Poucos teremos
hoje dúvidas sobre a evidente degradação das condições de vida no país. Salvo
as excepções do costume, todos, duma forma ou doutra, temos a percepção de
vivermos pior que há um par de anos atrás e, para agravar o sentimento, sem
perspectivas de qualquer melhoria no curto prazo.
Como se não
bastasse a incerteza instalada entre assalariados e pequenos empresários quanto
à evolução da situação económico-financeira, a sucessão de trapalhadas em que
se tem envolvido o governo de Passos Coelho só tem contribuído para agravar um
clima de contestação social alimentado pela sucessão de medidas de efeito
recessivo.
Ao permanente anúncio de cortes nas despesas de
assistência social e de aumentos de impostos juntou-se na passada semana um Parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida
sobre um Modelo de Deliberação para financiamento do custo dos medicamentos
que parece sancionar uma abordagem mais economicista da Saúde e que a imprensa
difundiu anunciando que o «Conselho
de Ética dá luz verde ao racionamento de tratamentos para o cancro», ou,
mais prosaicamente, deixando antever uma «Porta
aberta a cortes no tratamento do cancro e da sida».
Por muito
correcta que possa ser a conclusão daquele Conselho, num momento em que são
crescentes as dificuldades sentidas pela generalidade da população, e quando a
confiança nos dirigentes e nos respectivos assessores será das mais baixas de
sempre, dificilmente alguém acreditará que as conclusões daquele parecer serão
tudo menos inócuas. Confirmando isso mesmo, foi pronto o coro de contestação à
ideia implícita; desde a Ordem dos Médicos à Liga Portuguesa Contra o Cancro,
de que o mais barato dos doentes é o doente morto!
Mórbido?
Criminoso? Não! A conclusão insere-se perfeitamente na disseminação duma ética
própria, e adequada, a quem sobrevaloriza as formulações teóricas às pessoas
sobre quem faz recair os seus efeitos. Na economia, nas empresas e agora até na
saúde parece que a palavra de ordem é tudo esquecer em exclusivo benefício de
resultados que, garantem-nos os autores e demais fautores da teoria,
assegurarão o futuro… o pior é que os anos sucedem-se, os resultados vêem-se
revelando catastróficos e a solução parece-se cada vez mais com uma pura
teimosia.
Será pois
estranho associar directamente as políticas restritivas ao nível de salários e de
despesas sociais com a degradação da qualidade da saúde das populações?
Que dizer do
encerramento de serviços e da concentração de profissionais da Saúde nas
grandes áreas urbanas, nas recorrentes notícias de escassez no abastecimento de
medicamentos, ou nas regulares críticas formuladas por médicos e enfermeiros?
As
características de dogmatismo, amplamente alardeadas pelos nossos governantes,
justificam que, no limite, se questione a existência duma certa política
eugenista concertada para combater uma pirâmide etária invertida (maior número
de idosos que jovens) como a que o país apresenta, que pode ser resumida na ideia de que está
para continuar o racionamento na vida (vejam-se as novas medidas de austeridade
anunciadas por Vítor Gaspar, das quais se destaca que o «IRS
pago pelos portugueses vai subir cerca de 30% em 2013») e agora até na
morte.
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