Seja porque se aproxima a data de fim do mandato presidencial de Hosni Mubarak, seja porque recentemente parece ter surgido uma nova estrela, o ex-director-geral da AIEA (Agência Internacional para a Energia Atómica) e prémio Nobel da Paz 2005 – Mohamed ElBaradei, no intricado firmamento político egípcio.
Se poucos têm dúvidas quanto ao pendor ditatorial do regime egípcio (fenómeno quase natural nos regimes árabes) e muitos reclamam a necessidade de uma maior democraticidade no país, raros serão os que verdadeiramente crêem numa possível democratização do regime.
Recorde-se que Mubarak (militar de carreira, nomeado comandante-chefe da Força Aérea e depois vice-presidente por Saddat) ascendeu ao poder, em 1981, na sequência do assassinato de Anwar Al Saddat (o presidente egípcio que assinara em 1979 os famigerados Acordos de Paz de Camp David, com o primeiro-ministro israelita Menachem Beguin e o presidente norte-americano Jimmy Carter) e desde então tem dirigido o país de forma praticamente ditatorial. O arremedo de abertura que representaram as eleições de 2005 traduziu-se numa vitória com mais de 88% dos votos e em 4 anos de prisão para o seu principal opositor Ayman Noor, o líder do partido ElGhad (Amanhã). Embora várias vezes desmentida é corrente no Egipto a ideia da preparação da candidatura do seu próprio filho, Gamal, à sua sucessão em 2011.
Sucede que a aparição na cena política egípcia de ElBaradei, aureolado por um Nobel da Paz e pela imagem de grande prestígio internacional que lhe granjeou a sua actuação durante o período que antecedeu a Segunda Guerra do Iraque e que recentemente cessou funções na AIEA, poderá introduzir um factor de considerável instabilidade e motivar até uma recandidatura de um Mubarak cada vez mais enfraquecido, não só pela idade (Mubarak conta já 82 anos) mas principalmente por uma saúde cada vez mais frágil.
Embora algumas vozes no interior do próprio Partido Nacional Democrático (o partido criado por Al Saddat e que apoia Mubarak) se manifestem favoráveis a uma abertura[1], a sua efectiva concretização estará sempre muito mais dependente dos egípcios e da sua mobilização que da iniciativa dos políticos instalados no poder, tanto mais que a própria oposição se revela especialmente fragmentada e dividida por interesses e personalidades particularmente vincadas.
Jogando habilidosamente com esta característica, com a agitação do espantalho (para consumo ocidental) do perigo do islamismo extremista (personificado na cena política egípcia pelos Irmãos Muçulmanos) e com a tradição muçulmana de governos autocráticos, Mubarak tem ultrapassado os escolhos que lhe forma surgindo no caminho.
A grande dúvida, que analistas locais e estrangeiros levantam é se conseguirá enfrentar ainda um ElBaradei que de forma inteligente fala mais na necessidade de democracia que na sua própria eleição[2] e assim se apresenta aos egípcios como importante factor de esperança na mudança.
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[1] Entre estes, a BBC NEWS cita nesta notícia o Professor Hossam Badrawi, figura proeminente do PND, que terá afirmado que «quem esteja no poder durante tanto tempo cria à sua volta quem se sinta confortável com o “status quo”. É importante para o povo ver mudança, pois essa é a natureza humana»
[2] Nos termos estritos das leis egípcias a possibilidade de Mohammed ElBaradei se candidatar em 2001 são remotas, pois estas obrigam à propositura por um dos partidos já existentes e isso implica que algum ou alguns dos seus líderes abdiquem dessa nomeação em favor do Nobel da Paz.
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