O discurso
político, em especial o do círculo do poder, tem vindo a assumir contornos
crescentemente preocupantes. Algumas das mais recentes afirmações de
primeiro-ministro Passos Coelho assumem mesmo foros inadmissíveis.
Seja em que
contexto for, incluindo uma mera reunião partidária, nenhum político
responsável pode produzir afirmações como «Que
se lixem as eleições» sem esperar originar inevitáveis “ondas de choque”.
De imediato
houve quem retirasse a ilação de que a afirmação mais não era que um evidente
aviltamento da prática democrática. Talvez menos perigosa que a proposta de
suspensão temporária da democracia, em tempos sugerida pela anterior líder do
PSD (assim confirmando a decrescente qualidade dos políticos), nem por isso
deixa de justificar alguma apreciação, tanto mais que, comentando as suas mais
que suspeitas orientações programáticas, assegura que «“Vamos
vencer. As pessoas simples percebem” o que o Governo está a fazer».
Este tipo de
convicção, que roça uma concepção messiânica (na linha, ou não, da sugerida por
Ricardo Araújo Pereira em «Salvar Portugal à bruta»),
afigura-se bem mais preocupante pelos profundos laivos do pior que a práxis
salazarenta produziu. Os simples (de espírito e de vontade) sempre foram de
fácil apascentação e, agora que os tempos estão difíceis e austeros, nada
melhor que evocar os mesmos valores que tão bons resultados deram na subjugação
feudal dos servos da gleba, mesmo que isso contrarie a sua tão apregoada
intenção de cortar com o passado.
As origens
programáticas de Passos Coelhos e seus sequazes, a par com o fero dogmatismo
com que têm vindo a aplicar um programa de empobrecimento nacional, alimentam
as mais fundadas dúvidas sobre o verdadeiro alcance dos “simples” a que se
refere, tanto mais que os “outros” são liminarmente englobados no grupo dos críticos
que, ou muito me engano, em breve serão apodados de cripto-comunistas.
Passos Coelho
já começa a evidenciar sinais de desespero perante a evolução da conjuntura e
parece preparar uma saída para o fracasso que, a avaliar pela análise do sempre
bem informado Marcelo Rebelo de Sousa, poderá passar por não se recandidatar a
um segundo mandato.
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