quarta-feira, 13 de outubro de 2010

REFÉNS


Mesmo quando a ordem do dia noticiosa parece totalmente absorvida pela questão da aprovação do OGE (já reparam que pouca gente parece dedicar a mínima atenção à questão da discussão, em sede parlamentar, do documento?) e do descalabro nacional que poderá advir (dizem alguns...) da sua rejeição, lá vai surgindo uma ou outra notícia interessante , como é o caso da eleição de Portugal para o lugar de membro não-permanente do Conselho de Segurança da ONU.

É natural que a principal atenção esteja centrada na questão do OGE e embora as razões pareçam estranhas, pois discute-se mais o acessório (o défice público e uma possível crise política) que o fundamental (as alternativas às razões que conduziram a uma situação cujos contornos ainda não estão perfeitamente claros); talvez, tudo esteja afinal dentro da perfeita normalidade.

Esta imagem ocorreu-me quando me apercebi do enorme friso de “personalidades” que começaram a surgir nos meios de comunicação advogando a indispensabilidade da aprovação do documento que pretende regular a vida do país durante o ano de 2011; enquanto os políticos que dirigem os partidos (sejam eles os do governo ou da oposição) continuam a “disparar” em todas as direcções vão mantendo a população refém...




E a imagem sugere outras questões, não apenas pertinentes mas principalmente preocupantes. Até que ponto esta estratégia de pseudo confrontação e de antecipação de todos os males, este clima de instabilidade, montado em torno da questão da aprovação do OGE, não constitui parte de uma estratégia há muito desenhada para conseguir que as populações aceitem pacificamente o que de outra forma poderia ser fortemente contestado?

Quando assistimos, um pouco por todo o lado, ao agravamento das reacções a medidas profundamente impopulares (como tem sido o caso da luta contra o aumento da idade da reforma em França) e lesivas da qualidade de vida das populações; quando se avoluma e ganha consistência a concertação da reacção popular, notícias como as que deram conta da intenção de compra de viaturas anti-motim para a PSP merecem outro tipo de interpretação e, além da óbvia crítica a um gasto de 5 milhões de euros no actual contexto das finanças públicas, passam a ser reveladoras dos verdadeiros receios dos governantes.

Com crise do OGE ou sem ela, com agravamentos fiscais, reduções de salários e de apoios de carácter social, a classe governante parece cada vez mais consciente da proximidade de um ponto de ruptura e teme-o, não tanto pelos efeitos nefastos que terá sobre o PIB nacional ou sobre a confiança dos “mercados” mas principalmente pelo que isso possa representar de ruptura face ao sistema político-económico em que sempre gravitaram.

Afirmações como esta, da autoria do sociólogo italiano Francesco Alberoni, ontem publicada no I, que, resumindo a sua opinião sobre a cena política italiana, assegura que «Quando faltam forças unificadoras com base em valores, a corrupção, a desordem, a desconfiança e o medo acabam por se generalizar e a certa altura surgem movimentos colectivos com base em novas ideias e com novos líderes» não constituem senão uma forma um pouco mais suave de dizer o mesmo...

Sem comentários: