quarta-feira, 18 de abril de 2012

LAPSOS? TRAFULHICES? NÃO, MAC (MUITO AMPLA CONSPIRAÇÃO)!

Depois de terem transformado os esclarecimentos, os desmentidos e as clarificações no dia-a-dia do governo PSD/CDS, a ponto de Pedro Marques Lopes – um conhecido comentador e feroz crítico do antecessor de Passos Coelho – ter descrito aquelas práticas sob a designação genérica de lapsos, neste artigo no DN, mas acrescentando que o verdadeiro lapso«...é não perceber que não vamos cumprir as metas a que o Governo se propôs e que no fim deste processo vamos ter um país muito mais pobre, muito mais desigual e com a economia destruída».

Sucede porém que um lapso pressupõe algo de involuntário, enquanto a sucessão de eventos descrita pelo cronista revela continuidade e prática reiterada de “deslizes” e “esquecimentos”. Assim, por muito que custe ao autor e aos indefectíveis de Passos Coelho e Paulo Portas, aquilo a que temos vindo a assistir constitui um claro exemplo dum elevado nível de trafulhice e da mais descarada aldrabice política; precisamente daquilo que PSD e CDS acusavam o PS, partido que os antecedeu no poder, e que foi mote da campanha eleitoral que levou à formação do governo PSD/CDS.

Não contentes em terem mentido descaradamente quando se apresentaram a sufrágio eleitoral apregoando o que nunca tiveram intenção de praticar e alcandorados agora no poder, têm praticado um número anormal de malfeitorias sobre os mais fracos – aumentos de impostos directos e indirectos, reduções arbitrárias de salários e de prestações sociais – enquanto os mais fortes (vejam-se os “negócios” do BPN, da EDP, da REN e os que se avizinham) são despudoradamente protegidos, dando afinal a ideia que não passarão de triste títeres doutros interesses.

Se, como assegura Pedro Marques Lopes no DN, «…a coordenação política e comunicacional deste Governo deixa muito a desejar…», a constante interferência de agentes exteriores (FMI e UE) não tem ajudado a disfarçar o indisfarçável, deixando cada vez mais evidente que, como escreve Pedro Tadeu também no DN, estando «…a troika já ocupada com a Grécia, a Irlanda e a preparar-se para tratar da Espanha, Itália e outros desastres europeus, Portugal parece uma empresa falida administrada por um contabilista que substituiu um gestor judicial com excesso de trabalho!» Contabilista que, no afã de agradar aos credores, multiplica asneiras como a de pensar que uma economia em clara recessão resolverá automaticamente o problema do desemprego e se propõe acrescentar sempre mais austeridade à austeridade como opção natural ao próximo fracasso no controlo do défice público, tanto que mais que se a economia não recuperar é porque os cidadãos continuam a “viver acima das suas possibilidades”…

Mas outros acontecimentos, como o anúncio do encerramento da Maternidade Alfredo da Costa (MAC) e as justificações avançadas pelo ministro da saúde, Paulo Macedo, que são claramente classificadas como mentiras em dois artigos do EXPRESSO[1], justificam que a actuação do governo Passos Coelho/Paulo Portas seja analisada no todo e enquanto parte duma estratégia bem mais ampla que a da anuncida consolidação orçamental ou da anedótica “austeridade expansionista”. Análise que deve ir além da denúncia das mentiras, da manipulação de dados e do possível interesse especulativo sobre o imóvel onde actualmente funciona a MAC, pois se muitos comentadores e analistas referem a competência e as capacidades reveladas por Paulo Macedo durante a sua actuação como director-geral dos impostos, raros são os que lembram que este transitou da administração do BCP, onde era o responsável pela área dos seguros, para a gestão da pasta ministerial da saúde sem que oficialmente se tenha levantado a menor dúvida quanto a uma natural questão de incompatibilidade[2].


A peregrina ideia de encerrar uma unidade pública de cuidados de saúde reconhecida, nacional e internacionalmente, pela qualidade do seu trabalho (numa área, como a da natalidade, onde Portugal ombreia com os países mais avançados) apenas pode ser entendida enquanto estratégia de destruição do serviço público em benefício dos novos hospitais instalados ao abrigo das conhecidas parcerias público-privadas.

Revelando-se cada vez mais evidente a verdadeira estratégia do actual governo que, além do claro benefício ao sector financeiro em detrimento dos milhões de contribuintes aprisionados sob o argumento da imprescindibilidade daquele sector, aproveita a oportunidade criada por aquele segmento da actividade económica (e pelos seus accionistas) para liquidar o pouco que resta duma ideia de estado social e de protecção dos direitos básicos das classes mais desfavorecidas.

Defender a manutenção dum serviço público com a qualidade que revela a MAC (seja nas actuais instalações seja noutras, como propõe o socialista e ex-ministro da saúde, Correia de Campos, num artigo de opinião no PUBLICO de 2012-04-16[3]), representa não apenas a defesa duma política de saúde pública mas principalmente a denúncia e a oposição a uma elaborada estratégia de conspiração e de destruição contra tudo o que se assemelha a iniciativa pública para criar espaço de mercado e lucros garantidos para o investimento privado e quando o desgastado argumento da superioridade da gestão privada surge contrariado pela realidade da qualidade da gestão pública, então mente-se de forma descarada.


[1] Os artigos em causa são da autoria de João Lemos Esteves e intitulam-se «As mentiras pornográficas do Ministro da Saúde» e «As mentiras pornográficas do Ministro da Saúde – Parte II».
[2] Sobre o assunto ver o “post” «O NOVO GOVERNO».
[3] O artigo, intitulado «A Maternidade Alfredo da Costa», apenas pode ser lido na edição em papel.

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