quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

IMPORTA SE É OU NÃO UMA AMEAÇA?

Depois de no início deste mês terem sido publicados[1] os resultados de um relatório[2] do National Intelligence Council – organismo norte-americano que coordena a comunidade dos serviços de inteligência (vulgo espionagem) – que veio contradizer as teses incessantemente repetidas pela administração de George W Bush quanto à perigosidade do programa nuclear iraniano, estará definitivamente afastado o cenário de mais uma escalada bélica?

Além de confirmar que o Irão terá abandonado o programa nuclear para fins militares em 2003, o documento vem ainda reforçar a posição que a AIEA (Agência Internacional de Energia Atómica) e o seu director-geral, o egípcio Mohamed ElBaradei, vêm assumindo há algum tempo sobre esta delicada questão[3].

Confrontada com esta dura realidade a administração norte-americana prontamente alterou o teor do seu discurso, passando Bush a referir o perigo que constitui o facto do Irão possuir tecnologia que lhe permita a produção de armamento nuclear, quando antes o perigo consistia em aquele país poder produzir armamento nuclear. Esta inflexão, embora potencialmente muito perigosa, também pode ser entendida no sentido que Mário Soares deu à observação que fez, há quase um mês numa entrevista à TSF e ao DN, de que há semelhança do ocorrido com o Iraque nada justifica um ataque ao Irão e que lhe parecia pouco provável que este ocorresse por o presidente Bush já não ter força para isso, ganhe ainda maior peso perante estes desenvolvimentos.

Se a estes novos dados juntarmos a complicada situação que os EUA estão a ser forçados a enfrentar no Médio Oriente, agora até pelas acções militares que os seus bons aliados turcos têm implementado contra os “terroristas” curdos do PKK[4] instalados em território sob controlo iraquiano, é bem possível que aquela observação de Mário Soares se venha a revelar profética.

Era bom que assim fosse, para bem de todos nós, mas convém não esquecer que esta administração americana tem sido particularmente fértil na criação de factos para justificar a sua sanha militarista…

facto que observadores atentos, como normalmente o são os humoristas, não têm deixado passar em claro.
____________________
[1] De entre as muitas notícias sobre o assunto ver as do DIÁRIO DE NOTÍCIAS, da BBC NEWS e do COURRIER INTERNATIONAL.
[2] O relatório pode ser lido neste endereço: http://www.dni.gov/press_releases/20071203_release.pdf
[3] Ver a Nota de Imprensa divulgada pela AIEA sobre o conteúdo do relatório do National Intelligence Council.
[4] PKK, sigla do Partido dos Trabalhadores do Curdistão – movimento que luta pela independência de um território actualmente dividido entre a Turquia, o Iraque e o Irão – e que os EUA e a UE incluíram na lista mundial das organizações terroristas.

Sem comentários: