quinta-feira, 4 de novembro de 2010

UM (DES)ACORDO VERGONHOSO


Para fechar com chave de ouro a indescritível negociata entre PS e PSD para a aprovação do OE, assistimos esta semana à tristíssima imagem de vermos o partido do governo aprovar sozinho um documento que além da garantida ineficácia e da segura degradação da economia nacional acarreta ainda a degradação da qualidade de vida da esmagadora maioria dos cidadãos, passou a constituir agora quase letra morta, tais as dificuldades práticas que o governo de José Sócrates irá encontrar para o executar.
 E o pior é que as cada vez mais claras limitações dos actores políticos agravam-se com os infelizes espectáculos que proporcionam, como os que assistimos durante o processo negocial e durante o debate em S. Bento, quando PS e PSD deram mais uma triste e degradante imagem dos políticos nacionais.
Começando pela dança do concorda, não concorda e passando pelo anúncio do desentendimento por causa de 0,25%, interpretada por Teixeira dos Santos e Catroga, para acabar num acordo que nem os próprios negociadores terão entendido como alcançaram e que há evidência foi orquestrado a partir de Bruxelas (local onde por motivos diferentes se encontravam Sócrates e Passos Coelho), de tudo houve para gáudio da imprensa, xiste dos humoristas e vergonha colectiva.
Sabendo-se, de experiência feita, que o que começa mal nunca acaba bem, assistiu-se durante o período do debate parlamentar à mais completa das tolices e ao mais triste folclore pseudo político-parlamentar, com os membros do Governo e alguns (os poucos do costume) deputados a trocarem galhardetes, mimos e piropos a que nem sequer faltou o líder do CDS, para aumentar a confusão.
Acaloraram-se os actores, talvez na expectativa de entusiasmarem o público, choveram dixotes, proferiram-se ameaças, trocaram-se sarcasmos e no final o PSD, deixando cair desastradamente a máscara do superior interesse nacional em benefício do mais reles que a política pode ter (a sobreposição dos interesses tácticos na reeleição de Cavaco Silva e numa breve queda do Governo)... absteve-se!
Em poucas horas, PS e PSD esqueceram a importância da aprovação do Orçamento como sinal para os “mercados” que tanto idolatram e de quem dizem dependermos, para apenas conseguirem lobrigar os seus próprios umbigos.
Mesmo que não esperasse qualquer grande debate em torno das questões de fundo do OE (facto habitualmente explicado como mais adequado ao período de debate na especialidade, como se as bancadas se encontrassem povoadas de especialistas na matéria), sempre seria expectável que intervenções como a de Manuela Ferreira Leite, quando em abono da inevitabilidade das políticas subjacentes ao documento lembrou que «quem manda é quem paga», não se tivessem quedado pela óbvia réplica da bancada do PCP, com o seu líder parlamentar, Bernardino Soares, a afirmar que «A verdade é que quem paga esta crise é o povo e afinal quem manda é o capital, que dá ordens ao Governo e ao PSD» ou a mais críptica resposta do BE que, pela voz de Luís Fazenda, apelidou Manuela Ferreira Leite de ser uma «pitonisa do bloco central»[1].


[1] As citações referidas no parágrafo podem ser encontradas em notícias do DN e do PUBLICO

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