sábado, 4 de agosto de 2012

OS SIMPLES


O discurso político, em especial o do círculo do poder, tem vindo a assumir contornos crescentemente preocupantes. Algumas das mais recentes afirmações de primeiro-ministro Passos Coelho assumem mesmo foros inadmissíveis.

Seja em que contexto for, incluindo uma mera reunião partidária, nenhum político responsável pode produzir afirmações como «Que se lixem as eleições» sem esperar originar inevitáveis “ondas de choque”. 


De imediato houve quem retirasse a ilação de que a afirmação mais não era que um evidente aviltamento da prática democrática. Talvez menos perigosa que a proposta de suspensão temporária da democracia, em tempos sugerida pela anterior líder do PSD (assim confirmando a decrescente qualidade dos políticos), nem por isso deixa de justificar alguma apreciação, tanto mais que, comentando as suas mais que suspeitas orientações programáticas, assegura que «“Vamos vencer. As pessoas simples percebem” o que o Governo está a fazer».

Este tipo de convicção, que roça uma concepção messiânica (na linha, ou não, da sugerida por Ricardo Araújo Pereira em «Salvar Portugal à bruta»), afigura-se bem mais preocupante pelos profundos laivos do pior que a práxis salazarenta produziu. Os simples (de espírito e de vontade) sempre foram de fácil apascentação e, agora que os tempos estão difíceis e austeros, nada melhor que evocar os mesmos valores que tão bons resultados deram na subjugação feudal dos servos da gleba, mesmo que isso contrarie a sua tão apregoada intenção de cortar com o passado.

As origens programáticas de Passos Coelhos e seus sequazes, a par com o fero dogmatismo com que têm vindo a aplicar um programa de empobrecimento nacional, alimentam as mais fundadas dúvidas sobre o verdadeiro alcance dos “simples” a que se refere, tanto mais que os “outros” são liminarmente englobados no grupo dos críticos que, ou muito me engano, em breve serão apodados de cripto-comunistas.
Passos Coelho já começa a evidenciar sinais de desespero perante a evolução da conjuntura e parece preparar uma saída para o fracasso que, a avaliar pela análise do sempre bem informado Marcelo Rebelo de Sousa, poderá passar por não se recandidatar a um segundo mandato.

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