quarta-feira, 12 de agosto de 2009

ABSURDOS NACIONAIS

Mesmo correndo o risco de me repetir, parece-me que notícias recentemente surgidas na nossa imprensa (como as que dão conta de que a «Venda de casa em Portugal sofre maior queda em 15 anos» ou que a «Classe média já está a falhar pagamentos aos bancos») devem merecer atenção, uma adequada reflexão e até algum louvor pela clarificação da informação.

No sentido de uma melhor sistematização abordemos cada notícia de “per si”, começando, obviamente, pela primeira.

Normalmente associada este tipo de notícia costumam fazer-se ouvir as lamentações dos industriais do sector da construção civil e dos empresários do sector da mediação imobiliária, esquecendo a não menos importante mas completamente desorganizada opinião dos compradores. Por isso mesmo a simples leitura do resumo publicado na página da net do ECONÓMICO, que passo a transcrever:

«A crise no sector imobiliário provocou uma quebra de 18% na venda de imóveis, mas os preços das casas até aumentaram.
No ano passado venderam-se 173,6 mil imóveis em Portugal, cerca de 500 por dia. É preciso recuar até 1992 para se encontrar um valor tão baixo.
A queda de 18% nas vendas é a maior, pelo menos, dos últimos 15 anos, segundo dados do Ministério da Justiça. Ainda assim, o valor médio de cada casa não desceu.
Os imóveis urbanos foram vendidos a um preço médio de 126 mil euros, mais 1,3% face a 2007. Os primeiros números para este ano revelam que os valores das casas continuam a subir.
»

afigura-se mais do que necessária, por não corroborar a ideia que poderia resultar da primeira leitura do título e denunciar o total absurdo que vive há vários anos o mercado imobiliário nacional, conjugando uma recessão na procura com a regular valorização dos imóveis.

Além da clara denúncia de mais este absurdo do “mercado”, a notícia reveste-se de importância acrescida (para mim e para os que há alguns anos vimos denunciando esta situação) pela raridade da sua objectividade – aqui aproveito para deixar os parabéns à jornalista Margarida Peixoto – e por confirmar aquilo que há poucas semanas escrevi no “post” «REALIDADES E FANTASIAS» quando denunciava a mistificação na notícia «Valor das casas sobe pela primeira vez desde 2007», do mesmo órgão de informação, que confundia (ou podia levar os leitores à confusão) preços de mercado do imobiliário com valores de avaliação bancária para efeitos de crédito à habitação.

Ainda sobre a questão da queda das vendas, e em jeito de comentário, sempre digo que aquela tendência se afigura perfeitamente natural e justificada por dois factores: o excesso de construção e o óbvio desajustamento entre os preços fixados para venda e a capacidade financeira dos possíveis compradores.

E este problema conduz-nos directamente ao teor da segunda notícia.

Alguém que regularmente acompanhe a evolução da economia nacional (e diga-se desde já que para o efeito não é indispensável, nem sequer necessário, qualquer formação especial) poderá estranhar que cada vez seja maior o número de famílias que não consegue suportar os encargos com a aquisição de habitação?

Quando é bem conhecida a realidade que tem levado ao aumento do rendimento do factor capital em detrimento do factor trabalho (como bem o descreveu ontem mesmo em entrevista ao I ONLINE o insuspeito ex-ministro Campos e Cunha e referindo apenas o efeito fiscal), haverá lugar a espanto, como noticiou o JORNAL DE NEGÓCIOS, quando o «Peso do malparado das famílias sobe quase 50% em dois anos»?

Esta questão do agravamento do incumprimento, se não fosse suficientemente grave pelo que representa de instabilidade e insegurança para as famílias (e por extensão para o conjunto da economia já fortemente abalada pela redução do consumo) merece especial atenção pelo que pode significar de informação sobre um possível agravamento da retracção do consumo e de factor da peso para o prolongamento da actual recessão ou para a formação de uma nova “onda” recessiva.

E mesmo que no caso português possa não ter peso suficiente para ditar o prolongamento da crise internacional, tê-lo-á seguramente no plano interno e constituirá mais um factor de preocupação para transformar o período de recuperação interno em mais um longo penar... até à próxima crise.

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