domingo, 23 de abril de 2006

O MÉDIO-ORIENTE E OS LOBBIES JUCAICOS

A escolha de uma nova personalidade – Jawad Al Maliki – para tentar formar um governo no Iraque poderá constituir uma boa notícia para os que têm aguardado impacientemente a resolução da crise governativa naquele país. Acontece é que existem dois grupos com interesses antagónicos naquela solução:
  1. os que desejam a formação de um governo com o objectivo de resolver o antagonismo entre as facções xiitas, sunitas e curda, com vista a melhorar a situação num país que continua ocupado por tropas estrangeiras e dividido quanto à definição do objectivo prioritário;
  2. os que desejam que do apaziguamento, ou da acalmia interna, advenham as condições para passar ao próximo objectivo.

Falando de forma clara, os primeiros serão basicamente os iraquianos que pretendem recuperar a sua soberania, mesmo na ausência de uma clara definição de como poderá funcionar profundamente dividido como se encontra, enquanto os segundos são os que há muito prosseguem a uma estratégia orientada para a redefinição do mapa geopolíticos do Médio-Oriente. Este grupo, a crer em recentes trabalhos desenvolvidos em universidades americanas e noutras estruturas internacionais que se dedicam ao estudo e análise dos fenómenos políticos e económicos globais, é fundamentalmente constituído pela classe governante israelita, a comunidade judaica e um conjunto de personalidades que gravitam nas suas órbitas.

Dois investigadores de duas insuspeitas universidades americanas – John Mearsheimer, da Universidade de Chicago e Stephen Walt, de Harvard – apresentaram em Março de 2006 um trabalho de investigação intitulado «THE ISRAEL LOBBY AND U. S. FOREIGN POLICY», no qual concluem que remonta aos tempos da presidência de Bush pai a intenção de “orientar” a política e a estratégia americano no sentido de “redesenhar” o mapa do Médio-Oriente em benefício exclusivo de Israel. Apresentada assim, de forma directa, esta tese parece demasiado impossível para ser verosímil; porém, se nos lembrarmos que na sequência do 11 de Setembro de 2001 a administração de George W Bush se apressou a decretar a invasão do Afeganistão e antes mesmo de poder reclamar o controle efectivo daquele território (e ainda menos o desmantelamento da Al-Qaeda) avançou com um assalto ao Iraque (sob pretexto da existência de armas de destruição em massa, sem aval da ONU e da comunidade internacional), contando apenas com o apoio do Reino Unido e que actualmente a mesma administração americana se está a envolver numa espiral de conflituosidade com o Irão, começa a tornar-se mais do que óbvia a questão: a quem serve a generalização do conflito no Médio-Oriente?

Aos EUA e à UE?

O que podem esperar estes países senão aquilo que estão já a obter; o aumento da instabilidade (nomeadamente a nível interno a que é provocada por comunidades de emigrantes que se identificam religiosa ou culturalmente com o Médio-Oriente, ou por grupos de opositores à escalada militar), o agravamento do risco de segurança dos seus interesses económicos na região do Médio-Oriente e o aumento dos custos da matéria-prima energética de que todos dependem totalmente, a ponto de pôr em causa o crescimento das suas próprias economias.

Aos países produtores de petróleo do continente africano e sul-americano, que o máximo que conseguirão será ver aumentados os seus proveitos alguns cêntimos por barril de crude extraído?

Às companhias petrolíferas, que sabem que os ganhos extraordinários que estão a obter se podem virar contra si próprias (o aumento exagerado no preço dos combustíveis fósseis vai tornar cada vez mais rentável o desenvolvimento de outras energias alternativas) se a tendência altista dos preços se mantiver?

Excluídos estes interessados que outros ficam?

A Rússia, que na qualidade de fornecedor de gás natural poderá ver, também ela, incrementados os seus ganhos com o aumento da procura e o desvio da atenção ocidental das suas repúblicas satélites para outra região, ao custo de verem aumentada a instabilidade na zona do Cáucaso? A China, cada vez mais dependente das importações de petróleo de manter o crescimento da sua economia?

E agora, o que resta senão Israel e a sua ancestral política expansionista?

Quem poderá negar que a deposição de Saddam Hussein constituiu uma apreciável vantagem para o regime judaico, ampliada ainda pela situação de instabilidade instalada, e que convulsões em países como o Irão e o Iraque não podem senão agradar a quem de forma mais ou menos velada ainda não terá perdido as esperanças de poder vir a anexar mais territórios.

