Se durante a campanha eleitoral norte-americana poderá ter feito sentido a produção de artigos em prol do candidato que melhor poderia prefigurar (e consubstanciar) um sentimento de mudança que se julgasse indispensável, no momento em que a actuação da administração Obama pode já ser avaliada pela sua prática e que em capítulos como a política económica esta se confirma como uma mera continuação das políticas de apoio às grandes empresas e aos interesses de Wall Street, ou quando as grandes linhas da política internacional, embora suavizadas pela perspectiva multilateralista, perpetuam os mesmos terrores, a prática daquela incensação perde todo e qualquer sentido.
Ora é precisamente isto que Mário Soares faz na primeira parte da sua última crónica no DN, a propósito de cujo título – A NOVA AMÉRICA E A VELHA EUROPA – e conteúdo me parece mais adequado inverter as qualificações, pois a América cada vez menos se pode apresentar como algo de novo quando as políticas da sua actual administração não representam senão uma singela e pouco durável operação de cosmética.
O que me afasta da tese defendida por Mário Soares e me leva a preferir o trocadilho (e a provocação) expressa no título deste “post”, é que se continuo a ver nas políticas de Obama e da sua equipa a prefiguração das velhas teses pró-globalização não abdico de defender para a Europa a necessidade de novas políticas e, principalmente, de um novo paradigma – todos iguais, todos diferentes – único que julgo capaz de assegurar a construção de uma UE efectivamente orientada para a defesa dos interesses das suas populações.
Uso intencionalmente o termo populações no plural porque entendo que o maior potencial da nova Europa resultará de uma adequada gestão e utilização da diversidade que a compõe. O grande logro conceptual que nos mergulhou numa crise sem memória foi precisamente o de pugnar pela uniformização de conceitos, práticas e anseios há imagem e semelhança dos que se julgam senhores do Mundo e que se arrogam o direito de decidir por todos os que pensam da mesma forma, ou não. Preconizar a melhoria das condições de vida das populações de todos os continentes não é o equivalente a transformá-las à imagem e semelhança dos absurdos padrões de vida (e de consumo) norte-americanos.
Pugnar pela melhoria das condições de vida não pode servir de pretexto para impor padrões (sejam eles de natureza moral, social, religiosa, económica ou política) que as populações não tenham atempadamente interiorizado. Defender um melhor futuro para as próximas gerações não pode ser um processo em que uma minoria, sustentada no seu poder económico ou no aparelho militar de qualquer das grandes potências, imponha como universais as regras que melhor lhe convenham.
Infelizmente, para o melhor e para o pior, o que hoje representam os Obamas que proliferam por esse mundo fora é precisamente a ideia da prevalência do poder das elites económicas sobre a vontade das populações e é por isso que lamento o facto das recentes eleições europeias não terem servido para um efectivo debate do que os eleitores de cada estado-membro entendem que deve ser o futuro da União Europeia. Naturalmente para as elites bem pensantes e cuidadosas praticantes do politicamente correcto, tudo foi preferível - até uma absurda taxa de abstenção de 60% - ao risco de generalizar o debate e de permitir a circulação de informação sobre o que pretendem para o futuro da UE, incluindo o texto do famigerado Tratado de Lisboa. E isto é o típico pensamento velho, ou de quem vê o futuro com os olhos da nuca.
Numa fase de profunda crise económica e de ainda maior crise de valores, recusar as oportunidades para um debate aberto sobre o futuro que todos queremos não é apenas condenável, é criminoso! E isto é o que os políticos que nos têm governado continuam a fazer perante a nossa passividade.
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