segunda-feira, 3 de abril de 2006

MODERNIZAÇÃO DE MÉTODOS E REVOLUÇÃO DE MENTALIDADES

Nos últimos dias temos sido “assaltados” por inúmeras notícias, comentários e críticas às recentemente anunciadas medidas governamentais para a modernização da administração pública. SIMPLEX e PRACE passaram a fazer parte do vocabulário diário de muitos de nós, bem como a esperança, para alguns, de que se venha a registar uma efectiva simplificação no relacionamento dos cidadãos com o aparelho público.

Independentemente da discussão de pronto iniciada em torno do real significado daqueles programas (mera jogada propagandística ou efectiva opção política) e da melhor opção de abordagem (pacote programático ou medidas pontuais) haverá que reconhecer ao governo de José Sócrates a vontade de querer alterar o “status quo” em que um sector tão pesado quanto a administração pública tem vivido.

Mesmo que boa parte das medidas apresentadas não passe de mera aplicação de conceitos de racionalização de serviços e de utilização adequada dos meios tecnológicos já disponíveis, do seu sucesso dependerão, seguramente, outras iniciativas ou programas de racionalização e desburocratização. Sucede porém que este tipo de iniciativas só registará um efectivo sucesso caso seja cumprida uma regra fundamental à boa gestão que qualquer processo de mudança – é preciso que cada trabalhador envolvido no processo, ou pelo menos um vasto número deles, seja ele próprio um agente da mudança.

E aqui residirá a minha maior dúvida em torno deste processo. Conhecendo-se a reputação e a qualidade de grande número dos elementos que integram as estruturas de direcção e chefia da administração pública, fácil se torna imaginar a forte probabilidade de todo este esforço acabar por se revelar infrutífero. Na ausência de um efectivo programa de mudança de mentalidades no interior daquelas estruturas (desconheço se o mesmo está ou não a ser implementado, mas não me espantará que o não esteja) iremos continuar a debatermo-nos com os habituais “bloqueios” e uma resistência à mudança. Este fenómeno não é novo e será tanto mais intenso e prejudicial quanto os quadros de pessoal das estruturas a modernizar sejam preenchidos por funcionários anquilosados e que durante a sua longa vida activa tenham conhecido poucos ou nenhuns processos de formação orientados para a necessidade de construção de novos esquemas de trabalho e de relacionamento interdepartamentais e pessoais.

Ainda ligada com esta questão existe uma outra, também de natureza humana, que é a da preparação, ou da sua ausência, das estruturas de chefia para a aplicação de um processo que se necessita dinâmico e participativo (vez alguma uma mudança funcionou por imposição) e que em muitos casos significará a necessidade de total reaprendizagem de técnicas e funções.

A adicionar a estas questões existe ainda a relacionada com os equipamentos e sistemas informáticos actualmente instalados e o tipo de utilização que têm conhecido e o que deverão passar a conhecer. Além das reconhecidas limitações de muitos funcionários na utilização daqueles meios (é normal vermos nas repartições publicas utilizar um computador com um processador de texto como se de uma máquina de escrever se tratasse), já começaram a surgir algumas notícias sobre a impraticabilidade de comunicação entre sistemas informáticos instalados em diferentes serviços (na fase de instalação de cada um deles ninguém revelou a mínima preocupação por esta aberração), facto cuja correcção irá custar largos milhares de euros ao erário público ou, em alternativa, ser adiada para uma época de maior abundância de fundos.

Numa palavra, não me espantará que estes programas não venham a registar o sucesso esperado (e necessário), não tanto por defeitos de elaboração mas fundamentalmente por bloqueios e resistências que grande número de funcionários não devidamente motivados irão praticar e por limitações de natureza técnica cuja correcção nos irá sair caro.

Resta-nos esperar que alguns dos responsáveis por estes programas venham a revelar surpreendentes capacidades decisórias, e poder para as aplicar, que logre inverter as muitas barreiras (humanas e técnicas) que infelizmente aguardarão este processo.

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