O poderoso consórcio do Dubai – DUBAI WORLD, que congrega um universo de empresas orientadas para quatro grandes áreas de actividade: Transportes e Logística, Construção Naval, Desenvolvimento Urbano e Investimento e Serviços Financeiros, com especial destaque para a NAKHEEL, empresa do ramo imobiliário responsável pelo extravagantes projectos «The Palm» e «The World»[1], e a DP WORLD, empresa do ramo portuário que depois de adquirir a britânica P&O passou a assegurar a gestão dos principais portos norte-americanos[2] – acaba de solicitar uma moratória de seis meses para o pagamento dos juros dos empréstimos obrigacionistas, no montante de 4 mil milhões de dólares, por si titulados e pela NAKHEEL (ramo imobiliário) e que se vencem no próximo mês de Dezembro.
Depois dos impensáveis naufrágios dos grandes bancos americanos (LEHMAN BROTHER, BEAR STERNS, INDYMAC) e depois que começaram a ser divulgadas animadoras notícias de recuperação das principais economias, eis que surge duma das regiões tida como mais forte, um evidente sinal de que algo continua podre no reino da alta finança.
E o mais preocupante pode nem ser o anúncio das dificuldades que o consórcio atravessa, pois alguns sinais já tinham começado a passar para a imprensa quando foi anunciada a suspensão dos projectos «The Palm» e «Burj Dubai» (que era previsto transformar-se na construção mais alta do Mundo, pois os seus 800 metros quase duplicariam os 509 metros da Taipei 101)...
...devido a dificuldades de financiamento, mas sim o facto da moratória agora proposta significar que nem as finanças do Emirato do Dubai, nem as do ainda mais poderoso Emirato do Abu Dhabi, apresentam condições para resolver a situação.
A ironia de tudo isto (se é que se pode falar de ironia neste meio) é que o presidente do grupo agora à beira da falência, Ahmed bin Sulayem, não revelou o mínimo pejo ou contenção quando há pouco mais de um ano (em Março de 2008) ameaçou os dirigentes europeus de retirar todos os investimentos do conglomerado na Europa caso a UE aprovasse medidas para tentar controlar a actividade dos chamados Fundos Soberanos[3].
O mínimo que seria de esperar é que os mesmos dirigentes lhe respondessem agora em idênticos termos e que entendessem de uma vez por todas a urgência na aprovação de regras de apertado controlo sobre a actividade e a transferência de capitais, tanto mais que a situação de incumprimento não afectará apenas o conglomerado DUBAI WORLD, mas também o próprio Dubai, o vizinho Abu Dhabi e o conjunto dos Emiratos Árabes Unidos. Prova disto mesmo é o teor desta notícia do THE ECONOMIST que dá conta da pronta subida do preço (cerca de 130 pb) dos CDS[4] sobre a dívida do Dubai e da imediata descida da notação de “rating” atribuída à dívida do país.
No mínimo, as aparentes dificuldades dos Emiratos Árabes Unidos, de que o Dubai e o Abu Dhabi são dois dos sete membros e os mais importantes, pode ser entendido como um claro sinal das grandes dificuldades que as economias mundiais ainda atravessam e da crescente insustentabilidade de um modelo de desenvolvimento económico assente na internacionalização dos capitais e num sistema financeiro suportado numa única moeda – o dólar americano – cuja economia se apresenta cada vez mais fraca e dependente para sustentar o respectivo valor.
Depois da quase falência da Islândia, pequeno território insular cuja modernização económica foi realizada à custa de um processo de enorme exposição financeira, das dificuldades que ainda atravessam as economias britânica e irlandesa, fortemente abaladas pelo rebentamento da bolha do imobiliário, eis que agora surge mais esta notícia e relativamente a uma economia também ela baseada na terciarização e na especulação imobiliária o que constitui uma boa evidência de que a fase mais profunda da crise ainda não chegou.
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[1] O projecto em causa consiste na construção de um conjunto de ilhas artificiais que vistas do ar têm a configuração uma palmeira ou do mapa mundo; este e outros projectos igualmente megalómanos podem ser consultados no endereço da empresa promotora.
[2] Sobre a polémica em torno da tomada de controlo dos portos norte-americanos pela DP WORLD, ver o “post” «RAZÕES QUE A RAZÃO DESCONHECE?»
[3] Fundo Soberano é um fundo de investimento cujo capital é detido por um estado soberano, normalmente em resultado de balanças de pagamentos superhavitárias.
[4] A sigla CDS ou o termo “credit default swap” designa um contrato de “swap” no qual o vendedor assegura ao comprador o pagamento de um instrumento de crédito (normalmente uma obrigação); por haver lugar ao pagamento de um prémio que assegura o bom pagamento da dívida este tipo de contrato é muitas vezes comparado a um seguro.
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