Porque como diz o velho ditado popular, «cada cabeça, cada sentença», ninguém se deve sentir obrigado a aceitar como bons os balanços que outros fazem e para facilitar esse mesmo trabalho de leitura crítica, proponho-me organizar o meu da mesma forma como costumo classificar os “posts” que aqui tenho deixado.
LOCAL
A este nível, parece-me merecer destaque a razoável regularidade da programação do Cine-Teatro local. Mesmo considerando que muitos géneros de artes de palco ainda não marcaram presença nele, nem por isso deixa de ser de destacar a regularidade e até a qualidade de alguns dos espectáculos que por lá passaram. Pena mesmo é que a produção local continue a sentir-se muito pouco e que o público raramente tenha correspondido com uma presença significativa.
Entre as notas positivas, uma referência também para os debates de Opinião Pública promovidos pelo “O ALMEIRINENSE”, aos quais se associou a “RCA-Ribatejo” (estação local de rádio).
Estas iniciativas, como os espectáculos exibidos no Cine-Teatro, sofreram talvez da crónica falta de divulgação. Quando disporá a nossa cidade de um sistema de painéis informativos estrategicamente distribuídos para que o desconhecimento possa continuar a servir como desculpa para a falta de público e de participantes?
Já que referi algo que correu mal durante o ano, não posso deixar de referir o grande caso local de 2006: a renuncia ao exercício do cargo de vice-presidente da Câmara pelo Dr. Francisco Maurício. Tal como na oportunidade o fiz, quero deixar aqui bem claro que pior que esta decisão foi a de o Presidente da Câmara não ter até esta data esclarecido de forma cabal as razões que determinaram aquele acto, tanto mais que a ausência de explicação afecta principalmente a credibilidade de quem o substituiu e de quem continua à frente dos destinos da Autarquia.
NACIONAL
Se o ano acabou mal a nível local, já a nível nacional não se pode dizer que tenha começado melhor. Pior que o resultado das presidenciais foi o espectáculo que nos ofereceu o PS, Mário Soares e Manuel Alegre. Independentemente das razões que possam ter estado na origem da estratégia montada pelo PS para as presidenciais (quase um ano volvido continuo convicto que Sócrates queria o resultado que se verificou), foi obviamente triste assistir-se ao desempenho de Mário Soares.
Tristeza por tristeza, será a oportunidade de referir também a substituição de Freitas do Amaral à frente da equipa das Necessidades (vulgo Ministério dos Negócios Estrangeiros). Airosa a desculpa apresentada, tornou-se rapidamente óbvia que a mudança (de um incómodo ministro que insistia em pensar pela sua própria cabeça e que nunca escondeu a oposição pessoal à política externa norte-americana, passámos para um bem comportado apreciador de “cowboyadas”) ocorrera por razões que a razão desconhece… Sendo óbvio o beneficiado, ficámos todos a perder (ou pelo menos a nossa dignidade).
No resto, o ano nacional quase se pode considerar banal de tão habituados que estamos às notícias dos novos milhares de hectares de floresta ardida em cada ano, aos aumentos de bens e serviços e à persistente degradação do poder de compra dos trabalhadores nacionais. Tudo isto foi sendo confirmado pelos organismos oficiais de estatística (nacionais e comunitários), cada vez mais sentido no bolso dos portugueses, mas também progressivamente exteriorizado nos comentários do dia-a-dia e nas sondagens que os órgãos de comunicação social divulgam regularmente. Procurando contrariar esta tendência (ou estado de ânimo) o governo de José Sócrates foi-se desmultiplicando em medidas de combate ao desemprego e ao insucesso escolar, de promoção de novos investimentos (a propósito, salvo uma ou outra rápida referência pouco se falou nos polémicos projectos da OTA e do TGV), de racionalização e contenção de custos (quem já esqueceu o encerramento de escolas e maternidades ou pouco por todo o país), de combate à burocracia e de saneamento da segurança social.
Em resumo, a acreditarmos nos nossos governantes todos estes sacrifícios nos hão-de assegurar uma vida melhor… mais tarde. Pois é, o grave é que talvez sejamos poucos a viver até esse momento… Se não, vejamos: opções como a do aumento da idade da reforma como método para assegurar o saneamento financeiro da segurança social, além de injustas e desmotivadoras para aqueles a quem já se perfilava o fim da vida activa são igualmente penalizadoras para os jovens que aguardam uma oportunidade para a entrada no mercado de trabalho e não solucionam a verdadeira origem do deficit – enquanto as pensões de reforma continuarem a ser suportadas pelos descontos dos trabalhadores no activo e não a serem custeadas pela adequada capitalização dos descontos que cada um realizou ao longo da sua vida activa, todos teremos que estar preparados para trabalharmos até morrermos.
