domingo, 25 de março de 2007

CERTEZAS SOBRE A PORTELA

Quando parece aumentar a convicção na sociedade portuguesa de que a opção pela construção do novo aeroporto na Ota constituirá mais um erro crasso, dos vários que sucessivos governos têm acumulado nas últimas décadas, e até já surgem algumas figuras de primeiro plano do partido do governo (ver o resumo que o JORNAL DE NOTÍCIAS publicou no passado dia 21) a sugerir a necessidade de maior reflexão sobre a opção, importa ir um pouco mais longe do que apontar os principais defeitos à opção da Ota que se podem resumir segundo dois grandes grupos:

1. os de natureza técnica resultantes da localização geográfica (regime de ventos e regular ocorrência de nevoeiros) e das características dos solos (leito de cheias) que implicarão um agravamento no custo total da obra;

2. os de natureza financeira, na medida em que a escolha de uma solução mais e cuja rentabilidade ainda está por demonstrar, cujos efeitos serão especialmente sentidos após a sua entrada em funcionamento.

Assim, na sequência do post” anterior, onde além do apelo à mobilização para a suspensão do projecto levantei a dúvida sobre a necessidade de um novo aeroporto, parece-me oportuno deixar aqui algumas breves notas sobre o assunto.

Como muitas outras pessoas creio que reagi positivamente às primeiras notícias sobre a ideia de retirar o aeroporto de Lisboa da zona da Portela. Mesmo quem não seja um especialista em matéria de transportes ou de aeronáutica, ninguém de bom senso negará que ao ver o número de aeronaves que diariamente sobrevoa a cidade, nas manobras de aterragem ou descolagem, nunca lhe ocorreu a catástrofe que resultaria da sua queda sobre uma zona densamente povoada. É certo que o número de acidentes dessa natureza continua a ser muito reduzido (principalmente entre os aparelhos utilizados pelas principais companhias aéreas ocidentais), mas sendo uma possibilidade real merece ser tido em linha de conta.

Se o argumento da segurança (ou mais concretamente da sua ausência) tem um elevado peso intrínseco, não é menos verdade que ao longo do tempo e das leituras que sobre o assunto fui fazendo começou a formar-se um cenário bem diferente do inicial (ver, a propósito, o que em 2005 escrevi aqui, aqui, aqui e aqui). Ás primeiras dúvidas que então deixei expressas e que se baseavam fundamentalmente em questões de natureza económica e da óbvia pressão especulativa que se sentia sobre os terrenos que ficariam disponíveis, começaram a suceder-se outras que especialistas nestas matérias foram colocando.

Entre estas mereceram-me especial atenção a série de textos que encontrei no endereço MAQUINISTAS.ORG, da autoria de Rui Rodrigues (que soube agora também integrará a compilação que o Prof. Castro Henriques prepara), que me despertaram para outras abordagens da mesma grande questão: SERÁ INDISPENSÁVEL A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO AEROPORTO?

A confirmar-se que existe a possibilidade de expandir as actuais instalações da Portela, usando para o efeito a área de Figo Maduro e melhorar a utilização da pista mediante o redesenho das vias de circulação das aeronaves (“taxi way”) será motivo bastante para questionar a necessidade de um novo aeroporto, para mais com os custos que a opção Ota apresenta.

Como é normal em muitas situações, em que uma dúvida suscita outra, também a propósito dos cenários que apontam para um rápido esgotamento da capacidade da Portela o Eng. Rui Rodrigues aproveita para lançar a questão sobre a nova tendência nos transportes aéreos – as companhias de baixo custo ou “low cost”, como são conhecidas no meio. Segundo este especialista a ANA tem vindo aliciar as “low cost” a voarem para a Portela (são já mais de uma dúzia a fazê-lo) para justificar a necessidade de um novo aeroporto. Em resultado da presença das “low cost” na Portela as companhias regulares (entre as quais a TAP) têm que baixar o preço das suas tarifas, quando a solução que melhor serviria os interesses das companhias aéreas e dos passageiros seria a abertura de uma pista reservada às “low cost”.

Uma solução deste tipo foi estudada já em 1999, altura em que a ANA defendia a conversão do aeródromo do Montijo à utilização civil, à semelhança do que se vem fazendo um pouco por toda a Europa; em sua defesa diga-se que além de proporcionar uma base operacional e um pólo atractivo para o turismo, ainda permitiria à TAP beneficiar da vantagem de poder continuar a voar para a Portela (a par com as restantes companhias tradicionais) e, sobretudo, traduzir-se-ia numa solução mais facilmente integrável na rede europeia de Alta Velocidade.

Esquematicamente o problema resume-se assim:

Por último, esta solução cujo custo foi na época estimado em cerca de 100 milhões de euros, representa uma assinalável poupança face aos 5 mil milhões estimados para o faraónico projecto da Ota. Nas palavras do autor do trabalho, tudo se resume a este simples raciocínio: «A França e a Alemanha são países ricos que adoptaram soluções simples e baratas enquanto Portugal, que se depara com graves limitações financeiras, pretende avançar com soluções complexas e de alto custo»

Mas a somar a tudo existem ainda um outro problema que Rui Rodrigues levanta: QUAL O FUTURO DA TAP DEPOIS DA OTA?

A avaliar pela resposta que ele próprio dá, baseado no que sucedeu à congénere grega depois da inauguração de um novo aeroporto – que obrigada a suportar o acréscimo dos custos das taxas aeroportuárias na nova unidade não tardou a entrar em situação de falência – será de esperar o pior.

Infelizmente tudo se conjuga para que os membros do executivo de José Sócrates não consigam tirar a devida ilação das teorias que Muhammad Yunus veio defender na passada semana em Lisboa e, adaptando-as ao caso português, entendam que a opção que verdadeiramente poderá gerar emprego e crescimento sustentado do PIB não é a Ota (que gerará emprego durante o período da construção mas deverá originar a falência da TAP, a “fuga” das “low cost” para o aeroporto espanhol mais próximo e o agravamento do endividamento nacional num projecto sem futuro), mas sim um aeroporto simples, próximo de Lisboa e que permitindo baixos custos de operação atraia os voos turísticos que já começaram a desenhar o futuro.

Cumprida esta condição e o desenvolvimento da rede de Alta Velocidade (ligação Lisboa - Madrid pelo TGV), a Portela pode muito ver a sua esperança de vida aumentada em mais uma geração.

1 comentário:

Anónimo disse...

Eu não quero acreditar que o governo está insensível a qualquer outra solução que não seja a OTA, será porque pensa que equacionando a construção noutro local com melhores condições, e tendo de fazer novos estudos, poderá atrasar o projecto que parece ser fundamental para a politica económica que o governo quer ter em 2009.

Todos sabemos que este projecto vai mexer com a economia do país, gerando emprego e investimento, será que em nome dos votos se vai construir na OTA fazendo ouvidos de surdo ao que dizem os técnicos e entendidos na matéria.