É óbvio que muitos dos que escrevem sobre o assunto integram um de dois grupos de analistas: os que estão mais preocupados em apresentar justificações ou em escamotear realidades e os que entendem que a grande questão é encontrar a “chave” para a saída, e por isso, nem uns nem outros, nunca poderão responder àquela questão. É matéria que se lhes afigura irrelevante ou que entendem que os desviará da magna tarefa de salvarem a economia...
Porém, a resposta é, dentro da enorme complexidade do problema, de uma relativa simplicidade e de uma enorme utilidade para se entender a forma de combater o desastre.
O aparente paradoxo que constitui o súbito desaparecimento da enorme riqueza que se dizia existir é facilmente explicado pelo facto de parte muito significativa desse dinheiro (riqueza ou valor, como lhe queiram chamar) nunca ter existido.
Absurdo? Passe de mágica? Nada disso, o que sucede é que os milhões de biliões de dólares[1] que se dizia existirem e que eram regularmente noticiados nas capitalizações bolsistas alcançadas pelos activos financeiros nas principais praças mundiais, nos lucros dos bancos e das grandes empresas, apenas existiam numa versão contabilística, ou seja, eram puro resultado do ciclo de especulação desenfreada que foi despoletado pela conjugação de factores como as baixas taxas de juros e a expansão do crédito bancário, a desregulamentação dos mercados financeiros e uma insaciável necessidade de crescimentos que justificassem os elevados rendimentos dos gestores daquelas empresas.
Com uma parte significativa do crescimento económico sustentado em crédito bancário e sabendo que a “moeda” assim criada é automaticamente destruída quando se procede à liquidação da linha de crédito[2] que a originou, começará a ganhar forma a razão pela qual disse atrás que aquele dinheiro nunca existiu, sem que isso signifique que não tenha havido quem obtivesse ganhos a partir daquele valor praticamente inexistente.
Curiosamente, ou não, enquanto preparava este “post” o jornal britânico GUARDIAN publicou um interessante artigo da jornalista Aida Edemariam, intitulado «The incredible shrinking economy» no qual esta cita alguns especialistas e as suas apreciações sobre a situação da economia mundial mas deixa por responder a questão fundamental – porque é que as economias estão a “encolher”? – porque a maioria dos seus interlocutores, sendo parte integrante do meio financeiro, nunca coloca o dedo na ferida. Isso mesmo se constata quando a páginas tantas a jornalista questiona se não seria simplesmente melhor deitar aquele valor imaginário num qualquer caixote do lixo imaginário e um dos seus interlocutores, Thomas Kirchmaier professor convidado da prestigiada London School of Economics, lhe responde: «[s]omos uma sociedade de capital intensivo e isso torna-nos mais produtivos e mais ricos. Acabar com tal tipo de sociedade significaria regressarmos à Idade da Pedra. Assistimos a momentos na História em que houve Estados que tentaram renegociar as suas dívidas e recomeçar de novo. A Alemanha, após a I Guerra Mundial, foi um desses exemplos e actualmente o Zimbabwe, mas nenhum se pode considerar um caso de sucesso».
Embora a própria jornalista, em comentário à margem àquelas declarações, recorde que vivemos numa sociedade dependente do crédito, ninguém arrisca o passo final e aponta o dedo a um sistema que assegura o seu próprio enriquecimento à custa do empobrecimento geral.
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[1] Refiro o dólar por facilidade e por representar (ainda) a moeda mais usual na contabilização das trocas internacionais, mas o raciocínio aplica-se a toda e qualquer moeda.
[2] Importa aqui acrescentar que aquela destruição não incide apenas sobre o capital emprestado mas também sobre os juros pagos, pelo que o crédito não só aumenta do valor do credor (banco) mas constitui um importante mecanismo de empobrecimento do devedor e de regular redução da liquidez no mercado.
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