A agitação social grassa pela Europa fora, embora tal não constitua mais que notícias esparsas e fugazes na imprensa nacional. Não fora a espectacularidade da iniciativa dos controladores aéreos espanhóis (e os claros efeitos que teve sobre o tráfego aéreo) e também aquele claro sinal de revolta teria passado quase desapercebido.
Sem querer aqui discutir a legalidade da acção de protesto, que por não parecer enquadrada por qualquer estrutura sindical nem respeitar os cânones definidos pelos poderes estabelecidos foi prontamente qualificada de greve selvagem, nem as razões que assistirão ou não quem a realizou, o facto é que a iniciativa demonstrou bem uma realidade que poderá constituir uma claro aviso para os tempos que se aproximam.
Apodar de selvagens os trabalhadores que se manifestam contra reduções salariais e aumentos dos horários de trabalho, sem analisar minimamente a justeza e a verdadeira essência dessas medidas, equivale a um juízo parcial e não constitui mais que a reacção desejada pelos autores das políticas que em nome de sacrossantos princípios, como o do equilíbrio orçamental, pretendem transferir os custos de uma crise económica e financeira dos sectores que a originaram para as populações em geral.
Enquanto permanece por fazer uma correcta avaliação dos efeitos de uma crise que há muito ultrapassou os contornos meramente económicos dum processo originado na sobrevalorização do papel do sector financeiro e fundamentada numa enviesada política de distribuição de rendimentos que há décadas vem minando o poder de compra e a qualidade de vida dos trabalhadores por conta de outrem, para ganhar foros de uma vasta crise de contornos sociais e políticos (por isso muitas vezes é apelidada de crise sistémica) que perante a passividade e a inoperância dos governos não poderá deixar de continuar a avolumar-se, os “opinion-makers” criados e alimentados para servirem este estado das coisas continuarão a debitar as suas profundas análises e a tentar acalmar os mais revoltados.
Esta aparente bonomia (mesmo considerando a prontamente louvada posição de força do governo espanhol na gestão da crise dos controladores aéreos) não pode nem consegue esconder que um pouco por todo o lado os governos receiam cada vez mais as reacções populares que não poderão deixar de crescer em número e em violência.
Esmagados pelas medidas económicas e sociais decididas para conter os défices orçamentais – sempre orientadas contra as maiorias mais desfavorecidas –, sem aparente saída face ao constante aumento do número de desempregados, é bem provável que as manifestações mais violentas deixem de ser obra de uma minoria de radicais anarquistas (como normalmente são apelidados pelos meios de informação) e comecem a ser engrossadas por pacatos chefes de família.
Notícias esparsas, como a recente decisão do governo de José Sócrates de a pretexto da Cimeira da NATO adquirir viaturas blindadas para a PSP (de que pode servir de exemplo esta do I) ou outra do jornal francês LE FIGARO, que dá conta de uma decisão do governo de Nicolas Sarkozy de vir a mobilizar 10.000 soldados para reforçar os corpos de segurança pública, reflectem bem o que os poderes estabelecidos receiam – e de que maneira... – a sua crescente probabilidade, pelo que já terão começado a tomar as devidas providências, não na forma de novas e diferentes medidas políticas mas sim na aquisição de novos equipamentos para as forças policiais e na mobilização ou criação de corpos militares e militarizados, cuja principal missão será conter por todos os meios as revoltas que receiam.
Tudo isto torna cada vez mais premente a dúvida de até quando se conservará este precário e forçado equilíbrio?
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