Após o pedido de auxílio internacional emitido pelas autoridades timorenses, ao qual responderam a Austrália, a Malásia, a Nova Zelândia e Portugal, a que se seguiu o rápido envio das primeiras tropas australianas e as primeiras declarações do primeiro-ministro australiano, John Howard, referindo a existência de um problema de governação naquele território, parece-me cada vez mais importante entender o que se está realmente a passar naquele país.
Os primeiros incidentes graves terão começado em Fevereiro, com uma greve de militares reivindicando melhores salários e melhores condições de trabalho. Acalmada esta crise o governo, liderado por Mari Alkatiri, dispensou em Março quase 50% dos efectivos militares, tendo os primeiros motins, atribuídos aos militares dispensados, rebentado em Abril, após a celebração de um congresso da Fretilim (partido do governo) que muitos acusam ter sido manipulado por Mari Alkatiri. A intensificação destes motins determinou a decisão do pedido de ajuda internacional.
Neste capítulo importa realçar dois aspectos – a rápida resposta favorável de países como a Austrália e o número de tropas a deslocar para Timor. Dentro de dias aquele país terá maior número de soldados deslocados em Timor que no Iraque (1.800 contra 1.300), facto que revelará a importância atribuída à sua pacificação.
As posições dos responsáveis timorenses pouco ajudam para clarificar a situação; evidente parece o distanciamento entre o presidente Xanana Gusmão e o primeiro-ministro Mari Alkatiri, com este a afirmar a unidade do governo enquanto se vão ouvindo declarações pouco concordantes do seu ministro dos negócios estrangeiros, Ramos Horta.
Há evidência parecem estar em jogo diversos interesses, havendo mesmo quem se interrogue sobre a relativa passividade da estrutura local da Igreja Católica e quem associe isso ao facto do primeiro-ministro ser um muçulmano laico.
Que a intervenção australiana revela evidentes sinais de “elevado” interesse, que o seu primeiro-ministro não revelou qualquer hesitação na nomeação de responsáveis pela situação e que começam a chegar relatos de populares que acusam as tropas australianas de nada fazer para proteger as populações (ver notícia de hoje no PUBLICO), são factos inegáveis. Quando no próprio dia das declarações de John Howard o ministro dos negócios estrangeiros português, Freitas do Amaral, se apressou a classificá-las de ingerência nos assuntos internos de um país soberano, não posso deixar de questionar o que poderá estar por detrás de tudo isto.
Será que o problema de Timor-Leste é apenas fruto de rivalidades internas, agravadas pelas fracas condições de uma economia muito débil, pela existência de um elevado número de cidadãos que pouco mais aprendeu a fazer que usar armas para resolver diferendos e pela dependência de mecanismos de ajuda internacional que, normalmente, pouco mais fazem que consumir parte significativa dessa mesma ajuda? Ou será que o que tem feito mover toda esta agitação é o interesse económico da Austrália pelo controle das águas territoriais timorenses, como se sabe abundantes em petróleo?
A resposta não tardará a surgir. Mas as últimas reacções não prometem nada de muito bom para as tropas portuguesas a deslocar para aquele país, nem um futuro muito tranquilo para os timorenses.
Sem comentários:
Enviar um comentário