A poesia de Luís Carlos Patraquim é como um mergulho num processo de transculturação (não confundir com aculturação, que significa apenas a aquisição de uma cultura distinta em que a original se perde ou fica desenraizada), percorrendo as diferentes fases do processo transitivo de uma cultura para outra, com a consequente criação de novos fenómenos culturais.
Quem assim define a obra de Patraquim é Adelto Gonçalves - autor brasileiro de vários trabalhos sobre Literatura Portuguesa - definição que estende ao trabalho de outros poetas moçambicanos da mesma geração, nomeadamente Eduardo White e Nelson Saúte, que avançaram pelos trilhos abertos por Luandino Vieira e José Craveirinha, a maioria sob uma certa influência dos brasileiros Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira e João Cabral de Melo Neto.
Na poesia de Patraquim, pode-se surpreender a presença de vocábulos procedentes não só de línguas africanas, como o macua e o ronga, mas também do inglês e do africaner, como se vê na antologia «O osso côncavo e outros poemas».
Por ter passado para a poesia esse processo transculturador vivido em África, Patraquim tornou-se, desde que apareceu no cenário cultural lusófono no começo da década de 1980, uma das vozes mais inovadoras da poesia moçambicana, afastando-se do tom triunfalista de carácter eminentemente ideológico que marcou a produção poética da fase pós-independência.
Como escreveu um dia Ana Mafalda Leite (co-autora com Patraquim e Roberto Chichorro de «Mariscando luas») tratou-se uma “escolha porventura difícil, subvertendo a monção favorável do slogan, da palavra de ordem e, diga-se também, o vazio editorial que, na altura, o primeiro livro do poeta veio preencher”; a escrita de Patraquim “é alimentada por uma força pictórica e simbólica e por uma rítmica que faz dos textos espaços de mediação reflexiva e onírica, em que o sentido se vislumbra e anuncia, refeito num movimento de recordações de leitura”.
Poeta fino, às vezes hierático, Patraquim é um consumado artista do verso que sabe como pagar o seu mais íntimo tributo, evocando aqui e ali Whitman, Cesário Verde, Pessoa, Camões, Drummond, sem esquecer os luso-africanos que vieram antes dele como Rui Knopfli, David Mestre, José Craveirinha e outros.
1 comentário:
Belíssimo trabalho. Linkei
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