A data a que o Estado Novo atribui um sentido nacionalista e propagandístico (e que muitos ainda hoje vêem como o dia de condecorações) nem sequer foi por ele criada, pois as suas origens remontam à implantação da República, período em que começou por ser um feriado municipal.
Usado pela I República como evocação de uma das primeiras manifestações republicanas durante a monarquia (as jornadas camonianas levadas a cabo em 1880), acabou adulterado quando o Estado Novo o transformou no dia das condecorações, estigma que ainda não perdeu completamente.
Sem querer entrar em polémicas, nem discutir aqui a validade e mérito individuais, lá vamos este ano voltar a assistir a uma parada de condecorações (a lista das quase quatro dezenas de agraciados pode ser consultada aqui) e a continuar a sentir aquele incómodo interior que estas encenações contêm.
Mesmo tendo perdido o epíteto de “dia da raça”, para passar a ser o dia de Portugal, de Camões e das Comunidades e que alguns esforços continuem a ser feitos no sentido de manter da identidade cultural nacional, nos tempos de uma globalização imposta e em que as sociedade comercial e militarmente mais avançadas impõem pela força (dos argumentos ou das armas quando os primeiros fracassam), é preciso muito mais que apelar aos feitos gloriosos dos antepassados e à “boa vontade” das gerações actuais (ver o discurso de Cavaco Silva ontem proferido na Câmara Municipal de Setúbal).
Aos nossos governantes (actuais e futuros) tem que se exigir mais que a construção de megalómanas obras de regime, o equilíbrio das contas públicas e das balanças de transacções; tem que se exigir que os programas de formação escolar e profissional alcancem mais que os mínimos (dos mínimos) que actualmente são exigidos aos jovens. A formação dos cidadãos deste país não pode continuar a esquecer a cidadania e a cultura (entendendo-se estas no seu sentido lato e de importante meio de coesão social) e ainda menos persistir na mera formação de mão-de-obra subserviente.
O despertar dos jovens para a exploração das suas capacidades, intelectuais, físicas e artísticas, parece-me mais do que uma tarefa importante, uma função vital para o desenvolvimento e a manutenção da nossa identidade cultural de que o Estado se tem alegremente divorciado.
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