhecimentos, cultura, experiência, etc.) para disputar os combates políticos em que se envolve, nem porque exista um grande número de receptores disponíveis para os ouvirem, mas sim porque grupos crescentes da nossa sociedade têm vindo a ser formados num contexto de despreocupação e facilitismo e orientados na sua vida profissional por regras injustas e manipuladoras.

Para entender isto basta estar atento aos comentários que diariamente ouvimos sobre as condições de trabalho nas empresas nacionais, sobre a imposição de horários cada vez mais alargados, sobre as orientações emanadas ao sabor do momento ou de disposição ocasional. Estes factos, graves, poderiam constituir o dia a dia das micro e das pequenas empresas cuja gestão é, normalmente, assegurada por um “patrão”, com baixos níveis de formação, mas o pior é que o mesmo acontece nas empresas de maior dimensão, onde os níveis de formação das estruturas directivas de topo e intermédias é francamente superior. Grave é que nas nossas empresas imperem modelos de gestão em tudo semelhantes “ao quero, posso e mando” admissível num patrão semi-analfabeto dos primórdios da industrialização mas inexplicável numa época em que se pretendem atingir elevados níveis tecnológicos.

Esta dualidade de critérios – despreocupação e facilitismo no processo formativo e exigência de rigor e produtividade desproporcionada aos meios de trabalho e processos de decisão aleatórios e prepotentes – que grassa quer no sector público quer no privado, estará não só na génese da nossa famosa baixa produtividade, mas também constitui terreno fértil para a multiplicação de arrivistas e populistas. Aqueles mesmos que agora nos surgiram como «candidatos-bandidos», mas também todos os outros que, aos mais diversos níveis da nossa sociedade, estão a facilitar a sua existência.

Perante a evidência dos erros cometidos resta-nos pensar na forma de os corrigirmos, sendo que uma das primeiras deverá passar pela defesa da aplicação de princípios éticos à vida económica, social e política no nosso país. Esta é uma tarefa que todos teremos de abraçar sob pena de assistirmos à degradação da nossa sociedade.

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