quarta-feira, 1 de julho de 2009

PROBLEMAS DE QUE SE DEVE FALAR... MAS DE FORMA TRANSPARENTE

Fora eu egocêntrico vaidoso e diria, depois de ler a última crónica que César das Neves publicou no DN, sob o título «PROBLEMAS DE QUE NÃO SE FALA», que o insigne professor é um leitor atento dos escritos que aqui vou deixando. É que logo após a publicação no passado domingo do “post” «PORTUGAL MANIFESTA-SE» veio aquele dar à estampa a sua visão dos problemas que assolam o país e tardam a encontrar solução.

Sem pretender iniciar qualquer tipo de polémica – todos sabem que em termos gerais me situo quase nos antípodas do pensamento de César das Neves – sempre aqui deixo dois ou três comentários ao que este ecreveu que me parecem pertinentes.
Concordando com a importância do factor populacional, embora não o considere a primeira prioridade, e com o absurdo da inexistência de uma política estrutrurada de apoio à natalidade não posso de modo algum deixar passar em claro a clara manipulação que o autor procura exercer sobre os seus leitores quando mistura a inexistência de políticas consistentes e sustentadas de apoio à família e à fertilidade com a legalização do interrupção voluntária da gravidez, com a aplicação de legislação menos penalizadora dos divórcios, ou com o que define como a promoção da homossexualidade.

Como tantos outros correlegionários absolutamente convictos da superioridade dos seus valores, César das Neves comete o inaceitável erro argumentativo de assimilar a despenalização com a promoção ou o incentivo. Não prender nem condenar mulheres que em situação extrema recorrem à interrupção de uma gravidez não desejada não é, em caso algum, o mesmo que incentivá-las a essa prática; pôr cobro ao estigma e drama social que durante a vigência do mui católico e apostólico Estado Novo vingou sobre os casais de facto separados – este sim promovendo a mentira e a farsa de casamentos sem existência real – e permitir que aquele contrato seja dissolvido quase da mesma forma como é celebrado (pela vontade das partes), não é o mesmo que promover o divórcio e impedir as pessoas de se casarem; acabar com a discrimação com que as sociedades tradicionais têm tratado a homossexualidade não é, de modo nenhum, o mesmo que promovê-la como valor basilar. Mas, com a convicção natural daqueles que raramnte têm dúvidas e nunca se enganam, César das Neves pretende misturar tudo como se os seus leitores não passassem ainda dos analfabetos humildes que a sua Igreja pretende venham ter direito ao reino dos céus... depois de mortos!

O segundo grande problema que elegeu é o do envelhecimento da população. Directamente derivado do primeiro, mas também em resultado da melhoria das condições de vida e de cuidados de saúde das populações, César das Neves aborda-o até numa perspectiva social e deixa-nos a curiosa reflexão sobre o medonho desperdício que a rodeia, quando afirma que «Portugal não pode tratar uma percentagem crescente da sua população, a mais experiente e sabedora, como se estivesse "fora de prazo"» e tem razão, mas... quem é que lançou a revolucionária ideia de que um trabalhador a partir dos 40/50 anos já não apresenta grande utilidade e que a sua produtividade decrescente deixou de apresentar intresse para o seu empregador? Quem, defendeu a ideia das vantagens de custo e de docilidade na contratação dos mais jovens; quem, senão a escola ideológica em que se insere o próprio autor?

Mas a cereja no bolo da argumentação do Prof. César das Neves é a atitude; a atitude com que no país se encaram os problemas relativos ao progresso, nomeadamente o facto dos portugueses terem adoptado «...os níveis de consumo e exigência europeus sem aceitarem os níveis de produtividade e as exigências europeias»; daí a justificar o endividamento nacional é um pequeno passo que o autor dá sem o mínimo rebuço nem hesitação. Se isto até pode ser entendível como consequência natural da sua linha de pensamento, já a afirmação seguinte, a de que «[a] consequência é a crise que nos assola há 15 anos, precisamente desde que mudámos a atitude», é particularmente grave pois além de marcada pelas suas opções ideológicas constitui um julgamento em causa própria pois a atitude que refere ter sido mudada foi a do “raramente tenho dúvidas e nunca me engano” adoptada por um governo originado numa maioria parlamentar unipartidári e do qual o Prof foi um dos mais insignes conselheiros.

Para terminar o Prof assegura que «[t]emos um Estado que ignora a linha estratégica do País e os grandes problemas nacionais. Não sabe o que quer no futuro nem como lá se chega, mas ocupa-se com embalagens de iogurtes, fumo nos edifícios, cadeirinhas nos automóveis e educação sexual. Os governantes tratam do que nos compete, sem fazerem o que lhes compete. Vivemos num equilibrismo mediático e em escaramuças pontuais, esquecendo os desígnios básicos» o que sendo uma indesmentível realidade não deixa de constituir mais uma forma de distorcer uma realidade muito mais grave: tudo isto remonta há várias décadas, incluindo o período de tempo em que também o autor foi co-responsável pelo governo do país. Isto dito bem pode agora afirmar que com este estado de coisas «...o debate eleitoral só pode passar ao lado dos grandes problemas nacionais» pois na realidade, com a preocupação que revela de branquear o passado pouco ou nada contribui para o dinamizar.

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