quinta-feira, 29 de julho de 2010

A BOMBA AFEGÃ

Será mesmo correcto designar assim a divulgação no sítio Wikileaks de mais de 90 mil documentos sobre a guerra no Afeganistão, classificados como secretos, e que tem agitado o mundo dos meios de informação?


Mesmo se paralelamente, três publicações (a americana The New York Times, a inglesa The Guardian e a alemã Der Spiegel) receberam para divulgação o mesmo tipo de documentação e com títulos mais ou menos bombásticos têm vindo a revelar parte significativa da informação que consiste principalmente em relatórios das actividades de campo das tropas ocidentais os quais, basicamente, podem ser agrupados em três grandes linhas:

os que demonstram a ascensão dos talibans nos últimos seis anos;

• os que provam a ocultação de informação que vai desde as baixas civis não reportadas, as baixas provocadas por “fogo amigo”, até ao facto dos talibans disporem de mísseis terra-ar com sensores de calor;

• os que revelam o envolvimento estrangeiros, nomeadamente o do ISI (os serviços secretos paquistaneses), no apoio aos talibans.


A reacção da Casa Branca não se fez esperar e no mesmo dia em que a informação chegou à imprensa, logo a BBC divulgou a resposta oficial e o mal-estar da administração Obama pela “ameaça à segurança nacional” que representavam as notícias.

Sobre o conteúdo e em especial a gravidade da constatação da ocultação dos factos descritos, nenhuma referência, excepto a ressalva de que o período coberto pela informação agora divulgada era anterior à implementação da actual estratégia da Casa Branca, como se esta tivesse introduzido abissais diferenças relativamente à da administração Bush.

Igualmente digno de nota é o alarido e aparente estupefacção com que foi recebida a notícia do envolvimento do ISI no apoio aos talibans, apenas entendível para quem nos últimos anos tenha esquecido (ou tivesse a intenção de levar os outros a esquecer) a evolução dos acontecimentos na região. Desde os tempos da incursão do exército vermelho no território afegão (a qual, ao contrário da actual, sempre foi tratada pela imprensa ocidental como uma ocupação militar) que os EUA e os seus aliados estimularam e financiaram o Paquistão e os seus serviços secretos a fomentar a oposição àquela acção militar, pelo que não será de estranhar a existência de laços antigos entre operacionais dos dois campos, tanto mais que entre eles existe o laço comum do islamismo. Em finais de 2008 aludi no post «PORQUE FIZERAM CHORAR A ÍNDIA»à questão das ligações entre o ISI e os sectores mais religiosos mais radicais e já um ano antes, quando a situação política interna no Paquistão se degradava num braço-de-ferro entre a ditadura militar de Pervez Musharraf e o arremedo de democracia personificado por Benazir Bhutto, recordei a histórica ligação entre o ISI e a Al-Qaeda, no post «O DILEMA PAQUISTANÊS».

De uma forma ou de outra a administração Obama não sai propriamente reforçada de mais esta trapalhada, tanto mais que muita da informação agora publicada reforça claramente a ideia deixada pelo famigerado general McChrystal de que a ocupação do Afeganistão caminha a passos largos para um fiasco e volta a trazer à memória da América o inevitável paralelismo com o Vietname.


A fuga de informação agora registada tem ainda o inegável mérito de recordar que os tempos podem não ser muito diferentes da época da Guerra do Vietname e este continua, para o melhor e o pior, a constituir um fantasma que a sociedade americana nunca logrou exorcizar e ainda menos agora quando se discutem os milhões de dólares gastos nas guerras, no apoio ao “aliado” Paquistão , ou se anuncia, como fez hoje o EXPRESSO, que «Pentágono confirma que Bradley Manning é suspeito de fuga de documentos».

Já detido e acusado de ter difundido um vídeo que mostra um helicóptero “Apache” a disparar sobre civis afegãos (imagens colhidas em 2007), o jovem militar (22 anos), analista de informação, vê agora juntar-se mais esta acusação, a qual é confirmada na página de apoio que já tem na NET – HELP BRADLEY MANNING.

Á boa maneira americana, o “circo” parece preparado para enfrentar qualquer situação.

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NOTA: Por razões que ignoro os links, que habitualmente indicam as páginas consultadas, e as notas de rodapé foram eliminadasdurante o processo de edição.

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