terça-feira, 19 de setembro de 2006

QUE FUTURO PARA O MOVIMENTO NÃO-ALINHADO?

Terminou no passado fim-de-semana em Havana mais uma Cimeira dos Países Não-Alinhados.
Mais importantes que os títulos dos jornais que noticiaram o evento, com quase todos a referirem o clima de crítica generalizada à política norte-americana, parecem-me ser os seguintes factos:

· a realização da própria cimeira e o nível de participação (mais de uma centena de estados se fizeram representar, metade dos quais pelos próprios chefes de estado ou de governo);
· a ausência de acordo formal sobre o modelo de reorganização da ONU e sobre quem apoiar entre os países não-alinhados para integrar um novo Conselho de Segurança alargado.

Para melhor se entenderem estas questões, recorde-se que o movimento dos não-alinhados nasceu durante a Guerra Fria, em resultado da acção de estadistas como o indiano Nehru, o egípcio Nasser, o indonésio Sukarno e o jugoslavo Tito, tendo como objectivo criar um caminho independente no campo das relações internacionais que permitisse aos seus membros não se envolverem no confronto entre as duas grandes potências. Contando com a participação de quase todos os estados africanos, grande número dos sul americanos, do médio-oriente e do sul da Ásia e do Sudoeste Asiático (que no conjunto representam 2/3 dos países membros da ONU e mais de 50% da população mundial), batem-se após a queda do Muro de Berlim e o fim do confronto Leste-Oeste pelo reconhecimento do seu “peso” no seio da ONU e contra a política unilateralista que os EUA têm vindo a aplicar.

Maioritariamente constituída por países em vias de desenvolvimento (eufemismo para designar as economias mais pobres do planeta) o Movimento dos Não-Alinhados vem-se debatendo com crescentes dificuldades para encontrar o ponto de equilíbrio entre os seus membros mais combativos (os que rejeitam com maior frontalidade a situação de dominância económica americana) e os que por terem optado por soluções político-económicas de cariz mais liberal encontram crescentes dificuldades em afrontar directamente a potência dominante. Prova desta dualidade é o próprio texto da declaração, assinada no final da cimeira, onde consta o unânime desacordo pelo embargo israelita ao Líbano, a ocupação dos territórios palestinianos, a chacina de civis pelo uso indiscriminado da força e ainda o apoio ao Irão, à Venezuela e à Bolívia, mas de forma suficientemente branda para não inviabilizar a aceitação por unanimidade.

Sendo de salientar o elevado nível de participação e a habilidade e bom senso das diferentes delegações para a produção de um texto comum, ficou por alcançar um acordo quanto ao modelo de reforma da ONU a defender pelos Não-Alinhados. Apesar do importante peso que representam no seio daquela organização o modelo actualmente em vigor, que centraliza as principais questões e resoluções no Conselho de Segurança (órgão mais restrito e no qual apenas têm assento de forma permanente as principais potências – EUA, França, Reino Unido, Rússia e China únicas com direito a veto – e mais dez outros estados de forma rotativa) afasta-os das principais decisões, tanto mais que estão excluídos do direito de veto.

Na ausência de acordo sobre a importante questão do alargamento do Conselho de Segurança e sobre quem entre os Países Não-Alinhados o deverá integrar, soa a muito pouco a decisão de criar um secretariado do Movimento Não-Alinhado junto da sede da ONU.

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