domingo, 25 de janeiro de 2009

ESCOLHA A SUA CÓLERA

São notícias como esta do DIÁRIO ECONÓMICO, que informa que a «Ericsson dispara 14% após anunciar 5 mil despedimentos», que deviam merecer um tratamento jornalístico adequado, muito além da mera descrição dos montantes envolvidos e do número de postos de trabalho a eliminar, e uma especial atenção dos políticos e dos cidadãos.
Aos jornalistas tem que se exigir cada vez mais um trabalho de análise e comentário dos factos, primeiro porque apresentando-se a notícia subscrita não pode limitar-se à mera reprodução (incluindo ou não a tradução a partir do idioma de origem) do despacho de uma qualquer agência noticiosa e depois porque o facto descrito vai francamente além de um mero “happening”. Mesmo quando o dia-a-dia noticioso abunda de casos análogos, o despedimento de uns milhares de trabalhadores de uma das principais empresas mundiais que opera num sector de ponta como o da electrónica e telecomunicações não pode sofrer este tipo de banalização.

Que os políticos permaneçam mudos e quedos perante realidades como a descrita na notícia não será de estranhar, tanto mais que encontrarão cada vez maiores dificuldades para explicar o insucesso das políticas com que dizem pretender combater a crise.

O modelo informativo quase acético que conhecemos é, sem sombra de dúvidas, o que melhor servirá os interesses de políticos e donos de empresas, mas o que pior preparará as condições para a resolução da crise económica que vivemos.

Ao silêncio cúmplice ou comprometido que se regista terão os cidadãos que responder com a exigência das explicações que lhes são sonegadas, porque estas deviam ser parte indispensável de um processo de debate em busca da melhor solução.

Quando se anunciam perspectivas de mais fundos públicos para apoio ao sector financeiro europeu[1] e nos EUA se mantém a expectativa de planos de apoio ao sector automóvel, esta notícia sobre a ERICSSON pode muito bem ser mais um mecanismo de pressão para acelerar a acção dos políticos, que parecem cada vez mais dispostos a intervir no sentido de salvar o maior número possível de postos de trabalho.

Esta aliás é a posição que o primeiro-ministro José Sócrates anunciou na televisão nacional e que na prática se resume a tentar aumentar, por esta via, o consumo, enquanto o grosso do esforço financeiro continua a ser centrado nas empresas. Ora, os planos de salvamento das grandes empresas poderão minimizar os efeitos da crise sobre os que nelas trabalham, mas dificilmente contribuirão de forma sustentada para o relançamento das economias e para contrariar a repetição de mais crises.

A ideia de que a acção política irá centrar-se no lado da oferta, continuando a privilegiar o papel dos empresários em detrimento do dos trabalhadores é a que deverá estar na origem da reacção de valorização da cotação bolsista de uma empresa pelo simples facto desta se preparar para reduzir os custos com os salários.

A própria notícia refere que com o anúncio dos despedimentos a cotação das acções da ERICSSON disparou 14%, mas não gastou um único parágrafo a explicar porque tal aconteceu e se o fizesse, o que diria?

Que a anunciada redução nos custos permite antecipar maiores ganhos nos próximos exercícios, ou que os despedimentos compensam as quebras nas vendas e assim deverá sobrar mais dinheiro para distribuir pelos accionistas? Mas numa economia em contracção mais dividendos para distribuir também podem significar menores investimentos em desenvolvimento de novos produtos e menores resultados no futuro, opção de gestão que o “mercado” deveria penalizar.

O absurdo do dogmatismo económico há-de chegar ao extremo de pretender dispensar o último trabalhador para maximizar os ganhos dos investidores. Nessa economia de sonho não haverá mais crises – esse será o estado perpétuo, logo não identificável, da economia no futuro que os políticos nos propõem – apenas um longo arrastar da situação de crescente pauperização dos que pouco mais possuem que a capacidade para trabalharem.
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[1] Esta notícia da BBC NEWS é um disso um bom exemplo.

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