domingo, 30 de agosto de 2009

IDIOCRACIA

Ao ler as notícias que ultimamente têm surgido sobre a intenção de Barack Obama reformar o actual sistema de saúde norte-americano e das polémicas que essa intenção tem originado, ocorreu-me que embora não sendo raro que a leitura de notícias oriundas doutros cantos do Mundo nos surjam como fenómenos estranhos e de difícil explicação, especialmente quando entre o “nosso cantinho” e os dos outros se erguem profundas diferenças culturais, este fenómeno dificilmente se deveria aplicar a um país com o qual compartilhamos grande proximidade cultural. Sucede porém que basta uma leitura superficial sobre a realidade do actual sistema de saúde nos EUA para, surpresa das surpresas, parecer que estamos a ouvir falar de uma realidade de um país do terceiro mundo.
É que, a bem dizer, nos EUA (a terra das oportunidades, onde abundam o leite e o mel) a saúde é um bem a quem apenas os mais endinheirados conseguem aceder. Graças a bem orquestradas campanhas o sector segurador logrou apoderar-se do sistema de saúde de tal forma que aqueles que não apresentem saldo bancário suficiente, ou um seguro de saúde válido, estão condenados a definhar à porta dos hospitais que destes não deverão receber nem um simples copo de água.

Numa época em que os níveis de desemprego atingem proporções preocupantes e que para a maioria dos assalariados americanos a única forma de acederem a algum seguro de saúde é se este for proporcionado pela empresa para que trabalham (ou trabalhavam), a disponibilização de serviços universais de saúde é , não apenas uma questão moral (como Obama já o salientou) mas também primordial.

Talvez por isso e por a existência de um serviço público de saúde ser algo natural para os europeus, a polémica e a controvérsia política que tem rodeado a questão nos EUA poderá parecer-nos totalmente injustificada.

Pior, quando chegam notícias do recrudescimento da actividade de grupos de milícias, como os que aterrorizaram os EUA na década de 1990, opondo-se à tentativa ensaiada por Bill Clinton para limitar a livre e indiscriminado posse de armas. Agora, como então, os extremistas alegam que tudo não passa de uma manobra para controlar os cidadãos livres da América...

...e para melhor fazerem passar as suas mensagens têm corrido às reuniões onde a nível local (as chamadas Town-hall meetings) se têm debatido as mudanças a realizar num sistema de saúde que há evidência (salvo para o poderoso “lobby” das seguradoras e da indústria financeira) não cumpre a sua função nem respeita os direitos humanos mais básicos.

A avaliar pela agitação, pelas intervenções e pelas palavras de ordem dos mais activistas, a questão já começa a ultrapassar os contornos e os limites de uma política de saúde para se transformar num processo de contestação aberta ao próprio presidente.

Não fora os movimentos mais conservadores do que nos EUA se designa pelo «movimento patriota» serem habitualmente constituído pelos sectores menos escolarizados e mais agressivos e talvez este crescendo de tensão não merecesse atenção de maior. Mas basta recordar o que naqueles anos 90 ocorreu em Oklahoma, quando um membro de uma dessas milícias fez explodir um edifício federal provocando a morte a mais de 160 pessoas, para esta situação merecer a maior atenção...

…uma relexão acrescida dos políticos e a exigência de responsablização daqueles que, lá como cá, na ausência de verdadeiras e construtivas ideis se limitam a lançar atoardas que mais não fazem que inflamar ainda mais os ânimos1...


...e não contribuem senão para transformar o arremedo de democracia herdade de George W Bush num claro exemplo de IDIOCRACIA.
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1 Um claro exemplo deste tipo de comportamento é o caso da ex-candidata republicana à vice-presidência e ex-governadora do Alasca – Sarah Pain – quando lançou a ideia que o governo se preparia para decidir sobre o acesso aos cuidados de saúde dos recém-nascidos que apresentassem deficiências.

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