Mas nem tudo foi negativo. Algumas medidas, caso das introduzidas no sistema de ensino e no sistema de financiamento regional, poderão realmente frutificar se da parte dos intervenientes se registar uma melhor disposição para a sua aplicação. O problema está na enorme descrença que se tem vindo a instalar – descrença nos governantes, nos técnicos, nas pessoas… – e que não creio que possa ser ultrapassada por acontecimentos pontuais (caso do Mundial de Futebol ou da recente nomeação de Maria José Morgado para a investigação do caso “Apito Dourado”), enquanto a maioria daqueles que têm vindo a capitalizar vantagens e benesses nestas “terras do faz de conta” continuarem a ocupar lugares de privilégio e a partir dos quais entravarão todo e qualquer processo que os possa prejudicar.
INTERNACIONAL
Se a nível doméstico as coisas não correram bem, no plano internacional não pararam de piorar. Assistiu-se durante mais ano ao aumento da instabilidade no Médio Oriente e até já a situação no Afeganistão começa a ser referida nos mesmos moldes.
Os atentados, as chacinas e outras formas de violência fazem cada vez mais parte integrante do nosso dia a dia e como se não bastassem os conflitos no Iraque, no Afeganistão e na Somália, herdados de 2005, ainda assistimos a mais uma invasão israelita do Líbano.
Porém, as coisas pareciam estar a compor-se quando no início do ano se realizaram eleições gerais na Palestina. Para surpresa de muitos o vencedor foi o grupo islâmico do Hamas e de pronto israelitas e americanos, secundados pelos europeus, decidiram suspender o apoio financeiro à Autoridade Palestiniana a pretexto de não financiarem o terrorismo. De uma situação de difícil sobrevivência a população palestiniana passou para outra ainda pior. De hipocrisia em hipocrisia, de retaliação em retaliação, assistiu-se à invasão da Faixa de Gaza e pouco depois à do Líbano.
Sem ter alcançado a queda do governo do Hamas nem o desarmamento do Hezbollah libanês, o exército israelita retirou do sul daquele país, não sem antes ter destruído as respectivas infraestruturas e se ver substituído no terreno por tropas da ONU. Com a instabilidade criada é agora o governo libanês de Fouad Siniora que os próprios libaneses colocam em questão.
De calamidade em calamidade e perante um cenário de generalização de conflitos, o ano que agora acaba deverá ficar marcado pela entrada da Coreia do Norte para o clube dos países com armamento nuclear. O mesmo poderá estar em vias de acontecer com o Irão e, para cúmulo, até já Israel parece ter abandonado a política de negar a existência do seu arsenal nuclear.
Se apesar de tudo isto George W Bush insistir em dizer que o mundo está mais seguro depois do derrube do ditador Saddam Hussein, não se riam, ele está a falar a sério. Tão a sério que um dos últimos acontecimentos do ano foi o precisamente o precipitado enforcamento de Saddam.
Perante tudo isto de pouco valerá a derrota dos Republicanos nas eleições em que o Partido Democrata conquistou a maioria no Senado e na Câmara dos Representantes. A única nota positiva de tudo isto poderá ser o facto de para este resultado ter pesado a opinião americana que circulando pela Internet vem questionando de forma cada vez mais aberta e consistente a política de Bush e factos até agora dados como inquestionáveis como os acontecimentos de 11 de Setembro de 2001.
Se é verdade que se sente de forma crescente o peso e a importância da Internet como veículo de debate e divulgação de opiniões, nem por isso os poderes instituídos (nacionais e internacionais) parecem ter entendido esta nova realidade que a própria revista “TIME” reconheceu ao eleger como personalidade do ano os utilizadores da Internet.
Outra nota, final, da diferença. A escolha para o Nobel da Paz de Mohammad Yunus e o Grammen Bank, instituição bancária que ele fundou e que é responsável pela criação do conceito do microcrédito, premiando a luta contra a pobreza.
Se ao menos em 2007 pudéssemos ver ampliado o poder das ideias contra as ideias do poder, talvez o balanço que então faça seja menos negativo.
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