quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

EXARCHIA, A REVOLTA DOS JOVENS

As notícias originadas na Grécia trouxeram para as páginas dos jornais memórias da agitação que varreu os arredores de Paris há pouco mais de um ano, tanto mais que aparentemente até o rastilho terá sido idêntico – a morte dum jovem em consequência de acção policial.

Aos primeiros protestos rapidamente se sucederam outras reacções mais violentas e destas à generalização dos confrontos com a polícia e às acções de pura vandalização de carros e imóveis nos principais centros urbanos do país foi um passo. Quase tudo poderia ser idêntico ao que sucedeu em França – a frustações de uma juventude grega (como a da generalidade dos outros países) desempregada e com reduzida formação – não fora a coincidência dos tumultos terem começado no mesmo bairro de Exarchia[1] que em 1973, com o mesmo tipo de acções, despoletou o fim da ditadura naquele país.

Não bastando este paralelismo, a Grécia sente os efeitos de uma crise económica (a mesma que nos atinge a todos) e os de um governo demasiado fragilizado por sucessivos casos de corrupção (nada de especialmente inédito para nós) e ao qual a oposição recusou qualquer tipo de solidariedade.

O local donde irradiou a agitação é uma espécie de “Quartier Latin” de Atenas, facto que poderá explicar a rápida propagação da contestação de uma juventude desiludida pelo actual clima económico mundial e que acusa o governo conservador, liderado por Costas Karamanlis, pela ausência de políticas que enfrentem os efeitos da crise económica e de uso excessivo de força.
Às reivindicações das camadas mais jovens veio juntar-se a convocação de uma greve geral que está a paralisar o país e a aumentar grandemente a pressão sobre o governo.

Ao quarto de dia de confrontos entre os jovens e a polícia a própria envida especial do LE MONDE[2] confirma o crescente apoio da população a um movimento juvenil seguramente muito heterogéneo, mas não desprovido de lucidez[3] e de todo o desencanto daqueles que vêm muito pouco futuro no futuro... a ponto de não estabelecer grande diferença entre o partido conservador no governo (o liberal-conservador Nova Democracia) e a principal força da oposição, o PASOK (socialista).

Mais do que nos graves acontecimentos na Grécia, parece-me de meditar nas enormes semelhanças entre o que motivou a revolta da juventude grega e as condições e as perspectivas que em Portugal os governos do PS e do PSD têm oferecido aos mais jovens... e prepararmo-nos para a forte possibilidade de vermos tudo isto repetido, com os nossos filhos como actores centrais.
_________
[1] É o nome de um dos bairros de Atenas no qual se situam algumas das suas mais importantes escolas (o que lhe dá um carácter predominantemente estudantil) e o abrigo de muitos movimentos anarquistas. As suas origens remontam aos finais do século XIX e o facto de nele se ter originado, em 1973, o movimento de contestação que culminou com a abolição da ditadura militar em 1974, granjeou-lhe um estatuto especial na vida social e política grega, tornando-o local de eleição para artistas e intelectuais.
[2] Ver aqui a notícia na íntegra.
[3] A título de exemplo veja-se esta entrevista a um jovem que o jornal LE MATIN chamou Dimostenis.

Sem comentários: