sábado, 28 de março de 2009

NINGUÉM FICA A GANHAR COM O NOVO GOVERNO ISRAELITA

Contrariando a afirmação do DN de que «Todos ficam a ganhar no novo Governo israelita», talvez que com a aproximação do seu anúncio formal, depois de alcançado um acordo entre Netanyahu (LIKUD) e Ehud Barak (AVODA), ganhe novo sentido o trabalho apresentado em meados de Janeiro pelo “think tank” europeu – LABORATOIRE EUROPÉEN D’ANTECIPATION POLITIQUE – que aponta para uma possível implosão do Estado de Israel durante a próxima década.

Depois de ter atraído os trabalhistas à coligação de direita que lidera, Benjamin Netanyahu talvez não resista à tentação de querer levar um pouco mais longe a sua reconhecida oposição à constituição de um estado palestiniano (tal é opinião que Allouf Ben[1] expressou no Ha’aretz e que o COURRIER INTERNATIONAL reproduziu aqui), por muito que possa pesar o acordo que terá fundamentado a coligação com Barak (que segundo notícia do LE MONDE não passará de termos vagos sobre a continuação das negociações de paz com os palestinianos e o respeito pelos acordos já assinados). Confirmação disto mesmo é esta notícia do DN que, citando fontes israelitas, refere a existência de um acordo secreto entre Netanyahu e Lieberman (YISRAEL BEITENU) sobre a expansão de colonatos na Cisjordânia, em aberta oposição aos acordos israelo-palestinianos já firmados.

Os dados já conhecidos, nomeadamente a participação no futuro governo do YISRAEL BEITENU (formação política da direita laica, com profundas ligações às camadas de imigrantes mais recentes e oriundas dos territórios da antiga União Soviética que apresenta uma forte tendência xenófoba) cujo líder, Avigdor Lieberman, deverá ser o futuro ministro dos negócios estrangeiros e as notícias dos confrontos enter manifestantes da extrema-direita israelita e árabes-israelitas[2] habitantes da cidade de Umm al-Fahm, apontam muito mais no sentido da confirmação das condições anunciadas pelo LEAP – endurecimento da prática política israelita – para o possível desmoronamento do estado judaico que o inverso.

No essencial aquele relatório aponta sete hipóteses de natureza estrutural, a saber:

  1. o esgotamento das forças fundadoras de Israel;
  2. o fim da época de supremacia militar israelita;
  3. o fim da opção unilateral;
  4. o reforço constante da capacidade militar e estratégica dos palestinianos;
  5. a incerteza, a longo prazo, sobre o apoio dos EUA;
  6. a crescente influência da UE na região;
  7. a transformação do conflito israelo-palestiniano num conflito regional;

que, consoante ocorra ou não um conjunto de duas outras:

  • a continuidade da política israelita, com a continuação ou o incremento da implantação de colonatos judaicos nos territórios palestinianos e um aumento das tensões israelo-palestinianas;
  • o fracasso da tentativa de renovação do processo de unidade árabe e um crescente sucesso no processo de implantação do radicalismo islâmico;

ou

  • um corte radical na política israelita, abandonando os pressupostos xenófobos e de supremacia israelita e optando por iniciar uma política de integração positiva com as populações árabes;
  • um sucesso, mesmo que limitado, da oposição árabe ao extremismo islâmico;

assim poderemos, no entender daquele “think tank”, assistir ao esboroar do Estado de Israel ou à sua consolidação enquanto parceiro num processo de integração regional.

Confirmando-se, como tudo o indica, uma viragem nacionalista e conservadora no governo israelita com o consequente aumento das tensões israelo-palestinianas e na ocorrência de um crescente sucesso no processo de implantação do radicalismo religioso árabe, a prazo, dificilmente a região escapará ao eclodir de um conflito que poderá originar um fluxo migratório judaico de sentido inverso ao até agora vigente e um inevitável esvaziamento do Estado de Israel. Caso, pouco provável face à composição do seu futuro governo, se verificasse uma mudança na política israelita, apostando numa integração positiva dos palestinianos e que a resposta do lado árabe resulte no abandono das teses islâmicas radicais, talvez venha a ser possível lançar as bases de um verdadeiro entendimento entre as duas nacionalidades.

Olhando um pouco além das teses desenvolvidas pelo LEAP, parece-me que apenas uma profunda mudança na política israelita, que conduza os judeus num processo de integração pacífica com as populações palestinianas, poderá assegurar as condições para que do lado árabe se abandonem as teses islâmicas mais radicais, se encontre uma verdadeira via para a coexistência das duas nacionalidades e se resolva definitivamente o diferendo entre judeus e palestinianos sobre a posse da terra.
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[1] Allouf Ben é um jornalista, habitual colaborador do jornal israelita HA’ARETZ – publicação de tendência liberal – e da prestigiada revista FOREIGN AFFAIRS – publicação norte-americana sobre relações internacionais –, especialista nas relações israelo-palestinianas e israelo-sírias.
[2] Àrabe-israelita é a designação que Tel-Aviv atribui aos palestinianos residentes em território israelita. Este grupo, que corresponde a cerca de 20% da população total de Israel continua ainda hoje a ser alvo de profundas e repetidas discriminações, quer no campo político, no campo económico e no social, que poderão ainda ser agravadas caso vingue a ideia de Avigdor Lieberman da exigência de “juramentos de lealdade” àqueles cidadãos.

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