domingo, 20 de julho de 2008

O LOGRO DA DESCIDA DO IVA

Embora tenham decorrido apenas duas dezenas de dias desde a redução da taxa do IVA de 21% para 20% é já possível constatar que ao invés do anunciado pelos nossos governantes o efeito daquela redução no rendimento das famílias pode ser considerado nulo.

Como era fácil de prever e a exemplo da redução do IVA nos ginásios[1] o efeito dessa variação acabará nas receitas dos empresários, não se traduzindo na efectiva redução do preço final dos produtos e serviços. A própria comunicação social se fez de eco desta situação[2] e poucos esconderam qual seria o real destino dos mais de 500 milhões de euros que o fisco prevê deixar de receber com esta medida.

Paulo Portas prontamente se fez paladino dos mais desfavorecidos e denunciou em pleno parlamento que «Portugal é o único país da Europa onde o IVA desce e a factura sobe» tomando como exemplo o preço dos combustíveis cobrados pela GALP entre Janeiro e Julho deste ano.

Como não pretendo laborar no erro simplista do líder do CDS, que se esqueceu que no caso citado existia um diferencial de tempo em que se registaram vários aumentos de preço (provocados pela famigerada subida do “crude”), vou-me socorrer da informação que mão amiga me fez chegar por e-mail e que refere a “estranha” situação de uma mercadoria (botija de 13kg de gás butano) ter custado a um consumidor o mesmo preço em 24 de Junho e em 2 de Julho – 20,25€ – embora a respectiva factura registe taxas de IVA diferentes – 21% em Junho e 20% em Julho – e valores diferentes para o IVA cobrado, 3,51€ e 3,38€, respectivamente.


Caso não se tivesse verificado um aproveitamento de duvidosa justificação[3] por parte da empresa fornecedora, a botija de gás deveria ter custado no dia 2 de Julho 20,08€, conforme se pode constatar pelo quadro seguinte:

que revela ainda que prejudicando o consumidor em 17 cêntimos (0,826%) o vendedor, mediante o aumento do seu preço de 16,74€ para 16,875€ encaixou um ganho extraordinário de 0,833% e que o Estado o acompanhou nos ganhos, pois em vez de receber 3,35€ encaixou 3,375€, ainda e sempre a expensas do comprador.

Sucede que por muito pequenas que sejam aquelas variações, no caso vertente 0,17€, em cada artigo transaccionado o valor sobre o conjunto final dos bens e serviços transaccionados no país representará mais de meio milhão de euros que contribuirão para agravar ainda mais o já muito desequilibrado sistema de repartição da riqueza. Tal como já aqui o denunciei, voltarão uma vez mais a ser as famílias a suportar mais este processo de acumulação de riqueza nas empresas.

O logro do anúncio da redução do IVA é em tudo semelhante aos muitos outros mecanismos de apropriação indevida de receitas por parte das empresas que os nossos governos têm facilitado.

De memória recordo aqui os casos dos famigerados arredondamentos praticados nos juros cobrados pelos bancos e o da cobrança indevida de portagens nas auto-estradas em situação de obras (uma flagrante violação da lei e do pressuposto que fundamenta aquele pagamento), que nem de propósito noticiou esta semana o DIÁRIO ECONÓMICO que é convicção da Associação Portuguesa das Sociedades Concessionárias de Auto-Estradas e Pontes com Portagens[4] que a «Restituição de portagem só será possível após Estado emitir declaração formal de incumprimento»… Por outras palavras “NUNCA”!

E tudo isto acontece naquilo que se designa por “um estado de direito”, mas no qual os governos facilmente se associam aos interesses económicos, seja por deles obterem múltiplos benefícios seja por pela sua omissão também verem aumentadas as respectivas receitas fiscais.
__________
[1] Tal como refere Miguel Frasquilho num recente artigo no JORNAL DE NEGÓCIOS «...a redução do IVA dos ginásios de 21% para 5% não correspondeu a uma diminuição dos preços pagos pelos clientes – um caso tão flagrante que o Governo pediu à Autoridade da Concorrência, à Inspecção-Geral de Finanças e à Direcção-Geral do Consumidor que investigassem o sucedido».
[2] Entre outras notícias destaque-se esta do DIÁRIO ECONÓMICO e o artigo «A descida do IVA no retalho» de Rogério Ferreira Fernandes no mesmo diário, no qual o autor explica a sustentação legal para a manutenção dos preços de retalho, com base nos custos da remarcação individual (obrigatória por lei) dos produtos.
[3] Mesmo que havendo justificação para um aumento de preço baseado no aumento do “crude”, dificilmente alguém acreditará que este coincidiu precisamente com o valor necessário e suficiente para que o preço final (preço da mercadoria mais IVA) não tenha sofrido a mínima alteração.
[4] A APCAP- Associação Portuguesa das Sociedades Concessionárias de Auto-estradas e Pontes com Portagens, é a entidade que representa as empresas concessionárias de auto-estradas, a saber: a Aenor, a Auto-Estradas do Atlântico, a Auto-Estradas do Douro Litoral, a Brisa, a Brisal, a LusoLisboa e a Lusoponte.

1 comentário:

Valentim Novo disse...

A Brisa não alterou o preço das portagens no troço Grijo PV-Coimbra Norte, e vice-versa, no valor de 6.35€, de acordo com a nova taxa de Iva de 20%.
Já expus a questão á Brisa por escrito, e alegaram o seguinte:
"Agradecemos desde já o seu contacto.
Temos presente a exposição apresentada por V. Exa. com data de 23.07.2008, cujo conteúdo mereceu a nossa melhor atenção.
Relativamente à mesma informamos que o calculo das Taxas de Portagem é efectuado, de acordo com o Dec.-Lei N.º 294/97 de 24 de Outubro, multiplicando o valor da tarifa (custo/Km) pela distancia do percurso, aplicando posteriormente o valor do IVA e arredondando ao múltiplo de 5 cêntimos de euro mais próximo. Devido a este arredondamento a diminuição de 1% no valor do IVA pode não se traduzir numa diminuição do valor da taxa de portagem, como é o caso em análise.
Sem outro assunto de momento, subscrevemo-nos com os melhores cumprimentos."

Como assim não o entendo contrapuz novamente:
"Pois no presente caso, e aplicando a Lei que referiu, permita que lhe faça as contas da aplicação da nova Taxa de Iva.

Percurso Coimbra Norte - Grijó, com taxa Iva a 21% = 6.35€

6.35€ / 1.21 = 5.25€
5.25€ * 1.20 = 6.30€

Se utilizarmos as milésimas, o resultado ainda se torna mais esclarecedor, ou seja, 6.298€.

Como podem verificar, pelas nossas contas, a diminuição do valor da taxa de Iva em 1%, traduz-se numa diminuição do valor da taxa de portagem. Caso não estejamos a intrepretar convenientemente o texto legal, queiram fazer o favor de nos apresentarem, no caso concreto, os valores correctos de calculo, e aceitem desde já as nossas desculpas."

Da parte da Brisa, devolveram a resposta que anteriormente tinham dado.

Agoro pergunto?
De que lado está a razão?
Claro que para nós pagadores, são 5 centimos por viagem, coisa pouca... mas no outro lado, para a Brisa, 5 centimos em cada passagem, essa sim já faz diferença (ganho)!!!

Os meus respeitosos cumprimentos e desculpem o desabafo.