quinta-feira, 24 de maio de 2007

O DESERTO DE ARGUMENTOS

A necessidade de vir a terreno de luta defender o que muitas vezes se constata indefensável é normal apanágio de um bom político; já os de menor gabarito sofrem a bom sofrer com esta prática.

Vem isto a propósito das múltiplas declarações do actual Ministro das Obras Públicas, Mário Lino, que no afã de defender a opção pela construção do novo aeroporto na Ota se tem desdobrado em declarações por todo o lado por onde vai passando. Entre as últimas contam-se as ontem proferidas durante um almoço-debate, promovido pela Ordem dos Economistas, quando o ministro defendeu a opção pela Ota porque «(f)azer um aeroporto na margem sul seria um projecto megalómano e faraónico porque, além das questões ambientais, não há gente, não há hospitais, não há escolas, não há hotéis, não há comércio, pelo que seria preciso levar para lá milhões de pessoas»[1]. Passando o exagero da afirmação, será que os pântanos da Ota já apresentam aqueles volumes de população? e então uma das razões para desactivar a Portela não é o risco que representa a elevada densidade populacional em seu redor?

No inevitável clima de contestação imediatamente criado pelas oposições (Paulo Portas até já veio exigir explicações ao Primeiro Ministro e a demissão de Mário Lino) também vieram algumas vozes do PS em socorro do ministro; Almeida Santos levou tão a peito a tarefa que até aproveitou para contestar a opção pela margem sul do Tejo alegando razões de segurança interna (um grupo terrorista poderia fazer explodir a ponte de ligação[2]), mas esquecendo que o modelo de financiamento que o seu partido se propõe aplicar passa pela privatização da empresa que gere os aeroportos nacionais, assim entregando em mãos desconhecidas (e naturalmente estrangeiras) a gestão de infraestruturas cruciais em caso de conflito.

Perante isto apenas posso concluir que os argumentos em defesa da Ota já começam a falhar e entre os seus defensores já vale quase tudo, menos a abertura de um processo de estudo e avaliação de opções que realmente convença a generalidade dos portugueses da necessidade de construção de um novo aeroporto.

Porque o que está em causa é uma opção estratégica para o futuro do nosso país, melhor faria o governo se aproveitasse as múltiplas opiniões que sobre o assunto têm surgido e lançasse um verdadeiro debate nacional, não sobre a viabilidade técnica de construção de uma nova infraestrutura aeroportuária (toda a gente sabe que actualmente a engenharia constrói quase seja o que for e onde for) nem sobre as limitações de natureza ambiental desta ou daquela localização (não deverá haver uma única que se possa afirmar “limpa”), mas sobre as alternativas exequíveis para um país cuja economia regista níveis de crescimento tão fracos como os nossos.
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[1] http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1294898
[2] http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1294865

1 comentário:

antonio ganhão disse...

Mário Lino é acima de tudo um homem solidário com Sócrates. Não só executa o que o chefe pretende mas vai mais longe.

Esforça-se por demonstrar que um engenheiro licenciado e inscrito na ordem pode ser tão incapaz como alguém que estudou numa universidade de segunda e não vê o seu curso reconhecido pela Ordem.

Como aquela directora que castigou um professor por causa de uma conversa privada, também Mário Lino sofre com as afrontas feitas a Sócrates:

Por ventura não terá já Sócrates dito que a Ota é a solução? Então povo de má fé: aceitem e habituem-se!