A eventual fragmentação do Iraque, solução que na própria Casa Branca já há quem a defenda, poderá ser a cereja no bolo da destituição de Saddam Hussein. Esta hipótese é de momento tão realista quanto qualquer outra, mesmo que depois se possa colocar a questão da constituição de um estado curdo (algo que sempre aterrorizou a nação árabe) e cuja oposição feroz da Turquia garantirá a continuidade do processo de desestabilização na região.

O trabalho dos dois investigadores americanos não constitui novidade na vertente que explora o interesse judaico na região (muitos outros investigadores e autores de diferentes origens têm abordado essa questão, referindo-se mesmo em algumas circunstâncias situações particularmente estranhas ocorridas no recém ocupado Iraque que mais não têm servido que para alimentar a tenção entre as facções no terreno, como foi o caso da atentado no Mausoléu do Imã Ali em Samarra), mas apresenta especial importância ao expor as ligações e o modus operandi dos lobbies judaicos nos EUA. Fazendo fé naquele trabalho, foi a aplicação de uma estratégia muito bem concertada entre os referidos lobbies e os governos israelitas que conduziu à situação que vivemos, nomeadamente quando a própria Mossad (serviços secretos israelitas) terá contribuído para cimentar a ideia da existência das armas de destruição em massa iraquianas junto da CIA, táctica que deverá estar igualmente a ser utilizada na questão iraniana.

Analisando friamente o que temos assistido nestes primeiros meses de 2006 resume-se a um avolumar de “casos” que pretendem justificar o desferir de um próximo golpe sobre o Irão, isto depois de durante 2005 se ter assistido à constante circulação de notícias em torno da Síria e do envolvimento dos seus serviços secretos e do presidente Bashar Al Assad no assassínio do ex-primeiro-ministro libanês Rafic Hariri. Tal como no cenário anterior, toda a agitação se centra nos países que rodeiam Israel e que ao longo dos anos se têm revelado pouco cooperantes com a política expansionista judaica.

Este tipo de análise, tal como a executada por Mearsheimer e Walt, é o que os grupos judaicos apelidam imediatamente de anti-semitismo (para estes, tudo o que não signifique um apoio incondicional às suas teses, que há muito deixaram de ser a defesa e o direito à existência do estado judaico, para passarem a ser a aplicação dos princípios da existência da Grande Israel - ler texto complementar aqui - é de imediato apelidado como tal). Por incrível que possa parecer as sociedades ocidentais mantém como que um sentimento colectivo de culpa relativamente ao período negro que os judeus viveram sob o regime nacional-socialista alemão e as organizações judaicas têm aproveitado ao máximo tal vantagem, quando não é o próprio estado de Israel a reclamar um tratamento preferencial com base nesse episódio.

Não se tratando de negar o holocausto judaico, perece-me de ter em linha de conta outros factos (muito mais actuais) para apreciar e formar opinião sobre o que acontece, ou está em vias de acontecer no Médio-Oriente. O que hoje se passa na Palestina é uma situação em que o Estado de Israel assume o papel de ocupante de um território sobre o qual não tem qualquer jurisdição (ocupação que já foi alvo de mais que uma condenação pela ONU), onde pratica de forma sistemática violações dos direitos humanos, usando de meios militares postos à sua disposição por uma potência imperial que continua a executar de forma obediente as políticas que melhor sirvam os interesses daquele estado, contra um povo cujo direito à autodeterminação foi reconhecido pela ONU, mas que a comunidade internacional, sob a liderança americana, persiste em lhe negar na prática. O que aconteceu no Iraque foi a ocupação de um país sob o argumento de que dispunha de armas de destruição em massa, que nunca ninguém logrou encontrar. O que pode em breve acontecer no Irão é o uso abusivo da força no pressuposto de que aquele estado poderá vir a obter armamento nuclear.

Em poucas palavras, de moto próprio ou por influência judaica, os americanos têm vindo a envolver o planeta num clima crescente de violência e numa espiral intrusiva de que dificilmente alguém poderá augurar algo de bom.

A solução, como a apontam Mearsheimer e Walt, é ampliar o debate em torno da influência dos lobbies judaicos na política externa americana e os seus efeitos na região, esperando que este acabe por expor os limites e as contradições entre interesses (judaico e americano) muitas vezes longe de coincidentes. Por mim, acho que este tipo de debate deve ser levado ainda um pouco mais longe e questionar o direito de quem quer que seja (americanos, judeus ou outros) definirem as formas de organização social, política e económica que deverão vigorar fora das fronteiras dos seus próprios estados.

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