segunda-feira, 24 de novembro de 2008

OS FACILITADORES

As grandes questões domésticas, que nos últimos tempos têm feito manchete na nossa impressa, são, infelizmente, demasiadamente reveladores do actual estado da vida pública (política e económica) e tão pouco mobilizadoras quanto deprimentes.

Não fosse a crise internacional e talvez ainda hoje não tivessem vindo a lume a maior parte das negociatas em que se envolveram os administradores de uma instituição financeira e, desdita nossa... má fortuna!, talvez não tivesse havido lugar a uma nacionalização que em última instância significará um encargo adicional para todos os contribuintes portugueses (no caso mais específico os trabalhadores por conta de outrem, porque na generalidade as empresas e os empresários não contribuem por não terem lucros), mas o que não é menos curioso é que a mesmíssima crise já não serviu de pretexto para nacionalizar uma empresa que seis meses após a retoma da actividade descobriu que afinal não é viável[1], nem para evitar a insolvência da maior livraria nacional[2] menos de um ano após a abertura.

Mas, como assegura a sabedoria popular, há por vezes males que vêem por bem! E no caso do BPN talvez isto se tenha verificado a propósito das declarações prestadas por Dias Loureiro (um ex-administrador da Sociedade Lusa de Negócios, a “holding” que detinha a totalidade do capital social do BPN, e ex-ministro nos dois últimos governos de Cavaco Silva, nos quais ocupou as pastas dos Assuntos Parlamentares e da Administração Interna, ex-secretário-geral do PSD) quando no écran da televisão procurou explicar o seu não envolvimento na gestão do BPN.

Esta alegação foi parcialmente refutada pelo próprio Dias Loureiro quando afirmou ter mediado contactos com a CAIXA GALICIA e um fundo soberano do Médio Oriente com vista a participação destes no capital da SLN, algo que apenas faria sentido no quadro da escassez de capital com que já então de debateria o BPN.

Mas a verdadeira dimensão da importância da sua entrada para a administração da SLN, deu-a Dias Loureiro quando assegurou que usara os “amigos” que conhecia em Marrocos para facilitar a participação da SLN no processo de privatizações que decorria naquele país. Numa palavra, o que Oliveira e Costa e os seus amigos da SLN pretendiam de Dias Loureiro eram os dotes são os de “facilitador” que este obtivera na sua passagem pelos corredores do poder.

Dito isto, se o que Dias Loureiro procurava era dissipar dúvidas sobre o seu papel no BPN, conseguiu-o plenamente.

Depois do que disse não deixou qualquer dúvida sobre o seu papel na SLN, nem sobre a forma como os grandes empresários conduzem os seus negócios. Mas, ninguém lhe terá recordado que retornado ao activo da política – Dias Loureiro é um dos conselheiros de Estado nomeado pelo presidente Cavaco Silva – a exposição daquelas suas actividades apenas poderão fragilizar quem nela tenha confiado?

Esta indispensável capacidade crítica deveria também ser usada pelos políticos que nos últimos anos se têm visto envolvidos em múltiplos “casos” pontificados pela mais elementar ausência de ética. Desde as relações entre presidentes de autoridades reguladoras que foram administradores de bancos e intermediaram relações comerciais entre ministros que foram administradores de outros bancos e esses mesmos bancos[3], até ao absurdo número de ex-ministros e secretários de estado que terminadas as funções públicas pululam pelas administrações de bancos e grandes empresas ou consórcios concorrentes a obras públicas ou que renegoceiam, representando interesses privados, vultuosos contratos de adjudicação que outorgaram quando no exercício de cargos públicos, de tudo isto se tem visto nos últimos tempos.

Esta absoluta ausência de escrúpulos não pode deixar de ter reflexos negativos na forma como os cidadãos encaram os políticos e exemplos pouco abonatórios podem ser encontrados entre os militantes de qualquer dos partidos que já passaram pelo poder, a ponto de se poder considerar “vox populis” que a real motivação dos candidatos a lugares públicos é a obtenção de futuras e vultuosas prebendas depois do abandono do cargo. É que se em Portugal o “lobbying” não constitui actividade reconhecida, nem por isso deixa de ser a que beneficia de melhor remuneração.
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[1] Vejam-se as notícias do DIÁRIO DE NOTÍCIAS e do PUBLICO que dão conta da reabertura, com pompa, circunstância e a presença de José Sócrates, das Minas de Aljustrel e da interrupção da produção devido à alegada queda nas cotações internacionais do zinco.
[2] Como se pode constatar da leitura desta notícia de O JORNAL ECONÓMICO.
[3] Ver a notícia do PUBLICO – Manuel Sebastião intermediou negócio entre Pinho e o BES.

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