domingo, 28 de junho de 2009

PORTUGAL MANIFESTA-SE

Ciente da nova moda que de repente parece ter atingido os políticos nacionais talvez se pudese dizer que o país se manifesta, caso a natureza e o alcance dos manifestos contra e a favor das obras públicas constituíssem mais que meros jogos de política entre aqueles que têm dirigido (mal) o nosso país.

Pelo menos é o que tudo aparenta, pois não só os principais signatários são antigos membros do governo, como as suas declarações foram de pronto utilizadas primeiro pela oposição e depois pelo partido no governo para fundamentar a continuidade de um debate – melhor seria dizer de um simulacro de debate – sobre as virtualidades e os inconvenientes dos grandes investimentos que o governo de José Sócrates vem defendendo e quer ver realizados.

Dito assim e nãofosse a gravidade do assunto, até poderia parecer que tudo se resumiria a mais uma espúria querela partidária semelhante à que temos assistido entre PS e PSD para a eleição do novo Provedor da Justiça, mas o que está verdadeiramente em debate são questões de transcendente importância para os cidadãos e para os eleitores deste país; mas contrariamente ao que muitas vezes se afirma ou se dá a entender, a importância das questões em causa não é de agora nem estas devem ser encaradas enquanto meros sorvedores de fundos públicos e formas de oneração das gerações futuras, nem como medidas de simples combate ao desemprego. Decidir sobre a construção de grandes infraestruturas não pode ser encarado como uma birra – quem já esqueceu a afirmação do ministro Mário Lino de nunca o Novo Aeroporto de Lisboa seria construído na Margem Sul do Tejo – ou como uma majestática obra de regime e para que a posteridade recorde o nome do “fazedor”.

Analisadas as opiniões de uns e de outros o que é que o cidadão comum retira delas?

Pouco ou nada dos títulos que de quando em vez enchem os jornais nacionais ou os comentários e contra-comentários dos habituais analistas da triste realidade política nacional, para não falar nos comentários dos políticos do governo ou da oposição, que na prática contribuem para aumentar a confusão e raramente o esclarecimento seja do que for; será então que estamos condenados a viver nestas águas turvas para as quais temos deixado arrastar a política nacional? Não haverá outra forma de abordar estes problemas?

Sendo certo que há décadas continua por realizar o debate fundamental em qualquer país – quais os objectivos que julgamos viáveis e pretendemos alcançar – nem por isso estarão esgotadas todas as oportunidades. Não que o NAL, o TGV ou mais uns quilómetros de auto-estrada representem a salvação miraculosa (salvo para os promotores e para os interesses que defendem) para a economia nacional, mas talvez toda esta movimentação possa servir para fomentar o debate que verdadeiramente urge fazer e possibilite a muitos daqueles que até agora não têm sido ouvidos a oportunidade de também eles contribuirem para o debate e para encontrar uma solução.

Tal como se defendia no Programa das Conferências Democráticas1, no final do século XIX, é indispensável estudar as condições da transformação política e económica do país, trabalho que continua por realizar, muito por responsabilidade da pleiade de arrivistas e incompetentes que tem enxameado os governos mais recentes deste país.

O caminho não será fácil nem isento de escolhos e empecilhos, pois aqueles que tão mal nos têm governado não abandonarão as posições a que se acantonaram sem resistência (nem os grandes interesses económicos que os têm suportado deixarão de tudo fazer para manter tudo como está), nem a sua mera substituição constituirá panaceia universal para o problema.

O que parece cabalmente demonstrado é que não podemos é esperar de políticos incompetentes a tomada de decisões acertadas sobre os nosso futuro nem sobre o daqueles que nos seguirão.

Questões verdadeiramente estruturantes como sejam as da educação, da saúde, da segurança social e do modelo de desenvolvimento económico não podem continuar abandonadas ao livre arbítrio de governantes como os que temos conhecido. A definição de princípios básicos em matérias tão estruturantes não pode continuar a ser objecto de sucessivas mudanças, alterações e modificações ao sabor da vontade do grupo no governo e ainda menos objecto de constantes “ajustamentos” consoante as “ideias” dos governantes do momento.

Quando parece crescente o sentimento de desalento das populações e de descrétido em quem nos tem governado, importa que os cidadãos ganhem cosiência que o verdadeiro poder de decisão lhes poderá cabera eles se o quiserem (e souberem) usar.

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1Também conhecidas pelas Conferências do Casino foram uma série de conferências realizadas na primavera de 1871 em Lisboa, impulsionadas pelo poeta Antero de Quental, que insuflou no chamado Grupo do Cenáculo (que passaria mais tarde a ser conhecido como Geração de 70) o entusiasmo para as realizar. Por decisão do governo monárquico as Conferências foram proibidas, tendo-se realizado apenas cinco das dez previstas; ainda assim o bastante para ter assistido ao discurso de Antero de Quental que mais tarde seria publicado sob o título CAUSAS DA DECADÊNCIA DOS POVOS PENINSULARES.

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