Parece que finalmente temos um governo da República que se dispõem a pôr termo ao desbarate que tem sido o processo de financiamento da região Autónoma da Madeira.
Isto é o mínimo que se pode dizer da recente decisão do governo de José Sócrates de “congelar” as transferências para aquela Região Autónoma devido ao Governo Regional ter excedido os limites de financiamento autorizados para 2005.
Aparte a polémica que de pronto estalou (Alberto João Jardim vociferou contra tudo e contra todos, como é seu hábito), ninguém de boa fé poderá deixar de compreender e apoiar a decisão de um Governo que, para alcançar o equilíbrio do deficit público, até agora apenas tem exigido constantes e continuados sacrifícios aos contribuintes que pagam impostos.
De vários quadrantes nacionais se fizeram ouvir comentários (uns mais convictos que outros) de um modo geral favoráveis à decisão e mesmo muitos dos que fizeram ouvir alguma contestação (excepto os políticos madeirenses) sempre foram admitindo que a situação financeira que vive a Região da Madeira se encontra longe da desejada.
Aliás, esta região autónoma tem-se caracterizado por regularmente “andar nas bocas do mundo” e raramente pelas melhores razões. Quando não se tratam dos dislates (verbais e comportamentais) do presidente do seu governo, trata-se de atropelos e comportamentos antidemocráticos da maioria política que governa a ilha há quase trinta anos, ou de notícias sobre ligações demasiado estreitas entre poderes públicos e interesses económicos. Certo é que de notícia em notícia o inefável Alberto João Jardim continua a comportar-se naquela Região como seu “rei e senhor” e as poucas e débeis tentativas até agora feitas para combater esta realidade sempre têm esbarrado numa teia de interesses a que não são alheios o PSD (partido a que pertence Alberto João Jardim), o PS (que nunca mostrou capacidade e vontade efectiva para contrariar o “vice-rei” insular, quer a nível nacional quer regional) e os grupos económicos com interesses instalados no arquipélago.
Apesar da enormidade que representa a dívida do Governo Regional da Madeira, qualquer coisa como 1.500 milhões de euros até ao final do ano[1], tudo até agora tem decorrido de forma absolutamente normal, como se daquela Região não chegassem senão ecos do progresso e da melhoria das condições de vida das populações, nomeadamente a nível da educação e da saúde, em vez das notícias e imagens televisivas das inaugurações de mais estradas, pontes, túneis (sempre com a presença de Alberto João Jardim) que com o andar dos tempos ultrapassarão mesmo a área do próprio território.
A este respeito escrevia há uns dias Vicente Jorge Silva num artigo de opinião «A imoderação absolutamente descontrolada e a arbitrariedade dos gastos públicos na Madeira, que conduziram a uma espiral de endividamento sem paralelo no País, estão intimamente associadas à promiscuidade total entre poder político e poder económico, sustentando algumas das aberrações mais escandalosas e impunes da prática da corrupção em Portugal.
Uma investigação apurada desse verdadeiro "polvo" que suga os dinheiros públicos e os redistribui através de toda uma nomenclatura político-económica (em que se multiplicam os casos de fortunas pessoais feitas da noite para o dia) traria certamente uma espectacular "visibilidade de resultados", como afirmou pretender o Presidente da República na tomada de posse do novo PGR. E permitiria também perceber porque é que a rede de cumplicidades e compadrios instalada na Madeira reduziu a um estado de quase impotência a actuação do Ministério Público, como se a famosa "autonomia regional" tornasse perfeitamente legal o que é de uma gritante ilegalidade».
Para aqueles que noutras ocasiões leram o que escrevi sobre alguns acontecimentos que iam chegando da Madeira (INDEPENDÊNCIA JÁ! e A REPÚBLICA NA TERRA DAS BANANAS) ou sobre comentários e posições de analistas nacionais (SERÁ JARDIM APENAS UM “SEMIDEMOCRATA”?), não estranharão que subscreva, e aplauda, a decisão do ministro Teixeira dos Santos, mesmo compreendendo que esta trará alguns prejuízos à região em geral e em especial às populações mais carenciadas.
Porém, não creiam que augure grande sucesso a esta iniciativa governamental.
Para descrédito de todos nós (os que nos batemos pela indispensabilidade de critérios éticos e de rigor na gestão da coisa pública) o que vai ocorrer rapidamente será um novo compromisso, há semelhança do que foi realizado nos tempos do Eng.º Guterres, que permitirá ultrapassar esta limitação financeira agora existente e proporcionará novo período de “vacas gordas” para todos aqueles que têm vivido à sombra e a expensas do perdulário Alberto João Jardim.
Será um óptimo sinal se estiver enganado, mas nada me leva a formular uma conclusão diferente, tanto mais que em matérias de “manobrismos” e “compadrios” pouco distingo o governo de José Sócrates dos de Cavaco Silva. Tal como este aprovou a construção de uma ponte sobre o rio Tejo entre Alcochete e Lisboa contra a opinião dos técnicos que defendiam a opção Barreiro-Lisboa, diz-se por pressão de altos dignitários do PSD que seriam proprietários de terrenos naquela região da Margem Sul, também agora Sócrates insiste na construção de um novo aeroporto na Ota contra a opinião dos especialistas que defendem a opção por Rio Frio, por pressão de altos dignitários do PS que terão adquirido terrenos na zona Oeste.
Como que a prefigurar este cenário de futuro “arranjinho”, já esta semana Luís Delgado (o indefectível defensor dos “Santanas Lopes” da política nacional) veio na sua crónica semanal no DIÁRIO DE NOTÍCIAS apontar uma via de solução, aconselhando Alberto João Jardim a recorrer ao mesmo estratagema que Bill Clinton usou nos EUA quando o Congresso Americano se recusou a aprovar o seu orçamento. Naquela oportunidade o governo deixou de assegurar os pagamentos paralisando a generalidade dos serviços federais; perante a explicação da administração e a indignação popular o Congresso seria obrigado a recuar e a aprovar o orçamento.
Ideia brilhante a deste comentador de política “à pressão”, não fora o caso de aqui acontecer precisamente o contrário; quem não consegue explicar a situação é quem não quer deixar de gastar sem controlo e quem beneficia de um claro apoio popular é quem quer terminar (pelo menos aparentemente) com essa situação.
É óbvio que esta pequena nuance escapou por completo à arguta análise do comentador, mas o aviso ficou bem claro para quem o queira entender.
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[1] Estimativa de José Manuel Rodrigues, líder do CDS-PP/Madeira (in http://www.partido-popular.pt/noticia.asp?id=1046)
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