terça-feira, 29 de abril de 2014

O FUTURO DA QUESTÃO PALESTINIANA

A semana que terminou registou o regresso da questão palestiniana às primeiras páginas dos jornais, não devido a qualquer extraordinário desenvolvimento no processo de negociação israelo-palestiniano mas porque o «Hamas e Fatah anunciam governo de união».

Após quase sete anos de conflito, umas vezes aberto outras latente, que levou à formação de governos distintos na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, eis que as duas organizações chegaram finalmente a uma plataforma de entendimento que passa pela realização de novas eleições num prazo de seis meses.

Mas a esperança que poderia acompanhar o que parece constituir uma boa notícia para os palestinianos, reduzindo o clima de tensão interno que poderá até facilitar algum acréscimo de moderação entre os militantes do Hamas, foi prontamente reduzida a zero quando de Tel-Aviv chegou a notícia de que «Israel suspende negociações de paz com os palestinianos», negociações que há vários meses vivem em estado hibernação, sob a alegação que não negociarão com uma organização que defende a destruição de Israel.

Tudo isto a coberto do amigo americano que, fazendo coro com o regime judaico, já fez saber que pondera reequacionar os programas de assistência aos palestinianos, programas que, face à clara política de “apartheid” de que os palestinianos têm sido alvo, são a única fonte de sobrevivência duma população objectiva e intencionalmente mantida em estado de inanição económica.


Tal como aconteceu em 2007, quando em consequência dum resultado eleitoral favorável ao Hamas o Ocidente se pronunciou pela inaceitabilidade das eleições, eis que de novo o tão propagandeado apego ocidental à democracia e aos direitos humanos é esquecido em benefício de interesses manifestamente opostos ao das populações palestinianas e até de parte da judaica que defende o fim do conflito e a normalização da sua vida diária.

Analisado pragmaticamente, o fracasso de mais um processo negocial não deriva da nova realidade palestiniana mas sim da posição de intransigência israelita quanto ao reconhecimento palestiniano do seu estado judaico, facto que até nos EUA foi reconhecido por um conjunto de especialistas e diplomatas (ver este artigo assinado entre outros por Zbigniew Brzezinski e Frank Carlucci) que no início do mês apelaram a uma posição mais firme por parte do secretário de estado, John Kerry, nas negociações israelo-palestinianas; atirar sobre a unidade palestiniana o ónus dum desentendimento que se deve principalmente às crescentes exigências israelitas (na opinião palestiniana) ou, mais prosaicamente, à política de “apartheid” judaica que tem inviabilizado até a famigerada solução dos “dois-estados” e que em última instância coloca Israel perante a escolha entre a opção de expulsar os palestinianos para a Jordânia e o Egipto ou integrá-los num estado não racial.

Este raciocínio foi hoje surpreendentemente validado por uma notícia onde o DN assegura que John Kerry terá afirmado numa reunião, à porta fechada, de um centro de reflexão norte-americano que «Israel corre o risco de se tornar num Estado de 'apartheid'». Mesmo descontando a medonha hipocrisia de descrever a realidade sob a capa duma hipótese, a afirmação confirma que até já em Washington se reconhece a evidência do que em Tel-Aviv se persiste em ignorar.

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