quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

JOGOS CONTRADITÓRIOS


No dia em que os ministros das finanças da UEE reuniam em Bruxelas para discutir, ainda e sempre, as medidas a aplicar para resolver a questão da flexibilização do FEEF (Fundo Europeu de Estabilidade Financeira)e das dívidas soberanas, o INE (Instituto Nacional de Estatística) anunciou (segundo o DN)) que a «Economia portuguesa cresceu 1,4$ em 2010», enquanto o I optou por centrar a sua atenção no anunciado recuo de 0,3% que o mesmo indicador registou no último trimestre para avisar que «Portugal fechou 2010 com um pé na recessão e já está a pousar o outro».

Esta forma, perfeitamente válida, de transmitir informação constitui um bom exemplo de quanto esta pode ser manipuladora ou até meramente panfletária. Para os apoiantes do governo a primeira transmite uma nota de optimismo enquanto a segunda reflecte o “bota abaixo” que o primeiro ministro José Sócrates tanto gosta de criticar; já para os críticos do governo a segunda reflecte a realidade que a primeira apenas serve para disfarçar.

O pior é que a posição crítica do nosso primeiro ministro face à contrariedades destina-se apenas ao consumo interno, pois perante a reiterada inoperância e as permanentes hesitações dos seus pares europeus, Sócrates remete-se a um silêncio cúmplice quando não à mais abjecta das subserviências, senão vejam-se os comentários e as loas que teceu no encerramento da última cimeira europeia que sobre a candente questão dos ataques ao Euro decidiu... apresentar umas ideias vagas e adiar a questão até à reunião de Março. Desta vez, em lugar de vir a terreiro defender a urgência de medidas eficazes e acicatar os seus pares a produzirem algo que pudesse realmente contrariar a situação, o fero Sócrates travestiu-se no seu fatinho de menino bem comportado e teceu loas à incompetência e à inconsequência de Merkel e de Sarkozy.


Será pois de espantar que Teixeira dos Santos e os restantes ministros das finanças se revelem tão pouco produtivos e eficazes como os seus chefes de governo? 

Seria de esperar que de mais esta reunião resultasse algo de mais concreto que o prolongamento no tempo do FEEF, cuja limite de validade termina em finais de 2012, e que, por uma vez, se ouvissem debater outras soluções que não reduções de despesas públicas (algumas delas vitais para amenizar a gravidade social da crise que atravessamos) e novas restrições salariais que assegurem, não a solução para o excessivo endividamento público mas antes o aumento dos lucros das empresas e a prossecução das enviesadas políticas de redistribuição da riqueza que têm sustentado o modelo de desenvolvimento económico que financiou a actual crise?

É por demais óbvio que com os políticos de opereta que nos têm dirigido nada mudará o suficiente para parecer sequer que alguma coisa está a mudar... e os sinais que estes transmitem, de tão velhos e gastos, já só enganam os que querem ser enganados! Se não, vejamos que hoje mesmo o Governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, assegurou numa entrevista ao ECONÓMICO que «Pode dizer-se que estamos em recessão económica», anunciando sem evasivas o que se antevê desde o lançamento de políticas restritivas visando o combate ao défice público, cujo efeito sobre a redução da procura interna não pode gerar outro resultado que não o da retracção do consumo e do produto interno, numa primeira fase, para numa segunda se traduzir num agravamento do peso da dívida pública sobre o PIB e assim justificar a necessidade de mais medidas restritivas.

Como em anteriores ocasiões tenho repetido, a solução para esta espiral destrutiva não pode ser a que tem vindo a ser utilizada, sob pena de vermos cada vez mais reduzida a economia doméstica enquanto o endividamento aumenta mais que proporcionalmente, nem o seu combate passa, como parece sugerir-se, pela aceleração do processo de flexibilização do FEEF, mas sim pela alteração radical do modelo de financiamento dos orçamentos públicos, pois além de economicamente insustentável, é política e socialmente condenável que o sector económico grandemente responsável pela crise mundial, depois de ter beneficiado dos apoios públicos que evitaram a sua falência, continue a lucrar com o acréscimo do endividamento público que ajudou a agravar.

Assim, o que qualquer governo responsável deveria fazer era concertar, numa primeira fase, com os homólogos dos países que integram o grupo dos PIGS (Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha) uma estratégia que passe obrigatoriamente pelo acesso directo ao financiamento do BCE, retirando ao sector financeiro a possibilidade de se financiar junto do BCE a taxas da ordem do 1%, para em seguida financiar os estados a taxas superiores aos 5%, para em seguida fazer regressar ao controlo público o processo de emissão de moeda.

A não ser adoptada esta hipótese, a prazo, todos os estados-membros da UE, incluindo a toda poderosa Alemanha, virão a confrontar-se com um novo ciclo recessivo, o que será a intenção subjacente à actual estratégia especulativa contra o Euro, pois enquanto esta perdurar moedas como o dólar e a libra, e economias como a americana e a inglesa, continuarão a poder aparentar um valor e uma estabilidade muito longe da sua real situação.

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