quinta-feira, 17 de outubro de 2013

O SEGUNDO RESGATE VEM A CAMINHO…

É recorrente ouvir-se dum ou doutro membro do Governo que o segundo resgate dependerá das decisões do Tribunal Constitucional, como se este órgão de soberania devesse pactuar com as opções à margem da lei em que insiste a equipa de Passos Coelho e Paulo Portas.


Esta estratégia, além da clara desresponsabilização que ensaia visa ainda justificar aos olhos da opinião pública as privatizações e os cortes nos serviços públicos e nas prestações sociais incluídas na proposta de Orçamento de Estado para o próximo ano, enquanto vai instalando nos cidadãos a ideia de inevitabilidade da continuação da actual estratégia de governação para lá de 2014.

Cada vez que ouvirmos Passos Coelho, os ministros do seu Governo ou algum dos muitos comentadores apaniguados, lembremo-nos que:

1)  o insucesso do famigerado “regresso aos mercados” não é consequência doutra coisa que do excessivo endividamento (a dívida pública já representará cerca de 130% do PIB), duma estrutura económica frágil e dum sector financeiro debilitado, factores que estão na origem e sustentam (por muito que tal custe a Cavaco Silva e a Passos Coelho) a firmação de que a dívida pública é impagável;
2)   a estratégia da “austeridade expansionista”, preconizada pela “troika” e fielmente aplicada pelo Governo PSD/CDS, mais não tem feito que agravar aqueles desequilíbrios; a destruição dos serviços públicos e a desregulamentação das relações de trabalho (as principais vias escolhidas) não estão a funcionar como solução para sair da crise, pois esta estratégia apenas agrava a fragilidade do tecido económico e, caso não seja invertida conduzirá a uma situação em que o aumento da desigualdade social será o único resultado;
3)   ao contrário do sistematicamente afirmado existem alternativas à “austeridade expansionista”, as quais passam maioritariamente pela renegociação da dívida, a alteração ao modelo de financiamento público (com o BCE a financiar directamente os Estados) e a implementação de políticas de promoção do emprego e de alteração do modelo de redistribuição da riqueza capazes de relançar o mercado interno e a criação de maior riqueza;

e por muito que os meios de comunicação social repitam o desgastado chavão da necessidade do País cumprir os seus compromissos, lembrem-se que:

1)   a exigência da renegociação é um direito e foi ao longo dos tempos o único mecanismo efectivamente capaz para de combater a aniquilação dos devedores ao sabor dos interesses dos credores;
2)  contrariamente ao que é afirmado, tarde ou cedo os “investidores” estrangeiros terão de voltar a financiar os Estados que recusarem o pagamento pois essa é única via possível para rentabilizar o capital de que dispõem;
3)   a redução/perdão da dívida, especialmente se sustentada num fundamentado processo de auditoria cidadã, pode, em última instância, até ser do interesse dos credores pois o processo de sangria financeira em curso nem sequer assegura que a dívida crescente venha a ser paga;
4)   o modelo de financiamento público em vigor na Zona Euro, que sujeita os Estados à agiotagem do sector financeiro (bancos, companhias de seguros e fundos de investimento), não é apenas imoral pelo facto implicar o pagamento de juros superiores ao que os bancos pagam para se financiarem junto do Banco Central, mas também criminoso por constituir um meio de concentração da riqueza.

Como tantas vezes tenho referido, a solução não se pode resumir à denúncia do Memorando de Entendimento com a “troika”, nem a um simplista “NÃO PAGAMOS”. O problema resulta em grande medida da arquitectura da própria moeda única (a famigerada limitação do financiamento público directo através do BCE) pelo que a sua solução não se resume à actuação isolada de nenhum dos estados-membros, antes a uma solução concertada entre todos que, tendo que ser despoletada pelos estados mais atingidos, não exime nem desresponsabiliza os restantes.

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