quarta-feira, 10 de novembro de 2010

NEGOCIAÇÃO BULLDOZER


Depois de ter sido um facto estranho, como um apelo do Papa pela Paz no Médio-Oriente e a pronta e veemente reacção israelita, a trazer para as notícias uma ronda negocial entre judeus e palestinianos que se sabia desde o início com reduzidas probabilidades de sucesso, eis que volta agora outro facto acessório, a notícia de que «Israel anuncia 1300 novas casas em Jerusalém Oriental», a reavivar o interesse no processo de paz


O recurso à política do “bulldozer” não é exclusivo do governo israelita e parece estar a fazer escola (à semelhança da política de edificação de muros de segurança), pois já esta semana o DN dava conta de um «Acampamento desmantelado pela via da força», para referir a acção em que governo marroquino procedeu à destruição de um acampamento sarauí às portas de El Aiún, a capital do território (Saara Ocidental) que ocupa desde a retirada espanhola em 1975, enquanto sobre o mesmo assunto o PUBLICO referia «Cinco marroquinos mortos no assalto ao campo de protesto sarauí».
Mas o que me leva a retomar aqui o tema do conflito israelo-palestiniano e da disputa em torno da Saara Ocidental nem sequer é para repetir o que noutras ocasiões escrevi ou para criticar o cinismo das reacções judaicas, mas tão somente para chamar a atenção para a forma perfeitamente tendenciosa como a imprensa ocidental continua a tratar estas questões; seja na forma como refere a acção militar contra civis, seja quando deu muito mais destaque à reacção de Tel Aviv que ao teor do apelo papal (diga-se perfeitamente inócuo), ou agora quando pretende fazer passar a ideia de que a política de expansão israelita é natural esquecendo as normas de direito e as resoluções internacionais que impedem a ocupação permanente de territórios militarmente ocupados.
Mesmo admitindo alguma remota possibilidade de entendimento quanto a questões de soberania, como a palestiniana e a sarauí, basta constatar a sobranceria com que os governos israelita e marroquino actuam – no caso de Benjamim Netanyahu e do seu aliado ultra conservador Avigdor Lieberman não renovando a moratória sobre a construção de novas residências judaicas nos territórios ocupados e no caso da monarquia marroquina ao usar um aparato militar com meios terrestres e aéreos para desmantelar um acampamento civil, – para sabermos que iniciativas, como as promovidas pela administração Obama ou pela ONU, terão um desfecho idêntico às anteriores.
Não será de espantar que governos como o judaico e o marroquino actuem à margem das normas internacionais no que definem como sendo os seus interesses, mas o caso é particularmente grave quando ocorrem factos como o anúncio de novas construções judaicas ou acções de força precisamente quando decorrem negociações enquanto a imprensa ocidental continua sem revelar um mínimo de equidade na abordagem de questões delicadas, como a palestiniana e a sarauí.
Já não espero sequer uma referência aos que defendem solução diversa da preconizada por Washington – a famigerada solução dois povos-dois estados – que Tel Aviv finge querer (ora com maior, ora com menor convicção) e à qual a cada vez mais desacreditada OLP se agarra como uma bóia salvação, pois talvez alguns dos seus dirigentes sintam bem a fragilidade da solução a que os estão a forçar, mas apenas um mínimo de informação que reflicta o que acontece dos dois lados do conflito.

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