terça-feira, 24 de abril de 2012

ABRIL DO DESASSOSSEGO


Haverá melhor imagem do actual estado das coisas em Portugal que a notícia de que a Associação 25 de Abril não participará pela primeira vez nas celebrações oficiais?

A associação A25A, fundada pelos militares directamente envolvidos, congrega hoje todos (militares e civis) os que se revejam no espírito do movimento libertador de 25 de Abril de 1974, pelo que aquela decisão constitui um claro sinal do mal-estar que grassa no país.

Segundo estoutra notícia do PUBLICO o manifesto apresentado pela direcção da A25A justifica a decisão «…por considerar que “o contrato social estabelecido na Constituição da República Portuguesa foi rompido pelo poder”», porque «[a]s medidas e sacrifícios impostos aos cidadãos portugueses ultrapassaram os limites do suportável. Condições inaceitáveis de segurança e bem-estar social atingem a dignidade da pessoa humana…» e concluindo que «…o rumo político seguido protege os privilégios, agrava a pobreza e a exclusão social, desvaloriza o trabalho».

A polémica decisão foi formalmente anunciada pelo presidente da A25A, o coronel Vasco Lourenço, e embora não isenta doutras leituras pode bem ser entendida como uma contestação frontal à linha política do governo de Passos Coelho que classificou como configurando «…um outro ciclo político que está contra o 25 de Abril, os seus ideais e os seus valores», a ponto do EXPRESSO a interpretar como uma referência a que o poder não reflecte o regime democrático.

Quando a este gesto se seguiu o igualmente inédito anúncio de que também o ex-presidente Mário «Soares não vai à sessão oficial do 25 de Abril», confirmada pela notícia de que «Soares e Alegre apoiam Capitães e não vão à AR», a decisão da A25A ganhou novos e maiores contornos de contestação; do que num primeiro momento poderia ser entendido como uma reacção às políticas de cortes salariais nas Forças Armadas (algo que nem sequer constituiria verdadeira novidade no caso dos “velhos capitães de Abril”, cujo movimento nasceu de meras reivindicações de classe) eis que a solidariedade manifestada por Soares e Alegre lhe confere (queira-se ou não) uma maior dimensão política e um claro sintoma de contestação aberta às políticas seguidas pelo governo de Passos Coelho.

Na habitual linha de actuação do politicamente correcto não se estranha que «Marcelo Rebelo de Sousa não compreende ausências» enquanto assegura que a «democracia é que perde com as ausências nas comemorações do 25 de Abril», nem que o ex-comissário europeu António Vitorino (como refere a mesma notícia do EXPRESSO) tenha prontamente apelado à “convergência”, como se o direito à expressão da indignação e da contestação fosse algo de absurdo ou reprovável num regime que se afirma democrático.


 

 

Mais curiosa ainda é a reacção de Passos Coelho, que na sequência doutras declarações de membros do seu governo (como a fantástica afirmação produzida em Washington por Vítor Gaspar assegurando que estão os «Portugueses disponíveis para sacrifícios») reagiu desvalorizando a mensagem de evidente crítica política e dizendo-se «habituado a que figuras políticas queiram assumir protagonismo», como se o que estivesse em causa fosse um lugar na primeira fila da fotografia de família.

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